Responsabilidade partilhada - por António Vitorino -
O sublinhado é nosso.
DNNo curto prazo as medidas de emergência adoptadas são lentas a produzir resultados na economia real. Costuma-se dizer que no meio da guerra não se limpam armas. Mas a verdade é que no meio da presente recessão, vale a pena discutir não apenas a forma de conter a crise como, olhando mais além, antever a forma como vamos sair da crise. Sobretudo porque da forma como sairmos da crise depende o nosso futuro nas próximas décadas. Num aparente "eterno retorno", as medidas anticrise que a generalidade dos países tem vindo a adoptar visam responder aos efeitos mais imediatos da recessão económica global: conter a quebra do emprego, definir esquemas de apoio social aos sectores mais vulneráveis no desemprego ou em risco de pobreza, apoiar a tesouraria das empresas em risco, estabilizar o sistema financeiro por forma a criar as condições para que os bancos voltem a cumprir a sua função primordial de emprestar dinheiro às famílias e às actividades económicas. Em paralelo às medidas que poderíamos considerar "de emergência", os países debatem as prioridades da própria retoma, até porque todos intuem que a alocação extraordinária de recursos públicos à economia não se pode limitar a responder ao curto prazo, antes acabará por ser tão mais eficiente quanto mais estiver em linha com os objectivos de crescimento económico de médio prazo. Neste capítulo a convergência tem vindo progressivamente a ser feita em torno da ideia de uma retoma assente num "crescimento inteligente", dando prioridade aos sectores energético, muito em especial das energias renováveis, da penetração da banda larga, das infra-estruturas de transporte e de energia, da qualificação das pessoas e dos cuidados de saúde. Claro que estas prioridades variam de país para país, em função do seu estádio de desenvolvimento e das respectivas necessidades de crescimento económico futuro. No curto prazo as medidas de emergência adoptadas são lentas a produzir resultados na economia real. O seu efeito varia entre a contenção da quebra do produto (dir-se-ia a estagnação da quebra da produção) e a sustentação de níveis de emprego que permitam às empresas manter a sua capacidade produtiva instalada na expectativa de melhores dias (recorrendo ao chamado lay-off). Contudo, receia-se que mesmo após a inversão da tendência recessiva, os primeiros tempos da retoma ainda sejam marcados por novas perdas de postos de trabalho. O que coloca no centro das preocupações desse período de retoma as políticas de emprego. Ora os sectores identificados como de "crescimento inteligente" são muito variáveis entre si no que toca à capacidade de geração de postos de trabalho. De igual modo a reconversão dos trabalhadores desempregados por força da crise pode ser mais imediata em alguns daqueles sectores prioritários e mais difícil, morosa e complexa noutros. A procura dos equilíbrios entre as prioridades de investimento público e privado, isoladamente ou em parcerias, e a preocupação do combate ao desemprego constitui, sem dúvida, um terreno privilegiado para o diálogo e a concertação social. Em países como a Alemanha, esse diálogo social já permitiu minimizar alguns dos efeitos mais negativos da crise, designadamente na contenção do desemprego. Noutros países, como por exemplo em Espanha, embora haja um lastro de diálogo social importante o crescimento do desemprego tem sido galopante. Desses exemplos resulta que a concertação social pode ser um instrumento importante, é sem dúvida um elemento necessário mas não é, por si só, suficiente. O que nos remete para a segunda componente incontornável do relançamento económico: a das prioridades do investimento público e da iniciativa privada. Neste domínio, antevendo-se uma retoma marcada ainda por relevantes dificuldades de acesso ao crédito, a mobilização dos recursos públicos e dos fundos comunitários para incentivo e apoio às empresas, designadamente às pequenas e às médias empresas com capacidade inovadora e potencial exportador, prefigura-se como um instrumento decisivo para o relançamento da economia e a criação de emprego. A contratualização desses apoios em função de metas de crescimento económico, criação de postos de trabalho e diminuição do défice externo terá, pois, de dominar o debate sobre o modelo de retoma económica pretendido. Uma responsabilidade que terá de ser partilhada pelo Estado e pelos parceiros sociais.
- Obs: Divulgue-se pela racionalidade e oportunidade das orientações contidas nesta reflexão.