quarta-feira

Novo perfil, novos desafios - por António Vitorino -

in DN
Um dos temas mais actuais prende-se com os efeitos da crise económica nos fluxos migratórios. Analisando os vários movimentos migratórios (sul-norte, sul-sul, norte-sul), as evidências recolhidas não permitem (ainda) tirar conclusões sólidas.
De um modo geral parece haver uma tendência para a diminuição das remessas enviadas pelos imigrantes para os países de origem. Em alguns casos, os imigrantes desempregados nos países desenvolvidos (caso dos mexicanos nos EUA) até têm já recorrido às poupanças que haviam enviado para as suas famílias no México com o objectivo de garantirem o seu sustento no período de crise. Mas também há registo que algumas comunidades indianas nos países desenvolvidos até aumentaram o volume de remessas enviadas desde o começo da crise.
Ainda no plano das grandes tendências, pode dizer-se que a crise tem provocado um aumento do desemprego entre as comunidades imigrantes que se encontram nos países desenvolvidos, em termos de a taxa média de desemprego nestas comunidades ser superior à taxa média do desemprego dos respectivos países europeus de acolhimento. Esta tendência, contudo, varia de região de destino para região de destino e conhece excepções, como é o caso de Portugal.
De igual modo pode identificar-se uma tendência para a diminuição da pressão de chegada dos imigrantes oriundos de países terceiros por antecipação dos efeitos da crise, mas tal retraimento não é uniforme e não se verifica em todos os casos das migrações de um país do Sul para outro país do Sul.
Finalmente em vários países desenvolvidos registam-se alguns movimentos de retorno dos imigrantes aos países de origem, em virtude do impacto negativo da crise económica. Com efeito, por muito que certos discursos populistas queiram apresentar os imigrantes como "turistas sociais" (mais motivados pelos benefícios sociais que podem receber nos países de acolhimento do que no contributo activo que possam dar inserindo-se de pleno no mercado de trabalho), a verdade é que o grande factor de mobilização ou de desmobilização dos imigrantes continua a ser a oportunidade de aceder ao mercado de trabalho e de nele permanecer.
A decisão de retorno é, contudo, uma decisão particularmente complexa. Tem tanto a ver com as expectativas de os imigrantes encontrarem, no país de origem, um ambiente e uma rede de protecção social mais favorável às condições agrestes que a crise lhes impõe nos países de destino, como com o prognóstico individual da duração da crise e das potenciais dificuldades de voltarem aos países de destino uma vez ultrapassada a crise. Neste ponto é paradoxal verificar que a rigidez dos controlos fronteiriços e os obstáculos à imigração legal, nesta conjuntura, acabam por representar um desincentivo ao retorno dos imigrantes aos países de origem e ampliam as tensões sociais nos países de acolhimento numa época de crise como a que vivemos.
Os dados divulgados esta semana pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras sobre fluxos migratórios em Portugal são, a este propósito, muito interessantes e merecedores de adequada ponderação. Embora referentes a 2008 (portanto apenas abrangendo o trimestre inicial da actual crise), eles revelam uma estabilização no número de imigrantes legais presentes em Portugal, com um pequeno saldo líquido positivo entre os imigrantes que chegam e os que abandonam o País (mais 4500 imigrantes legais do que em 2007). Paralelamente confirma-se que a principal fonte de imigração clandestina é oriunda da América Latina.
Muito significativa é também a alteração do peso relativo das comunidades imigrantes: a brasileira surge em primeiro lugar, com o dobro da segunda (a ucraniana), tendo a cabo-verdiana passado a terceira, com pouca diferença face à oriunda da Ucrânia. De entre as comunidades de origem comunitária, a romena ultrapassou a britânica com uma subida muito significativa (em parte ligada à comunidade de origem cigana também).
Estes dados indiciam um novo perfil de imigração e novos desafios das políticas de integração!
Obs: Divulgue-se.