A CRISE POLÍTICA EM PORTUGAL
- É recorrente falar-se na crise política nacional. Porquê? Com efeito, não se trata duma crise política, económica, social e institucional normal. Há aqui algo de anormal, de patológico que tem reprimido as relações entre os subsistemas que regulam os múltiplos níveis de governação no país. Por isso, é legítimo afirmar que a sociedade portuguesa está bloqueada no funcionamento das suas instituições. E quando esses vários níveis institucionais se neutralizam uns aos outros, provocam um contexto generalizado de estagnação. Ora é neste momento crucial que a sociedade espera que as instituições políticas passem a ter um papel activo na resolução dessas crises institucionais. O que não sucede.
- Vejamos: será que a instituição militar (à semelhança do passado) tem capacidade e credibilidade para repetir o que fez noutras épocas concretizando essa função de clarificação política e estratégica? Noutro plano: será que a corrupção policial em matéria de regulação de trânsito rodoviário, pode ser esquecida rapidamente resolvida pelo sistema de justiça? E a corrupção autárquica - pode ser reproduzida de forma banal? E os escândalos resultantes da pedofilia – não espelham (também) uma desadequação gritante lentidão na aplicação da justiça, criando barreiras de impunidade ocultando certos aspectos e revelando outros?
- Eis um conjunto sumário de aspectos – facilmente identificados pelo leitor - que mostram como a sociedade portuguesa está doente. Mas doente de quê? Será que é possível fazer desaparecer o sintoma (mesmo desconhecendo a sua origem)? É, pois, esta interrogação que abre uma nova perspectiva na sociedade portuguesa, confrontada que está por um conjunto múltiplo de crises que a atingem nos seus fundamentos, materiais e morais.
- Assim, voltamos ao início: será que a crise nacional é atípica? Já que reprime e oculta factos e indicadores preocupantes? E ao encobrir tais evidências está a alimentar o potencial destruidor acumulado por aquelas crises sobrepostas que culminam, necessariamente, num desvio da (desejada) trajectória de desenvolvimento (sustentável) para Portugal. Uma trajectória que é, hoje, indissociada do desafio da Europa alargada e da globalização competitiva que opera na cena mundial. Ora a natureza desta crise (a)normal é tanto mais grave quanto se sabe que ela já não é controlável por recurso a instrumentos e dispositivos que foram concebidos para intervir em contextos de pré-globalização, ou seja, em que os desequilíbrios conjunturais e estruturais das economias e das sociedades era de menor intensidade, e facilmente reguláveis.
- Na prática, a solução para a crise nacional não se afigura fácil, já que nenhum daqueles aspectos referidos (aos sub-sistemas da governação)) encontra uma linha de correcção e de orientação autónoma e sustentável. O mesmo é dizer que os agentes políticos (institucionais) são os principais responsáveis, por acção ou por omissão, no encobrimento sistemático e continuado daqueles sinais preocupantes que conduziram à actual crise atípica da sociedade portuguesa, que não é interpretada por nenhum modelo de análise.
- Também aqui não há modelo explicativo que explicite a racionalidade de comportamentos tão radicais quanto desviantes. Eis um problema (epistemológico) que se põe simultaneamente ao analista, ao político e ao leitor: como compreender a realidade contemporânea se os modelos que a procuram explicar esbarram com os limites (atípicos) das particularidades do caso português, os quais ultrapassam a tolerância e a racionalidade dos modelos existentes?
- Então, importa perguntar qual a razão que leva os agentes políticos a ocultar os elementos de crise que nos afastam da convergência dos indicadores de desenvolvimento humano da União Europeia? Porque é que aumenta (ao invés de diminuir) esse gap entre “nós” e “eles”? Não é, de certo, por causa da pedofilia, nem da corrupção, nem da neocensura que o governo faz junto dos media. Como em tudo na vida, as razões são múltiplas e vão da impreparação das elites dirigentes, da falta de visão e de planos integrados de desenvolvimento para Portugal, das crises nas outras sociedades europeias que se desenvolvem em simultâneo com a crise portuguesa e, por todos, da própria crise dinamizada pela mudança das configurações do sistema político mundial, agravado pelos medíocres índices de crescimento económico e de produtividade global dos portugueses.
- Ademais, a crise nacional já não é independente do contexto europeu, pelo que o que for bom para a Europa beneficiará Portugal; e o que penalizar a Europa também se repercutirá, negativamente, no país e nas outras sociedades europeias na lógica inevitável das comparabilidades directas dos indicadores de desenvolvimento, eficiência e confiança das instituições (empresas e pessoas) a operar nos grandes espaços.
- Crucial é descobrir a razão que possa impedir que, de futuro, a manifestação daquelas crises provoque o encobrimento dos sinais de subdesenvolvimento de modo a que entrem rapidamente em acção os dispositivos correctores dos desequilíbrios, a que alguns agentes políticos, no últimos meses, têm conduzido Portugal. Mas admitir esta possibilidade é desmascarar o poder, que pode não querer ser desmascarado para continuar a ocultação e, assim, manter-se nesse posto de comando do qual não quer abdicar.
- Caberá à imprensa séria e melhor preparada fazer esse duplo trabalho de “promoção-denúncia” das condições que levam os actores políticos a dramatizar as suas emoções e posições, a fim de fixar os seus apoiantes, mantendo-os (totalmente) mobilizados contra outras opções e interesses. O que importa é pensar Portugal no curto, médio e longo prazos. E isso é o que manifestamente não se vê na actual fauna política portuguesa.
- Nota: aqui o ciber-leitor pode ver um homem tentando transpor o Muro de Berlim que, como sabem, caiu para os dois... Na imagem de cima podem ver o que quiserem. Mas eu vejo uma coisa: o "centro-direitismo" dos interesses e dos negocismos, que actualmente desgoverna Portugal, tentado dialogar entre si e apresentar uma imagem de harmonia ao eleitorado.
- Podem ainda nem ver uma coisa nem outra. Acaba de me ligar um amigo-crítico que viu nela o Campo Pequeno em dias de batalha campal. Naturalmente, que discordei dizendo que o Campo Pequeno fica a meio da Av. da República, e o Caldas e a Lapa estão localizados noutros pontos da cidade, de mais difícil acesso...