jurista Hoje mesmo a Comissão Europeia entrega aos ministros do Emprego e dos Assuntos Sociais da União Europeia um relatório que faz o balanço das reformas em curso nos sistemas de protecção social e no âmbito das políticas de inclusão social. O relatório evidencia que esta agenda de reformas consagrada na Estratégia de Lisboa é partilhada por governos de distintas cores políticas e em países com graus muito diversificados de desenvolvimento económico e social. O que é sublinhado neste relatório é que, independentemente da diversidade das realidades económicas e sociais dos países da União, as actuais condições de concorrência global e o panorama da evolução demográfica coloca todos os países da União perante desafios semelhantes que impõem reformas nos sistemas de protecção social vigentes. A dificuldade consiste em proceder a essas reformas mantendo os valores essenciais da coesão e da justiça social. A que acresce que a aferição dos seus resultados exige uma avaliação num período relativamente longo, muito em contraste com a premência das expectativas dos cidadãos e com a velocidade alucinante da globalização económica e financeira. Se a este panorama juntarmos a instabilidade política global, o aumento do custo de matérias-primas e produtos essenciais (do petróleo aos cereais e outros bens alimentares) e a recente crise financeira gerada a partir do mercado hipotecário americano, não será difícil concluir que a margem de manobra não é muito grande. O caldo de cultura envolvente torna as reformas inadiáveis, mas a crise internacional condiciona a liberdade de acção dos governos e das sociedades e cria um sentimento de insegurança e incerteza que alimenta as lógicas defensivas, proteccionistas e imobilistas. Mesmo assim, o balanço das reformas apresentado pelo relatório da Comissão regista algumas evoluções positivas. Assim, as taxas de emprego aumentaram em todas as categorias de trabalhadores mais velhos (entre os 55 e os 64 anos) e entre as mulheres, e as reformas dos sistemas de pensões e dos mercados de trabalho melhoraram a sustentabilidade dos sistemas de segurança social bem como os incentivos ao trabalho. Por contraste, no domínio da inclusão social, 16% dos cidadãos da União Europeia (ou seja, 78 milhões de pessoas!) permanecem em risco de pobreza, enquanto cerca de 8% estão nessa situação embora tenham um emprego. Esta realidade preocupante sente-se com mais intensidade nas comunidades de imigrantes presentes nos países europeus e respectivos descendentes. Mas provavelmente o dado mais chocante que este relatório contém diz respeito à pobreza infantil, situação que afecta 19 milhões de crianças! Esta conclusão torna, por si só, incontornável que a grande prioridade do combate à pobreza na União Europeia nos próximos anos tem de ter as crianças no centro das suas preocupações. Esse combate interpela naturalmente as autoridades públicas mas também a sociedade civil. E porque se trata de um combate sobre dramas humanos muitas vezes escondidos ou camuflados exige uma intervenção de proximidade, tanto a cargos dos serviços públicos de linha, com especial relevo para as autarquias locais, como a cargo das organizações não governamentais e outras instituições assentes no voluntariado e das próprias empresas, enquanto expressão da sua responsabilidade social. Para tanto é necessário, desde logo, compreender que o combate à pobreza infantil exige a conjugação de medidas de apoio às famílias e de medidas directamente vocacionadas para o apoio às próprias crianças. Medidas que apresentem a flexibilidade necessária para se adaptarem às transformações profundas por que passa a estrutura das famílias actualmente (designadamente a crescente relevância das famílias monoparentais a cargo da mãe) e que tenham uma vocação transversal para responderem à desestruturação de tantos agregados familiares no seio dos quais as crianças representam o elo mais vulnerável. É que hoje em dia é na luta contra a pobreza que começa a igualdade de oportunidades.
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