POESIA CUBANA DE RESISTÊNCIA
(Manuel Navarro Lima – tradução: Goulart Gomes)
Enquanto possa mirar-se teu rosto destruído
e sobre ele erigir-se uma lágrima forte;
enquanto possa a luz, tão tua, contemplar-te
iluminando o fausto derradeiro e tua fronte
ainda não será toda a morte
senão um pouco de morte...
Nada mais que um pouco de morte!
Quando levemos teu ataúde nos ombros
e na casa quedem chorando as mulheres
e chorem os homens a dor infinita
de perder-te...
ainda não será toda a morte
senão um pouco de morte...
Nada mais que um pouco de morte!
Quando já estejas debaixo da terra
em vermes e poeira convertendo-se;
quando já estejas coberto de água negra
imerso na sombra para sempre...
ainda não será toda a morte
senão um pouco de morte...
Nada mais que um pouco de morte!
Quando os que hoje te choram e os que, tristes calam
ao ver como tem caído teus estandartes verdes
amanhã não recordem tua juventude radiante
nem o claro frescor de tua presença alegre...
Então, sim, será toda a morte!
Toda a morte!
Mas se estás decidido, de cabeça erguida
a derramar teu sangue de forma dolorida
e morres batalhando para libertar o Homem
dos frios grilhões que o ferem...
Ainda que já estejas caído...
Ainda que já estejas inerte...
Para ti não haverá a morte!
Não haverá morte!
(Regino Pedroso - tradução: Goulart Gomes)
Como forjamos o ferro, forjaremos dias novos.
Suados e fortes
desceremos às profundas
e arrancaremos de suas entranhas novas conquistas.
Ascenderemos às montanhas
e o Sol nos encherá de vida:
seremos pedaços do Sol!
Forjaremos outra vida, grandiosa e humana;
a eternizaremos com um potente e unânime esforço.
E sob o olhar virgem dos amanheceres,
cantaremos à força criadora do músculo
e à harmonia fraterna das almas
Muitos,
e seremos só um.
Para o grande canto solo teremos uma voz.
Cantaremos ao ferro,
à beleza forte e nova da máquina.
à bigorna, aos tratores
que violam a terra em cúpula mecânica;
à turbina, ao dínamo;
à fuga infinita dos trilhos
- sistema nervoso de aço por onde circula a vida.
Os canais de luz dos cabos elétricos
- células cerebrais do mundo,
onde vibra a força.
Cantaremos ao ferro, porque o mundo é de ferro.
e somos filhos do ferro.
Mas estaremos sobre a máquina.
Um sentimento novo surgirá em nossos peitos
e será tão imenso
que para amá-lo a terra se transformará em um coração.
Aonde estará, então, nossa amargura?
Aonde estes dias miseráveis e inválidos?
Como forjamos o ferro, forjaremos outro século.
Coroados de júbilos,
os novos dias ver-nos-ão
musculosos e fortes, desfilar ao Sol.
Veremos os campos, as cidades e as oficinas:
cada instrumento de trabalho será como uma arma:
- uma serra, uma chave, um martelo, uma foice -
e ocuparemos a terra como um exército em marcha,
saudando a vida com nosso canto unânime!
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SANDINO ESTÁ CHAMANDO
(Rosa Hilda Zell – tradução: Goulart Gomes)
Nesta hora em que dizemos versos
(meia-noite ou manhã: sabes quando?
meia-noite de ontem: tu sabes quando!)
nesta hora em que dizemos versos
com metade da alma em outra parte,
esperando,
espiando,
advinhando
o temos dos pélagos perversos
porque um barco está soltando sua amarra
háa uma voz quieta que está chamando
mais alto que a tua, está chamando
por nós, também, está chamando
Sandino está chamando.
Sandino está chamando: já é manhã
mas ainda não é ontem. (Tu sabes quando...)
O que não é, é hoje. É a manhã
vermelha e negra. É um dia que já foi
e, contudo, não é. Primeiro do ano,
9 de abril ou 26 de julho,
um barco, o negro mar está cruzando.
Não diga versos já, que está chamando,
com sua voz profunda, está chamando,
por nós, também, está chamando:
a Liberdade, irmão, está chamando,
e se chama à Glória ou à Morte
não importa. Ouve: é sua voz, e está chamando
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LA HABANA UM DIA
(Nivaria Tejera – tradução: Goulart Gomes)
Um dia
minha glória atingirá a Manchúria...
um bom dia
povo meu
tu crescerás sobre o mar...
logo, um dia
os trabalhadores felizes pensarão em sua cidade
inventarão rampas infinitas
parques transparentes
para que as crianças corram
por espaços livres
indiferentes aos ruídos da cidade
à impaciência da cidade...
Um dia
minha cidade
te cansarás
dessa rigidez estranha
dos dominadores...
(Minha cidade de La Habana
manietada
não se assemelha ao mar
não se assemelha ao céu
nem à terra
nem ao fogo
não parece a minha ilha
despojada
serena
nem ao ser insular
natural
sorridente)
Um dia
minha cidade...
o mar te cobrirá
crescerá sobre ti
o mar...
E teus trabalhadores
te construirão no mundo
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