Imigração e Segurança Humana no tempo tríbulo
O tempo tríbulo em que vivemos coloca questões difíceis à segurança dos Estados e das sociedades e exige ao mesmo tempo a preservação da memória e a percepção da conjuntura e a forma de como os nossos valores devem regular os acontecimentos supervenientes. Mais do que a segurança dos Estados, como classicamente a conhecemos desde a Guerra Fria, trata-se da segurança humana, que envolve outras percepções e realidades.
O absurdo ocorre a cada dia sem que o problema das migrações, dos refugiados e do tráfico humano se atenue. Foi nesse contexto que duas ou três dezenas de imigrantes surpreendeu os turistas na praia La Barrosa, em Chiclana de la Frontera, no sul de Espanha. Muitos deles pareciam ser menores de idade e assim que chegaram a terra começaram a fugir pelas dunas. São imagens brutais mas não inéditas, pois esta pressão migratória que do Norte de África demanda a Europa remonta a 2012, e desde então tem-se intensificado sem que a Europa tenha meios humanos e financeiros capazes de estancar o problema.
Recordo que foi no flanco sul do Mediterrâneo que as emergências se acumularam com maior intensidade, obrigando até países como a Itália a conceber a missão Mare Nostrum, inicialmente bem-sucedida, depois revelou-se um falhanço.
Recordo que foi no flanco sul do Mediterrâneo que as emergências se acumularam com maior intensidade, obrigando até países como a Itália a conceber a missão Mare Nostrum, inicialmente bem-sucedida, depois revelou-se um falhanço.
Se há questão-problema que põe à prova a consistência da UE, além das questões financeiras, é a questão mas migrações e das sucessivas crises societárias e humanitárias que ela suscita aos Estados, às sociedades, às economias e aos povos.
Em 2015, a Comissão Europeia sugeriu um plano de dez pontos para resolver a crise dos migrantes. Esse plano, grosso modo, contemplava o reforço das operações do Mediterrâneo (Tritão e Poseidon), e o reforço de meios, pessoal e financiamento, e ainda o alargamento da área de intervenção operacional e o mandato da Frontex. Função: A FRONTEX presta apoio aos países da UE e aos países associados de Schengen na gestão das suas fronteiras externas, contribuindo para a harmonização dos controlos nas fronteiras da UE. A agência facilita a cooperação entre as autoridades de controlo das fronteiras de cada país da UE, disponibilizando a assistência técnica e os conhecimentos específicos necessários em matéria de gestão das fronteiras externas.
Contudo, esse esforço não terá bastado para capturar e destruir as embarcações de tráfico e imigração clandestina que tem inundado as sociedades da Europa com pessoas oriundas do norte de África. A intensificação das reuniões de trabalho entre a Europa, a Frontex, a Eurojust (Agência que coordena a cooperação judicial e criminal na UE, criada em 2002) e a EASO (Gabinete que coordena o processamento europeu de pedidos de asilo, criado em 2010) com o fito de obter mais informações sobre a forma de organização das redes, o seu financiamento e lucro a fim de as desmantelar, sem agravar a situação humanitária dos migrantes, não tem sido suficiente.
Esta pressão migratória crescente tem, naturalmente, desafiado as autoridades estatais a coligir informações especializadas (de carácter digital e outras) com vista a proteger as fronteiras da própria Europa, a segurança humanitária dos migrantes e, ao mesmo tempo, estabelecer planos de contingência para relocalizar migrantes em situações de emergência, que infelizmente são cada vez mais frequentes.
Mas ao mesmo tempo que os Estados da Europa acolhem estes imigrantes, também devem intensificar a criação de programas de cooperação para facilitar o retorno daqueles às suas terras de origem, até porque muitos deles não se conseguem integrar nos países de destino, além daqueles que se dedicam a actividades criminosas que fazem perigar o modo de vida Ocidental (que não é negociável).
Intensificar o diálogo com países como a Líbia, por exemplo, a fim de equacionar medidas de acção rápida para combater e diminuir a criminalidade.
Intensificar a colocação dos chamados oficiais de ligação em países de risco, para aí detectar e analisar novos fluxos migratórios e, ao mesmo tempo, revigorar as velhas missões diplomáticas e consulares da UE que têm oferecido escasso potencial na identificação desses riscos sistémicos.
Em suma, sem esta aposta na intelligence, devidamente enquadradas por forças em missões no Mediterrâneo, no Adriático, no mar Egeu e até no Atlântico Sul a UE (com ou sem o apoio da NATO) terá as maiores dificuldades em gerir a crise dos migrantes, que é cada mais um problema humanitário à escala global.
E como já não estamos naquele mundo previsível e bipolar da Guerra Fria, em que cada uma das partes em conflito conseguia identificar o movimento do seu opositor, os Estados, e a UE no seu conjunto (com todas as suas instituições civis) têm de saber preparar-se para responder às questões da segurança humana, um conceito que a ONU passou a utilizar depois de 1994 para sublinhar a necessidade de se envolver as questões da segurança económica, alimentar, sanitária, ambiental e comunitária integrada no desenho e implementação das políticas públicas de apoio à imigração que hoje está a desafiar o mundo Ocidental.
No fundo, é dos direitos humanos (dos dois lados da barricada..) que falamos, já que são todos esses direitos que estão em perigo na questão das migrações para a Europa.
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