sexta-feira

António Costa e o investimento chinês em Portugal



É sabido que o investimento chinês em Portugal - no âmbito das nossas relações bilaterais - é altamente assimétrico. Não só é assimétrico como é também muito unidireccional. Ou seja, muito dificilmente uma empresa portuguesa poderia ser o accionista de referência de uma empresa eléctrica chinesa. 

Aliás, este é um problema simultaneamente português e europeu, pelo que deve ser pensado a esse nível, concertadamente. Ainda que os chineses aproveitem essa brecha (da extrema dependência financeira portuguesa) para dividir os europeus e aproveitarem - fragmentadamente - o que cada um deles lhes pode dar em vantagens de investimento nacional. Todavia, neste momento o investimento chinês é feito sem grandes restrições nos sectores financeiro e energético, e aproveitando a brecha da nossa elevada dependência económica e financeira acabamos por negociar com os chineses numa base muito desigual, porque enfraquecida e sem a tal base de reciprocidade que seria desejável, até por uma questão de dimensão que Portugal, obviamente, não tem.


Mas esta é uma questão politicamente relevante e da ordem da macroeconomia, porque envolve muitos recursos financeiros, pelo que seria desejável que Portugal conseguisse, ao menos, dirigir boa parte desses importantes investimentos chineses para o desenvolvimento do interior do país, hoje desertificado, e que dele resultasse uma maior coesão territorial no conjunto nacional

Os vistos Gold são apenas um instrumento de luxo, mas outros poderiam ser desenhados para alargar ainda mais as áreas de intervenção em que os capitais chineses poderiam dar um contributo maior para o desenvolvimento do interior de Portugal, hoje desertificado, abandonado e entregue à sua sorte. Mas não um investimento qualquer, muito do qual é, hoje, como é sabido, feito com o comércio de produtos de baixa qualidade.

Esse novo investimento chinês, naturalmente com montantes exigíveis inferiores aos conhecidos no âmbito dos vistos Gold, deveria ter em linha de conta uma outra lógica, ou seja, uma lógica mais desenvolvimentista em reforço da coesão territorial, já que o Governo, pelas medidas que (não) tem conseguido tomar tem revelado uma grande incapacidade em criar condições para desenvolver o interior do país e fixar aí pessoas, recursos e competências. Cidades como Tomar, Abrantes, Portalegre e outras estão hoje carenciadas desse desenvolvimento. Um desenvolvimento que não consegue ser assegurado pelo empresariado local, pelas autarquias e pelo conjunto dos players regionais vocacionados para o chamado desenvolvimento regional. 

António Costa, no âmbito das suas preocupações em atrair mais e melhor investimento directo chinês para a economia nacional, poderia - ou deveria - pensar integradamente esta questão do desenvolvimento regional e da coesão territorial nas zonas de baixa densidade. Como autarca experiente sabe que as cidades, as regiões e o território são, hoje, realidades económicas, sociais e identitárias que, a par da globalização e da revolução tecnológica, marcam as bases civilizacionais deste 1º quartel do séc. XXI. 

Creio que este filão deveria preencher a agenda política de António Costa, não apenas para consumo interno e campanha eleitoral mas, essencialmente, para dar um verdadeiro contributo ao planeamento estratégico português em matéria de re-orientação dos investimentos estrangeiros em Portugal. 

Fica a ideia a par da convicção de que o papel dos assessores deve ir além da mera função de fazer sombra ao líder e candidato do PS a PM. 

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