segunda-feira

Em lume pouco brando - por Paulo Baldaia -


Quem estiver livre de preconceitos partidários ou mesmo pessoais percebe que sendo tudo isto muito mau para o Governo, é muito mau para o País. Relvas tem nas mãos dossiês muito importantes (Reforma Administrativa e privatização da RTP) e é o coordenador político de um Executivo onde há muitos governantes sem experiência política. O exemplo de gestão política que agora lhes dá não é o melhor. Não é preciso ser especialista para perceber que estas polémicas, alimentadas por fontes bem informadas, não se resolvem com silêncio à espera que a tormenta passe e toda a gente esqueça. O Parlamento é o espaço natural para em Democracia o ministro Miguel Relvas esclarecer o que tem de ser esclarecido, mas a verdade é que os políticos acham que o meio mais eficaz é uma entrevista a um canal de televisão.

É um daqueles casos que a realidade supera a ficção. Silva Carvalho era há um ano, mais coisa menos coisa, um personagem respeitado e elogiado por muito boa gente que agora o vê como alguém que transporta uma má onda contagiosa. Quem com ele se encontrou, falou ou trocou sms fica suspeito de qualquer coisa. O espião cai com estrondo porque está a arrastar muita gente com ele.

O caso Relvas não é um daqueles casos típicos em que um Governo é queimado em lume brando. O lume está no máximo e arrisca deixar o primeiro-ministro esturricado.

Se Relvas não tivesse o peso que tem no Executivo já não estava lá, mas também é por ele ter o peso político que tem que este caso já chamuscou, e muito, o Governo de Pedro Passos Coelho. Alguma coisa vai ter de acontecer. O País precisa de um governo forte, coeso e concentrado na acção. Relvas vai ter de falar. Se for esclarecedor, sai de cabeça erguida, se não for, vai ter de sair.

Na verdade, e uma vez mais descontando os preconceitos partidários ou pessoais, é evidente que este governo precisa de Relvas. É igualmente evidente que a imagem exterior do País é frágil e, por isso, precisamos de um governo forte, mas a verdade é que podemos estar à beira da primeira grande remodelação. Se Relvas sair é certo que não sai sozinho, sairão com ele ministros que não conseguiram deixar a sua marca na pasta que tutelam.

*) Diretor da TSF



Obs: É sempre útil ler os artigos de Paulo Baldaia. Contudo, deixo aqui algumas notas desgarradas: 1) neste momento, provavelmente, o PM aguarda o pedido de demisão de relvas, ou este espera que o PM o demita. Ou nem uma coisa nem outra. Seja como for, a decisão de Coelho comporta sempre custos políticos enormes (pessoais e políticos), embora a demissão seja a opção que, perante a opinião pública, ainda permite restaurar alguma confiança no PM, apesar de já ninguém acreditar que este Gov devolve a Portugal um mínimo de credibilidade; 2) nunca como neste caso, e até talvez durante as últimas décadas de democracia em Portugal, os media passaram a exercer, de súbito, e em resultado da prepotência dum ministro que ainda não compreendeu que o poder pode ser uma arma de dois gumes (sobretudo se for utilizado discriccionáriamente), o papel da espada de damôcles sobre a cabeça do Gov., envolvendo relações dangereuses a vários planos, todos com enormes níveis de gravidade, quer para a segurança do Estado, a fiabilidade da intelligence nacional (e até perante as agências congéneres que passam a olhar para Portugal como um bando de amadores e chantagistas), facto que poderá condicionar a troca de informações sobre terrorismo e contra-espionagem, que é para isso verdadeiramente que aqueles serviços servem, ou deveriam servir. E não para espiar as seduções frustradas do dr. balsemão que, como alguma gente sabe, sempre arrastou a asa às alunas da Univ. Nova nos 80´s e 90´s, sobretudo quando ainda havia fôlego e poder de explosão.

- Mas há uma razão subjacente a tudo isto que poderá ter sido o fuel de todo este plano executado por um espião que, manifestamente, se excedeu e, claro, não sendo nenhum James Bond, cometeu erros de palmatória. Essa circunstância é a seguinte: N.vasconcelos tem (ou tinha) uma dupla ambição na esfera dos media: por um lado, minar o poder que o grupo Impreza detém nos media em Portugal, por outro alavancar o grupo de empresas que a Ongoing patrocinaria para contrabalançar aquela hegemonia.Objectivos interligados. 

Naturalmente, fá-lo-ía com recurso a capital estrangeiro, talvez brasileiro, mas seria o bastante para reequilibrar o poder e a influência dos media em Portugal, fazendo a recomposição do poder nos grupos de comunicação em Portugal. Não o conseguindo, balsemão terá - aqui e agora - todas as razões (e todos os pretextos do mundo) para destruir o seu "afilhado" de forma definitiva e absoluta, de modo a que ele nunca mais possa ter sequer o sonho de, um dia, vir a disputar com ele essa influência mediática em Portugal.

Afinal, são estas guerras empresariais na área da comunicação que levaram NV a aliciar gente da intelligence a vender serviços de Estado para carburar essa ideia, que hoje não passa dum sonho convertido em pesadelo com a justiça à perna. E seria essa narrativa, muito bem contadinha, que um dia gostaria de ver aqui narrada por Paulo Baldaia.



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