Manuel Alegre afundará o PS com ele
A falta de coragem política da direcção do PS em escolher um candidato a Belém marcará, juntamente com a aplicação destas medidas de austeridade, o início do fim da gestão de Sócrates no poder. Um passivo que poderia ter sido evitado, pelo menos minorado, bastando que o PS tivesse marcado o perfil do seu candidato e, em função desse perfil, agido em conformidade. Não o fez e perdeu espaço de manobra, com Alegre a andar em road-show pelo país promovendo-se a si, à sua enorme vaidade e publicitando os seus livrinhos à boleia do tempo de antena que as estações de tv lhe foram, indevidamente, concedendo. É assim que funciona a democracia mediática em Portugal.
Isto, só por si, não explica por que razão Alegre levará o PS e Sócrates ao fundo. É bom não esquecer que desde a fundação da democracia, só em 2006 é que o PS perdeu a eleição a Belém. Soares, apoiado pelo PS, foi literalmente humilhado quando ficou em 3º lugar, atrás de Alegre, candidato independente, apesar de ter sido Cavaco o vencedor, como era previsível. Animado pelo seu milhão de votos Alegre julga que esses votos estão em estado sólido, não se evaporaram e, com esse pre-juízo, levou Sócrates e algum PS ao engano, quando, na prática, Alegre entra mal no eleitorado do centro, fica à porta da base de apoio da direita e isso, de per si, é já um prémio para Cavaco que irá fazer mais um passeio triunfal na Junqueira.
Por outro lado, o azar do PS é tal que tudo joga contra si: a conjuntura, a história, as medidas de austeridade do governo para sanear as finanças públicas à boleia da elevada tributação. O menos bom do PS junta-se, assim, ao mau do seu novel candidato a Belém, o que dá um molotov explosivo de maus resultados antecipados. Vejam-se as sondagens, um indicador importante que a semana passada deu quase a maiorida absoluta ao psd de PPCoelho, para que, certamente, também terá ajudado a incapacidade do PS em escolher um candidato a Belém novo, vigoroso e portador de futuro. Tudo características que Alegre não dispõe por ser um rosto do passado, que teve a sua importância histórica, seguramente, em dois momentos da história: na luta anti-fascista e na fundação do PS, mas isso, só por isso, não lhe dá currículo para ser o PR de Portugal quase 40 anos depois desses factos históricos.
Depois nunca se sabe se o Alegre (hipotético) PR alinha com as medidas do BE perante uma crise social no país. Perante tais incertezas é bem provável que os portugueses olhem para esta ficção de apoio do PS ao poeta e optem por Fernando Nobre, um homem impoluto, com currículo, com mundo, com uma imensa obra social intra e extra-muros, enfim um altruísta. Alguém, no fundo, que trás para a política os verdadeiros valores da solidariedade e do humanismo, que Alegre e Cavaco muito proclamam mas que, na prática, nunca praticaram.
Veremos, neste quadro, até onde vai a "consciência" de Mário Soares no apoio a Fernando Nobre. Veremos, pois, como ele racionaliza o seu ressentimento. Numa palavra: o apoio que Sócrates dá a Alegre é não apenas pouco entusiasta como fúnebre, as pessoas percebem que aquilo resultou dum facto consumado, duma ficção e duma quase-chantagem política que, seguramente, levará o PS e o seu secretário-geral aos piores resultados de sempre na história das eleições presidenciais em Portugal.
O que é um erro estratégico, pois num momento em que o Governo aumenta os impostos esmagando ainda mais os portugueses a fim de sanear as finanças públicas, seria expectável que o mesmo governo encontrasse uma hipótese alternativa de tipo credível que injectasse no sistema político esperança, entusiasmo e mobilização para derrotar Cavaco em Belém, o qual tem feito um mau lugar em nada prestigiando Portugal e os portugueses - dentro e fora de portas.
Confesso que não estou a ver a direita a dividir-se profundamente em torno de Cavaco, mas já começo a pensar que se o PS tivesse pensado apoiar o D. José Policarpo, a novel vedeta política do comentário em Portugal, com o beneplácito do Papa, num registo de alguma ironia, talvez se evitasse a catástrofe anunciada.
O azar deverá ser tanto e tamanho que assim que se soube que o PS formal passou a apoiar Alegre, com meses de atraso, nem já segmentos do eleitorado do BE votarão no poeta para Belém.
Etiquetas: catástrofe anunciada, Manuel Alegre, presidenciais 2011
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