quarta-feira

Os elefantes têm prioridade e o jogo das interpretâncias

  • Nota prévia: a leitura deste post deve ocorrer em correlação com o post imediatamente infra, especialmente após visualização do vídeo - Uma vergonha
Vejamos aqui os elefantes como simples referenciais, até porque não pude deixar de achar piada (e ao mesmo tempo tristeza e alguma frustração) na sequência da visualização do vídeo infra, logo remetendo este post para um problema de enunciados, tão importantes para os políticos, majistrados e demais gente que ocupa lugares no aparelho de Estado e que, por vezes, comunica com os pés.

Obviamente, não fiquealheio áquela expressão do PGR : tenho uma senhora que me faz o trabalho... Uma tal assessora. Mas a sinalização discursiva ficou, a questão comunicativa, semântica existe e, como tal, aqui a equacionamos sumariamente de forma utilitária. Quando se diz que os Elefantes têm prioridade - devemos estar atentos às estradas abertas e às que estão fechadas, bem como as que têm sentido obrigatório de modo a que nenhum turista fique esmagado aos pézinhos de um elefante.

Na maior parte das vezes, a função referencial dissolve-se noutras funções,sendo que a tarefa da informática é ajudar todas as pessoas, inclusivé os PGR digitalmente analfabetos (e aqui também podemos integrar Souto Moura, que não deixa saudades...), a armazenar e tratar a informação na sua forma mais racional, sem bem que a linguagem humana nunca seja neutra. Portanto, diga-se o que se disser - quando o homem diz que tem uma senhora que lhe trata do trabalho - acaba por se dizer sempre mais do que se queria dizer. Tanto mais na comunicação mediatizada, em que há uma enorme variedade de fórmulas que têm como finalidade verificar o circuito e de duzir milhentas leituras das comunicações.

Quer isto dizer que por vezes as palavras a mais são como o silêncio. Vejamos: durante anos andei à boleia, e depois passei a dar boleia a outros, e nesse jogo é natural que o condutor estabeleça uma conversa com a pessoa a quem deu boleia, doutro modo o silêncio é interpretado como uma atitude hostil incompreensível. Estabelencendo o paralelo: teria sido preferido que naquela situação narrada pelo vídeo infra - a Vergonha - o sr. PGR tivesse bem caladinho, assim poupar-nos-ía a uma multidão de asneiras que não revelam apenas iliteracia digital, mas também uma grave impreparação cultural e sociológica capaz de compreender o mundo contemporâneo, mormente na sua vertente de desvios e crimes contra a sociedade. Foi isso que me chocou, e não o facto do senhor confundir blogues com cartas anónimas, pois até nesta comparação foi tacanho e paroquial.

Nesse mesmo vídeo foram ditas palavras vazias, daí a forma como fixamos aquela narrativa: síndrome do esvaziamento. Mas a cuircunstância de o sr. PGR ter referido que tem uma senhora que faz o trabalho, ocorreu-me pensar o que diria essa senhora se estivesse alí, numa Comissão especializada da AR - depondo qualquer coisa. Será que ela diria, que tinha um senhor que lhe concluiria o trabalho - iniciado por ela sempre que ele - o PGR - lhe o solicitara?! Bom, nem quero pensar nesse jogo cruzado de narrativas lânguidas e luxuriantes nos gabintes da própria Procuradoria-Geral da República, que por natura deve ser um lugar austero.

Fiquemo-nos apenas por (mais) uma anedota popular judaica que ilustra bem esta situação. Em que um homem escreve a uma amiga, não para lhe pedir um trabalho informático mas para outra coisa, vejamos:

Querida Riwke, pfv manda-me as tuas pantufas. Claro que estou a falar das minhas pantufas e não das "tuas pantufas". Mas, se tu leres as "minhas pantufas", vais achar que o que eu quero são as tuas pantufas. Portanto, se eu escrever: "manda-me as tuas pantufas" - tu lês as tuas e percebes que o que eu quero são as minhas pantufas. Portanto, manda-me as tuas pantufas.

Se calhar o que o outro senhor queria mesmo dizer quando dizia ter uma senhora que lhe fazia o trabalho, tinha relação com isto: as pantufas. O que não deixa de ser uma (2ª) vergonha...