sábado

O Engº Sousa Veloso e o TV Rural. Um grande Português. Um programa histórico






O Engº Sousa Veloso. O TV Rural... 


Quase Trinta anos das nossas vidas. Quem hoje está na casa do "quarentas" lembra-se certamente do Engº Sousa Veloso. Eu lembro-me. Sei que o programa arrancou lá para 1959 e foi encerrado em 1990, salvo erro. O coveiro deste interessante e simbólico programa - que já que se confundia com Portugal - foi um tal senhor Arlindo Cunha.. que acho que foi ministro da Agricultura (hoje em crime económicos relacionados com o ex-BPN). 

Acho que encerrou o programa para meter uma cunha a um amigo - por sinal também de nome Sousa... Mas que nenhuma relação tinha com o verdadeiro e genuíno Engº Sousa Veloso - que durante 3 décadas - aos domingos - ilustrava os portugueses com os problemas regionais e locais da agricultura nacional. Aquela voz, aquela simplicidade dos homens grandes, aquela forma de agarrar os problemas do sector - especialmente num país então predominantemente agrícola. Tudo isso se ficou a dever a uma pessoa grande de alma - Sousa Veloso. Vejamos um pouco da história do programa:
  • A RTP queria experimentar um programa que versasse a agricultura em Portugal, e é então que, fruto de uma parceria com o Ministério da Agricultura, tem Sousa Veloso e Monteiro Alves a conduzirem um programa que faria história, não só na RTP mas em Portugal, vivendo por 30 anos: o TV Rural.
  • Premiado depois dos primeiros curtos filmes sobre agricultura, Sousa Veloso passou a conduzir o programa sozinho, e em pouco tempo foi dominando as várias técnicas de televisão. Muitas vezes, era ele quem produzia, realizava e montava, para além de apresentar. O seu estilo ficou para sempre ligado ao programa, e a sua voz reconhecia-se em qualquer sítio, tal era o hábito, carinho e interesse que os portugueses tinham adquirido em ver o TV Rural. Em 1963 Sousa Veloso recebe mesmo o Prémio Imprensa, por TV Rural, provando a qualidade, integridade e valor que se reconheciam ao programa.
  • Ontem à tarde tive o prazer e o privilégio de conhecer e de apertar a mão ao Sr. Engº Sousa Veloso. Foi um mero acaso. Confesso que desde "puto" que alimentava essa expectativa. Quase a roçar nos "quarentas" ela concretiza-se - com o engº Sousa Veloso a duplicar-me na idade - mas a ganhar-me em lucidez, desenvoltura e gosto pela vida. Estive à conversa com ele uns dez minutos e parece que recordei todos aqueles 30 anos de programas e de vivências comuns que também atravessaram a minha vida e a de meu Pai, dado que na década de 70 ele fez uma incursão pela Avicultura. Daí o meu relativo interesse pelo programa. Mas hoje tenho a certeza (se é que se podem ter certezas) que via o programa por causa do apresentador e não tanto por ser um interessado pelos meandros dos produtos da terra - que nunca fui. Salvo no prato...
  • Plantava-me em frente ao televisor com a ideia de que ia ouvir uma pessoa especial contar uma história real. Mas tudo aquilo - também pelo magnetismo da vox doce e singular - representava um fascínio para mim. Julgava que alguém me ia explicar a textura do paraíso na terra, mas a partir de um programa que envolvia cabras, pastores, agricultores, líderes de confederações (como José Manuel Casqueiro - que foi morrer estranhamente ao Brasil!!!), produtores de tudo e mais alguma coisa. E lá estava o engº Sousa Veloso a contar aquelas tramas entre uns e outros, harmonizando interesses desavindos que o solo gerava, fazendo a terra falar e deixando o país preso por um laço psico-afectivo que nunca mais se desfez. Este singelo blog procura ser a prova disso mesmo. Uma memória viva do passado que desejaria pudesse ter alguma utilidade no futuro. Mais que não seja para apagar algumas dores e completar algumas conversas que, ou estavam incompletas ou nunca chegaram a ser iniciadas.
  • De facto, ouvir a voz melodiosa - temperada de sonoridade e doçura do Engº Sousa Veloso - é um fascínio de criança que se concretizou em adulto. É, de facto, um suplemento de alma. Foi um prazer conhecê-lo. Através dele reconstitui muitas coisas boas de um passado que julgava esquecido. Outras memórias menos boas também vieram à tona, mas o importante é que temos memórias para valorizar sempre os acontecimentos positivos - pessoais ou institucionais - que, num dado momento, se cruzaram com as nossas vidas.
  • Para mim - o Engº Sousa Veloso e o TV Rural - eram como uma marca d'água que integram o código genétido do Portugal contemporâneo - que fez a transição para uma sociedade post-industrial - que hoje já se preocupa muito pouco com o mundo agrícola nacional, salvo quando existem catástrofes naturais - como a seca - e mandamos vir a Comissária da Agricultura para fazer o Relatório in loco a fim de confirmar a verdade dramática dos factos que estão à vista de todos. Podia-se, ao menos, poupar o dinheiro da viagem da senhora... Ela nada acrescentou ao que já se sabia.
  • Apertei a mão duas vezes ao engº Sousa Veloso. Pensava até que já tinha almoçado, lanchado, jantado com ele. Mas não, foi tudo sempre através da lente do Tv Rural. Ontem foi em solo de Carnaxide que me cruzei com ele e refiz algumas dessas linhas da história da minha vida e, também, a da minha família que entretanto já partiu. Só posso estar grato ao Engº Sousa Veloso pelo seu excepcional trabalho em prol da Agricultura em Portugal e, também, por ser um grande Português. Tão grande quanto amável e inspirador. E a sua voz continua um cristal de ressonâncias magnéticas que nos deixa com uma frustração terrível. É que depois ouvirmos a sua voz ouvimos o que nós próprios temos para dizer ao mundo...
  • Apertei-lhe a mão e para conservar esse breve (mas grande) registo - prometi a mim mesmo que não as lavarei tão cedo. E o mais curioso é que tenho também o prazer de ter um dos seus filhos como amigo sem que - um e outro - o saibam.
  • Interrogo-me como seria - hoje - um TV Rural (re)feito pelo seu autor de sempre... Ainda não perdi a esperança de, um dia, poder fazer a pergunta ao Engº Sousa Veloso... Talvez ele me possa responder e eu possa ter o privilégio de aqui publicar a sua resposta. Seria uma honra. Com a suavidade de veludo da sua voz e a experiência do seu conhecimento - que já atingiu o estatuto da sabedoria dos tempos. Tempos que já são eternos - nessa linha permanente do tempo. Uma linha que não se vê, mas está lá..., e um dia acabará connosco.
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