Back to the future: o tabulopes...
- Com aquela declaração, black & whith, que dá para tudo e não serve para nada, um figurão do teatro político luso despede-se dizendo que precisa de descansar por uns dias, mesmo quando o jornalista de serviço o interroga se as férias vão durar um ano.
- Confesso que cada vez mais me surpreende. Ver um treinador a acumular derrota sobre derrota, no final o sujeito dá uma conferência de imprensa para dizer: "vou só ali a baixo ao Algarve rosar-me um bocado, ver as estrangeiras, curtir a noite. Depois estamos aí, prontos para olhar para as presidenciais, mesmo que para o efeito - se tenha de engendrar mais um tabú: o "tabulopes", que é uma degenerescência da matriz. Ou seja, perde-se mas ganha-se. Ganha-se transferindo factores de risco e incerteza para os outros. O que interessa, no caso vertente, e não estou a falar do treinador do Benfica cujo nome me escapa, é o élan que a coisa provoca nas revistas do co-ra-ção.
- Toda esta "estória" tem contornos esquisitos, obriga-nos a deixar a razão e a normalidade para compreender a anormalidade e ganharmos intimidade com o absurdo, entretanto assumido como padrão no último ano político que incendiou Portugal, apesar do frio e da neve. Em Portugal, até o clima é paradoxal...
- Em rigor, o tabulopes faz lembrar aquela despedida que já cheira a regresso. O regresso d'alguém que nunca partiu. Ora é este tipo de raciocínio - que podemos designar de "raciocínio Lili Caneças", que explica muito do que ocorre hoje na direita moribunda, escorraçada recentemente nas urnas.
- Traduzido em miúdos, o tabulopes consiste no seguinte: imaginem um automobilista que viajava entre S. Bento e Belém. De súbito, o carro pára: estava sem gasolina, o combustível tinha-se esvaziado completamente. Perto havia uma povoação e nela um jovem, com mãos sapudas e olhar esgaziado, que fazia as vezes de mecânico. Examinou o carro e disse: - Não posso arranjar o depósito. Mas posso fazer outro igualsinho.
- De acordo - diz o automobilista. Colocado o novo depósito, devidamente abastecido, o homem lá partiu. Mas depois, o carro voltou a parar. A gasolina tinha-se sumido de novo. O jovem mecânico tinha feito, como prometera, um depósito rigorosamente igual ao anterior.
- Inclusive com um buraquinho...
- Nota: esta "estória" é dedicada aqueles que consideram o poder da História e da Lenda um elemento essencial para explicar o real do nosso absurdo. A anormalidade da nossa realidade. Sem, contudo, nos confundirmos com esses materiais políticos e com esses personagens. Mas para que as coisas aconteçam, temos de nos envolver na estória de que somos - quase - parte. Como diria Vergílio Ferreira: para vermos a casa temos de sair dela...
- Mas também podemos espreitar o mundo através da sua janela...
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