O PORTUGAL DE RISCO SA
O Portugal social e económico do nosso tempo podia resumir-se a duas anedotas: a 1ª entre um patrão e um trabalhador, entretanto despedido. Diz o patrão no seu monólogo:
“Não pense que foi despedido, pense apenas que está a contribuir para um Portugal globalmente mais competitivo”…
A 2ª anedota pode seguir o mesmo filão, mas com outra versão. Nesse caso, o mesmo empregado, de aspecto pobre e andrajoso, como que antecipando o mal que lhe irá cair em cima, entra no gabinete do patrão, que lhe pergunta: “o que é que o senhor tem”. O empregado responde que tem vários carros desportivos, várias casas de férias e algumas contas bancárias em diferentes países.
O patrão replica: então o senhor com esse aspecto…, ainda se queixa! O empregado responde que aquele foi o primeiro a começar a brincadeira.
A conclusão a que chegamos, especialmente, quando Portugal está a sentir o efeito dramático das multinacionais de risco que deslocalizam à velocidade da luz, é que a busca de um grau mais elevado de competitividade na economia em contexto de globalização competitiva, tem constituído uma das principais razões para a redução sistemática do emprego na Europa, e também em Portugal. Ainda bem que temos um filósofo, de seu nome Sócrates, que agora vai limitar a acção daquelas desumanas multinacionais do risco, que tomam o homem como um joguete da economia, em lugar de o colocar no centro do mundo. Read my lips: 150.000 postos de emprego… Será uma promessa? Uma mentira? Ou ambas, mas por diversa ordem…
Em Portugal as estatísticas não choram, e os familiares dos agentes políticos que temos, verdadeiros actores que mais não são que figurantes a representar um guião que desconhecem, em filmes de “série Y”, não sofrem as suas consequências. Resultado: as oportunidades para as maioria da população melhorar os seus padrões de vida são cada vez mais inacessíveis. Quer a Norte, quer a Sul do mundo. Aumenta a insegurança, generaliza-se o capitalismo (global e) selvagem que, pela 1ª vez na história, cresce sem gerar emprego, e o que existe é cada vez mais precário, descontínuo e informal.
Tudo somado gera uma situação de potencial molotov social a que os agentes políticos, por impreparação técnica, cultural e política, sentados à manjedoura do Estado, e com sede no Parlamento (onde dormem, limpam as unhas e palitam os dentes nos intervalos da leitura do jornal, depois de terem convenientemente assinado o ponto para preencher o salário na íntegra), não conseguem gerir e, assim, entram no terreno fértil e facilitista das promessas que sabem não poder cumprir. Daí decorre o fenómeno da polarização social, outrora chamado “brasileirização, que está a atingir em Portugal níveis insustentáveis e intoleráveis.
Esta passagem da sociedade inclusiva para uma sociedade excludente, de uma sociedade que assimila e integra para uma sociedade que marginaliza e exclui, leva-nos a pensar que a privação crónica a que Portugal está votado só pode conduzir ao crime, à insegurança, à intolerância e à perseguição. Tudo isto é perigoso porque conduz, em última instância, a uma sociedade da desconfiança e do ressentimento. É este gap, de forma dramática, que o mundo contemporâneo está a assistir. De óculos, sentado no seu sofá violeta, e de chávena de café nas mãos vendo o filme no plasma, o mundo vê agravar-se a distância entre haves e have nots, ricos e pobres, numa cadeia de explosões sociais cada vez mais incontrolada de violência política, institucional e pessoal.
Portugal, em rigor, tem um problema: uma elevada sinistralidade política, servida com uma inesperada santanice on the rocks, com gin tónico e mui pouca laranja.
Ora face a um sistema político com figurantes a representar as suas instituições, as consequências são imediatas: destruição do trabalho e o aumento dos níveis de desemprego. A ruptura é eminente, quebrando-se, nesta era de turbo-capitalismo, a aliança entre a sociedade, o mercado e o velhinho Estado-Providência. Parece, para concluir, que no Ocidente a clássica e íntima ligação entre o capitalismo e os direitos políticos, sociais e económicos e a democracia, deixou de ser uma obra de beneficência. Como aqueles desportos que o homem só pratica por uma questão de status, mas deixa imediatamente de praticar quando o dinheiro se acaba.
Eis o perigo ampliado pelas sociedades de risco (U. Beck) que faz agora carreira em Portugal, atingindo largas camadas da população e grupos sociais. Convertendo este perigo numa ameaça permanente, que parece já nem o Estado nem as Organizações Internacionais têm capacidade de resposta.
* Nota: ao ver a apresentação da lista do PP acompanhada do discurso do “Paulinho das feiras”, ao estilo de Mandrágora que hoje ofenderia Maquiavel, fiquei deveras sensibilizado por testemunhar tanta irmandade, solidariedade e caridade. Com tanta “ade” terminei a chorar, tanto que me afoguei em lágrimas altruístas… Foi, então, que percebi tratar-se de um partido verdadeiramente amigo dos velhos e dos pobres, e dos pobres e dos velhos…, que também votam e merecem, por isso, reformas mais chorudas.
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