Portugal "SS" e o célebre burro de Buridan (conclusão)
O Portugal romântico vive um momento realista. Romântico pela visão, realista pela necessidade dramática na luta dos problemas e conflitos que temos pela frente. Portugal mais parece um (tubo de) ensaio político romanceado em que há duas figuras centrais: Santana e Sócrates (SS) que intervém na área de influência da outra, mas em que nenhuma interfere com o País. Parecem dois conselheiros “acácios”, de ontem e de hoje, especializados em elogios fúnebres e referências à querida Europa que desconhecem, mas têm pena. Como o macarrão da sua querida Itália, onde lamentam (também) nunca ter estado.
É assim que vejo o “Portugal SS”, prolongando o projecto queiroziano de vingança e de retrato decadente do País, novamente ameaçado na sua autonomia política e sobrevivência económica e cultural. É o Portugal paroquiano da compra de votos e da obsessão com a imagem (política) revestida com factos Armani e corte de cabelo à George Clooney. O objectivo do momento é identificar a motivação dos comportamentos sociais para saber como melhor subordinar os vencidos às máquinas partidárias lideradas por caciques sem escrúpulos que, além de não terem uma visão para o país, falam mal o português e foram repetentes na escola.
Quem fala nas hierarquias das atractividades e na regulação da globalização competitiva (GC) em prol das populações? Quem fala em elevar o potencial de modernização da sociedade? Quem fala em reformar o Estado e reduzir drasticamente esse sorvedouro representado numa anquilosada Administração Pública (do selo e do suborno), que em nada ajuda o tecido económico e social do País? Perversamente, o Portugal SS, só fala nas listas, no Sr. Pôncio, nas “facadas nas costas”, nos “tachos” para os excluídos das listas do PP do “Paulinho das feiras”, nos cartazes do passado para emprestarem currículo futuro a quem nunca fez nada fora da política e num role de acusações de “faca e alguidar” que só desprestigia o País. O sistemático gap entre o prometido e o realizado, que se torna cumulativo, evidencia a deficiência do controlo político que deveria orientar a evolução das sociedades desenvolvidas. E o sistema político, que é a única instância de controlo dessa trajectória, é a 1ª a dar um mau exemplo por não atender às exigências dessa função, com a agravante da mesma não poder ser exercida por nenhuma outra, garantindo condições de legitimidade, eficácia e continuidade.
Resultado: Portugal caiu na armadilha do amadorismo político, espelhado na incongruência entre o anunciado e o concretizado, mostrando como o “guarda” (dos guardas) não vigia, e o regulador está desregulado. E assim chegámos onde estamos: uma sociedade de passado, em decadência, falha de ideias e capitais, frustrada na sua ânsia de modernização. Como diria F. Pessoa, já sistematizado noutra reflexão (Autopsicografia da crise): vestimos o dominó errado, com a máscara colada à cara e conhecemo-nos por quem não somos. É assim, hoje, que o Portugal SS se pode retratar quando olha no espelho e vê um país rachado.
Privilegiámos o distributivismo do Estado sem atender às necessidades futuras, o escol político é autor de inesperada incompetência e conflitualidade, não ganhámos posições na economia internacional e afastámo-nos da Europa. No fim, desejamos um modelo de desenvolvimento via globalização de rosto humano, mas só falamos nos fundos comunitários que deslizam para o leste europeu. Caminhamos contra a história, agora de feição para a China e Índia (a fábrica e o escritório do mundo). E constatamos que o poder político está cada vez mais condicionado e diminuído por esse efeito da complexidade gerado pela GC. Nem a resolução da Guerra-Fria a favor do Ocidente, nem a tese do Fim da história de Fukuyama, nem os fluxos migratórios (capitais & tecnologias), nem a GC (respondida à bomba pelas redes terroristas), nem a falta de competitividade económica e ausência de modelo de desenvolvimento, nem a dependência energética – nada – nos faz arrepiar caminho desta vil mediania.
Portugal vive uma “privação sensorial” que o conduz à angústia e à alucinação. É um problema de liberdade análoga à do burro (de Giovanni Buridan) que entre dois molhos de feno iguais, ou entre aveia e água, deixa-se morrer por incapacidade de escolha.
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