A Maçã de Lopes e as fábulas de La Fontaine
A vida política lusa, por razões de ilusionismo e de obsessão com o poder e os seus privilégios, tem-se aproximado do nível das fábulas. Em certos casos, a realidade ultrapassa a ficção, e os responsáveis por essa sinistralidade política, que estão identificados e alapados ao poder porque sabem que fora dela são uns “Zés nobodyis”, aproxima-se a passos largos da fábula da Maçã de La Fontaine que se conta numa penada.
Assim, e com a devida vénia à alta cultura revelada pelas reflexões políticas de Kumba Yalá, é útil conhecer a dita fábula da Maçã.
É sabido que La Fontaine tinha o costume de comer todas as tardes uma maçã cozida. Um dia saiu deixando a maça sobre o fogão; e, enquanto ele esteve fora, um dos seus amigos, que entrou no quarto, ao ver a maçã, deitou-lhe a mão e comeu-a.
La Fontaine, quando regressou, compreendeu logo o que se tinha passado e, fingindo grande emoção exclamou:
-Meu Deus! Que teria sido feito da maçã que deixei aqui?
-Não sei! – respondeu o amigo.
-Ainda bem! Alegro-me ouvi-lo dizer isso, pois eu tinha-lhe posto arsénico para matar ratos.
-Pobre de mim! Estou envenenado.
-Tranquilize-se, amigo – disse La Fontaine.
-Agora me lembro que não pus arsénico algum. Mas pesa-me que tenha sido necessária uma mentira para descobrir a Verdade.
Talvez um dia – alguém tenha a coragem de proclamar que as cadeiras do poder em Portugal estão todas infectadas com um vírus mortal, de modo a que apenas se sentem nelas quem está técnica, cultural e politicamente qualificado.
Mas em função desta obsessão pelo poder, porque estes videopolíticos nada são fora da política, nem ninguém os reconheceria na sociedade civil a fazer o que quer que seja, - temo bem que a técnica de La Fontaine não fosse eficaz. Se calhar, o melhor era mesmo envenenar as maçãs e as cadeiras do poder para livrar Portugal desta chaga e de tanta mediocridade e lata política.
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