Da desproporção e dos limites das coisas. O prémio a Greta
Da desproporção e dos limites das coisas
- Cada coisa em seu sítio
Toda a gente de bom senso valoriza a ideia de que os jovens se preocupem com o ambiente, dentro e fora das escolas; todos devem aceitar que os jovens devem contribuir para operar a mudança de sociedade, de tecnologia, enfim, de mentalidades em nome dum mundo mais limpo, mais justo e mais desenvolvido.
Contudo, se notarmos bem, o que a jovem Greta fez foi ter tido a coragem de faltar às aulas uma data de dias seguidos e pôr-se nas ruas com cartazes a fim de dramatizar o problema que afecta o planeta na sequência das mudanças climáticas. Fê-lo com especial afinco e um activismo só disponível aos mais ambiciosos e determinados.
Fê-lo com repercussão global, porque os media, à falta de tema mais "quente" (esgotado o tema da imigração e das idiotices globais do Trump) pegaram no assunto e ampliaram esse foco e emprestaram-lhe uma luz planetária. O resultado foi a elevação e a promoção a vedeta duma criança que, é bom sublinhar, não conseguiu avançar com UMA ÚNICA IDEIA ORIGINAL para combater as alterações climáticas que, por força do excesso de emissões de CO2 para a atmosfera por parte das indústrias dos países mais prevaricadores (China, Rússia, Irão, Índia...) provocam o degelo e, com isso, fazem subir o nível das águas que faz perigar as nossas cidades num quadro de desenvolvimento sustentável.
De facto, Greta tem o mérito de ter dramatizado - como nenhuma outra criança no planeta - esta problemática, sem, contudo, ter dado um contributo líquido para a forma de (como) resolver este problema colectivo.
Um problema que só pode ser resolvido estruturalmente se: (1) for encontrado um novo sistema económico que refreie o actual sistema capitalista neoliberal que nos faz produzir e consumir de forma intensiva, e que consome imensos recursos no planeta, os quais são cada vez mais finitos; (2) que esse novo sistema económico consiga substituir a tecnologia poluente por outra que não o seja, mas isso colocará, a curto e médio prazos, um problema de sustentabilidade económica. Temos o exemplo das baterias dos carros electricos que custam tanto (ou mais) que o preço das viaturas. O que desincentiva a procura desses veículos, pelo menos para já.
Naturalmente, a virtude da jovem que foi capa da Time consistiu em ter sido coerente, ou seja, ela adequou a sua causa à forma como procura viver no seu dia-a-dia. Portanto, se ela se preocupa com a emissão de CO2, então não anda de avião, transporta-se de barco. O que revela que tem uma estrutura e uma logística eficiente que a serve, servindo (supostamente) a sua causa.
Este simples encadeamento de factos revela coerência, mas será ela suficiente para ser considerada personalidade do Ano pela referida revista?!
Não teria sido mais relevante que a dita publicação se preocupasse mais com a actividade dos cientistas que trabalham arduamente para descobrir novos antídotos para inúmeros cancros que matam milhares de pessoas por ano?!
Com toda a sinceridade, olho para esta miúda como alguém com uma tremenda vocação para o teatro, para a capacidade de dramatizar causas nobres, mas, verdadeiramente, ela, ou a sua equipa, não conseguiram prendar o planeta com uma única ideia que possa beneficiar a vida colectiva e a sustentabilidade do planeta.
O resto redunda na vulgata discursiva do discurso pró-ambientalista que já remonta à década de 70 do séc. XX. Por isso, também aqui a revista Time foi sofrível na sua opção editorial. Cedeu ao show-of, em vez de ter procurado os casos verdadeiramente criativos e originais que salvam vidas e mudam o quotidiano das pessoas, das empresas e das sociedades.
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