António José Seguro e o lugar na história: uma dupla derrota diferida no tempo
Durante anos António José Seguro estudou, preparou-se e trabalhou politicamente para defrontar o PM em funções, debater com ele e substituir Passos em S. Bento a partir do Largo do Rato, como SG do PS. Foi este o seu propósito durante anos a fio. Especialmente, desde que Sócrates foi batido por Passos e este assumiu o Executivo em 2011, com os resultados desastrosos para o país que todos conhecemos.
Sucede, porém, que a liderança de Seguro não estava firme no PS (ainda com muitos herdeiros activos ligados a Sócrates com quem aquele estabelecera a ruptura), e Costa entendeu disputar com o seu colega essa liderança, pois era a única via para o edil da capital se candidatar a PM e ser ele, e não Seguro, a defrontar Passos nas eleições legislativas de Outubro de 2015. Eis o que veio a suceder, com Costa, num espectáculo que não foi bonito de se ver e inédito na história do PS (e dos partidos em geral!!!) a derrubar Seguro e a substituí-lo no Largo do Rato. Tudo transmitido em directo pelas estações de tv, com as emoções à flor da pele.
Agora, Costa defrontou Passos no primeiro e único debate político em directo para todas as estações de tv. Ganhou esse debate com larga vantagem, levando o PM ao chão por KO. Um feito que Seguro teria desejado ser ele a realizar, mas foi interrompido abruptamente nessa trajectória de ascensão ao poder pelo seu próprio colega de partido, A. Costa.
Foi nesse quadro político, demasiado apertado, que Seguro terá dito para os seus "botões" algumas coisas que valerá a pena recordar:
1. Terá mesmo valido a pena fazer aquela ruptura com o socratismo, como se ele nunca tivesse existido, deixando um bando de jovens turcos à solta na Assembleia da República que nunca reconheceu a sua autoridade política!?;
2. Terá mesmo valido a pena não ter aceite a oferta que cavaco lhe fez um ano antes para renegociar com Passos um acordo político ante a austeridade imposta pela Troika e endurecida e radicalizada depois pelo governo ultra-liberal de Passos e Portas!?;
3. Terá mesmo valido a pena negar o legado do PS, qualquer que ele fosse, em nome de um trilho próprio que acabou por lhe custar a sua própria cabeça?!
Porventura, António José Seguro ter-se-á colocado estas e outras questões no decurso do debate que António Costa travou com Passos Coelho, e que foi manifestamente ganho por aquele, que teria de mostrar mais serviço ao país se quer verdadeiramente ser o novo PM saído das eleições a 4 de Outubro próximo.
Provavelmente, Seguro viu-se - ou desejou ver-se - no lugar de Costa a debater com Passos, mas esse lugar havia sido brutalmente ocupado na sucessão intestina decorrida no PS. E isso deixou, certamente, marcas profundas. A essa luz, Seguro terá experimentado emocionalmente hoje a sua 2ª derrota política, pois não bastou ter sido cilindrado intestinamente por um seu colega de partido, como também viu que foi precisamente esse seu correlegionário de partido a vencer o debate que o elevará a PM daqui a 3 semanas. Algo pelo qual Seguro tanto se bateu, mas foi barrado nesse caminho, nessa ascensão.
A constatação comesinha destes factos, que são conhecidos, leva-nos à compreensão da dialéctica e ao movimento da História, aqui vista como a resultante da combinação dos efeitos dos actos livres de cada um dos homens mais ou menos conhecidos que compõem os partidos. Ou seja, cada livre decisão conta pouco em si mesma, mas o efeito final dessas inumeráveis acções disparadas em todos os sentidos gera o movimento histórico do conjunto.
Na prática, e Seguro deverá ter sentido isso na pele, o que não lhe subtrai valor ou dignidade, ainda que sem eficácia política, a livre decisão de cada homem está condicionada pelas circunstâncias vigentes no momento e por uma espécie de divina providência que lhe garantiu a liberdade de decisão. Por isso, a História emerge como uma combinação de liberdade e necessidade, porque, tendo na base a intervenção livre de cada homem, traduz-se numa resultante cujo desfecho nunca se conhece antecipadamente, nem pode imputar-se à vontade específica de nenhum.
Numa palavra, ainda que pareça que toda esta dinâmica decorreu da vontade de um homem, A. Costa, a História acaba por impor as suas regras, e essas passam, como referimos acima, pela combinação da liberdade e da necessidade, que depois são mitigadas pela ambição, determinação e o carisma de cada um nesse complexo jogo político em que se decide a vida de milhões de pessoas.
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