Naufrágios - por Viriato Soromenho Marques -
F erreira Fernandes, no seu artigo de ontem, disse quase tudo o que havia a dizer sobre a miséria moral e política que domina a atitude da União Europeia face à tragédia dos náufragos do Mediterrâneo. Que um jornalista do tabloide britânico Sun desumanize as 800 vítimas, sobretudo mulheres e crianças, do maior naufrágio de refugiados no Mediterrâneo, chamando-lhes "baratas", quase banaliza o facto de estarmos na iminência de em 2017 (ou mais cedo...) os franceses terem de escolher entre Marine le Pen e Sarkozy para a Presidência da República. Importa não esquecer que Sarkozy, depois de ter alegadamenterecebido dinheiro do tirano de Trípoli para as suas aventuras eleitorais, foi o principal instigador dos bombardeamentos aéreos da NATO, que não só liquidaram o regime de Kadaffi como transformaram a Líbia no inferno de terror que hoje empurra milhares de infelizes a tentarem abrigo na Europa. Infelizmente, os líderes da UE sofrem de uma doença autoimune, não percebendo, por exemplo, que todos os sofrimentos impostos aos gregos são feridas cometidas contra o nosso corpo europeu comum. O que mais espanta nesta crise europeia não é a incapacidade dos líderes, mas a porosidade generalizada da amnésia. Esquecemos que, quando a Europa se fragmenta, as "baratas" somos nós. Como os 9400 refugiados alemães da Prússia Oriental, entre os quais 5000 crianças, afogados no Báltico em 30 de janeiro de 1945, quando o navio hospital Wilhelm Gustloff foi torpedeado por um submarino soviético. Onze vezes mais vítimas do que no Mediterrâneo! Mas, quem conhece a história, sabe que na Europa todosos recordes de abjeção são apenas provisórios.
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