Evocação de Nicolau Maquiavel - 500 anos depois -
De Nicolau Maquiavel [1513-2013] já quase tudo está dito porque ele próprio o escreveu e melhor o pensou. De modo que pouco há a acrescentar ao seu imenso legado realista, salvo se julgarmos procedente que podemos alterar a realidade das coisas e a natureza do homem. O que é pouco provável. Assim, talvez o melhor, e com a simplicidade diante das pessoas grandes, seja o de procurar actualizar o seu pensamento em face da conjuntura, mas não mais do que isso, sob pena de incorrermos em pretensiosismos redescobertos a cada página da sua densa Obra, em particular os Discorsi.
Neste quadro, se quiser aplicar algumas regras legadas por Maquiavel aos actores menores desta Europa que se desconjunta e está em cacos, basta olharmos para a praxis política do actual presidente da CE, o compatriota Durão Barroso. Facilmente, aplicamos nele - e de forma política degenerada - todas as "boas" regras que Maquiavel teorizou para Il Principe. Mas que aqui se aplicam bem ao visado tomado como comezinho exemplo, pois é difícil encontrar entre os portugueses aquele que - perante o seu elevado nível de responsabilidade política - mais tem ofendido o povo português e penalizado ilegitimamente os seus interesses e, do exterior, colaborado numa chantagem pérfida e recorrente às suas instituições e ao princípio da separação de poderes que deve substanciar o rule of law.
Mas não é nada disto que se vê e ouve na boca desses altos dignitários, meros agentes, afinal, apenas preocupados com os seus próprios interesses, carreiras e caprichos. É a gula do poder tão bem vista vista por Nicolau. Também aqui Nicolau disse tudo acerca da condição humana e da sua soberba. O que neles se reconhece é, tão somente, um apelo ao out of law que, no caso de ser professado pelo cidadão comum, teria como consequência ir parar à cadeia.
Diria, sem querer ser atrevido, que Maquiavel escreveu um tratado permanente acerca da condição humana, e nele consta tudo o que de essencial o homem tem, deseja ou padece. Apenas, consoante as conjunturas e as tecnologias disponíveis, carece de alguma, pouca, actualização como comecei por referir.
Por vezes, invectivado das piores malícias, só porque conheceu como ninguém a verdadeira natureza humana, que também é vil, Maquiavel foi injuriado de tudo e por muitos, sob a acusação de ter corrompido a política e destruído a religião e os preceitos da moral. Mas, afinal, não foram os ensinamentos de Maquiavel que perverteram os príncipes que, por seu turno, governaram os povos. E alguns, como hoje sentimos em Portugal, governaram (e governam) mal.
Não basta pois, creio, invocar um qualquer Frederico da Prússia, numa versão refinada de um anti-maquiavel para desvalorizar o tratado de condição humana que Nicolau legou à humanidade. Não foi Maquiavel quem seduziu os príncipes a fazerem mal aos respectivos povos e Estados que sempre se degladiaram pelo melhor equilíbrio no concerto das nações, foram, sim, as circunstâncias políticas e o pensamento e acção concretos de todos os homens de Estado - em interacção entre si - que ditaram (e ditam) o balance of power (re)desenhado a cada conjuntura pelos mesmos homens de Estado que, por vezes, nenhuma estatura têm, porque fazem da mentira uma reinterpretação interessada dos factos (a que chamam verdade).
Portas (do smart-cds) é, neste particular, a teoria prática acabada deste reconhecimento neo-maquiavélico. É ele que é, de facto, o primeiro-ministro em funções no país, com a particularidade de nunca ter ganho uma eleição legislativa em Portugal e valer, hoje, no mercado eleitoral cerca de 6% das intenções de voto, e já com muita benevolência maquiavélica. Tamanha é a aberração sociológica desta sub-representação política.
Em suma, Maquiavel deixou-nos muitas questões por responder. Recupero aquela que me parece crucial para o nosso tempo: saber a quem se pode confiar com mais segurança a defesa da nossa LIBERDADE(?)
- Aos "aristocratas do risco" ou ao povo?
Quais são os que têm mais motivos para instigar esta destruição/desmantelamento do Estado sob a capa de reforma de Estado vertido num borrão de pseudo-reforma, como fez Portas (a envergonhar Portugal diante da Europa) - também ela desfeita pela incapacidade de liderança e de visão de Barroso.
Será que, nestes moldes destrutivos em que parece seguir aquela reforma do Estado, ganham aqueles que pretendem adquirir (vide, o processo de privatização dos Co$$eios) ou aqueles que querem conservar?
Talvez sem querer, o estudo acerca do Poder e da sua captura, manutenção e, se possível, reforço das condições do seu exercício - Maquiavel nos remete hoje para a questão de saber que tipo de instituições temos, e se elas salvaguardam a nossa liberdade, a liberdade comum. O que vemos em Portugal, nestes dois últimos anos, é um ataque crispado e sem fundamento jurídico-legal, a essas instituições e à liberdade de todos e de cada um dos portugueses, desde o esbulho reiterado de salários e pensões, ao confisco de propriedade e desregulação arbitrária do mercado laboral que tem escancarado a porta para despedimentos colectivos violadores da lei e das directrizes comunitárias.
Em que mãos, afinal, devemos hoje depositar a nossa liberdade quando se trata de eleger um novo Governo e, já agora, porque urgente, um outro Presidente da República (também violador da Constituição da República Portuguesa)?!
A Maquiavel e à sua imensa obra só tenho uma palavra: obrigado.
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