segunda-feira

Efeitos perversos duma coligação contra-natura: governar por mentirinhas



Já se percebeu que o affair RTP está a escavacar o que resta da coligação centro-direita no poder. O PSD envia o seu testa-de-ferro, o sr. Borges para fazer o dirty job, que Relvas há muito está incapacitado de fazer; e o CDS opõe-se não só ao aumento de impostos, como também discorda da forma como este assunto da RTP está sendo tratando, ou seja, com os pés. 

Todavia, o silêncio de Portas não irá durar muito mais tempo, ainda que esta situação objectivamente lhe interesse, na medida em que quanto mais tempo o Gov estiver em lume brando, mais rapidamente o PM se deslegitima do poder perante o eleitorado e a opinião pública, o que abrirá espaço político a Portas para este rasgar novos horizontes e dar largas à sua crónica ambição política, necessária para alimentar as suas crónicas clientelas privadas, muito privadas.
Daí que, paradoxalmente, estes erros de palmatória na forma como Coelho está a lidar com a privatização da RTP, que é uma pegada barafunda, serve os interesses políticos e partidários do CDS, que, aqui, até por uma questão de Estado, já deveria ter manifestado publicamente a sua (o)posição (assumida em surdina), mesmo que isso minasse ainda mais a confiança entre a coligação que, cada vez, é mais contranatura e insustentável. 

Por outro lado, o país também não pode (nem deve) estar sistematicamente a ser governado sob o método da projecção da mentira, que se põe a circular na opinião pública para aferir reacções dos vários domínios da sociedade. Eis o propósito do Gov ao pedir ao sr. Borges que apareça nas televisões, com ar grave - suscitando um desinteresse botânico - afirmando que o Gov deve encerrar a RTP2 e concessionar o Canal1 da RTP. 

Na forma, que em democracia é crucial, Borges não tem legitimidade para o fazer; na substância, a ideia é lesiva do interesse nacional. Uma dupla derrota que o Gov, com mais este teste de polígrafo da Lapa, arrecada na sua deslegitimidade crescente aos olhos dos portugueses.

Daqui decorre que as paixões e os interesses pessoais e empresariais, muito ligados a certas pessoas deste Gov, não deveriam ser o fio condutor para privatizar o que quer que fosse. Os portugueses não são parvos, e sabem que na calha está uma negociata altamente lesiva para o erário público, ainda por cima com uma quebra de identidade e de memória indesculpáveis. Ninguém está a ver uma empresa nacional concessionada a um grupo empresarial angolano saber fazer serviço público em Portugal. 

Com que quadros? Com que know-how? Os angolanos sabem, de facto, extrair petróleo e diamantes, não têm tradição nos media, salvo se se considerar que a nova censura poderá configurar um esteio de conhecimentos interessantes para produzir conteúdos ao nível dos media...

O sr. relvas (e o sr. PM) já deveriam saber que, apesar de tudo, é preferível tiranizar o saldo bancário dos portugueses a tiranizar os seus concidadãos, como este modelo trôpego de privatização, muito matizado de ouro negro e diamantes, tem denunciado.

Creio que os portugueses, no quadro do pior cenário pós 74, preferem continuar a ser alegremente esbulhados por Gaspar, nas Finanças, do que serem idiotizados por um modelo de privatização irreconhecível, nunca apresentado, desconhecido do próprio PM, de quem o país desconhece o que pensa sobre o assunto. 

Creio, salvo melhor opinião, que o affair RTP é daqueles temas quentes que testa a fiabilidade da república na denúncia dos homens e dos seus principais pecados: cobiça pelo dinheiro através de negócios ilegítimos, senão mesmo ilegais; o puro e duro desejo de poder, assente na libido dominandi; e alguma luxúria ao saber que se pode fazer o que se quer com os bens públicos, com os recursos comuns, restando uma certa ideia de impunidade e de que o Poder em exercício encontra sempre uma regra que excepciona o seu protagonista dos piores males que pode fazer ao bem comum.

Tal como ensinou Espinosa, todos os homens procuram os proveito próprio, mas raras vezes guiados pela razão sólida; na maior parte dos casos, o apetite é o seu guia, e os seus desejos e juízos sobre o que é benéfico ao bem comum são afastados pelas suas paixões, as quais não têm em conta o futuro ou o que quer que seja.

Neste quadro doutrinário, alguém está a ver Relvas ler Espinosa? Sobretudo, com a pressa que sempre teve em licenciar-se...

Parece que hoje já ninguém disputa o desejo de honra e de glória assente na competência, no mérito, na credibilidade, na transparência - verdadeiras pedras de toque da grandeza e virtude dos homens. Coisas que este Gov nunca soube, desde que tomou posse, revelar, e é pena.., até porque é composto de gente nova. 

Até pela média de idades o actual Gov poderia dar o exemplo, mas o que fica é apenas uma mancha de carvão, envelhecida...  

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