É tempo de realpolitik - por Viriato Soromenho Marques
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Obs: Não é fácil, para os dirigentes políticos e para os comentadores, transmitir más notícias ao eleitorado e à sociedade. Ninguém gosta de ser mensageiro de más notícias. Mais difícil ainda é quando essas más notícias têm implicações retroactivas, questionando velhas ideias, sistemas e comportamentos sociais - que esses dirigentes e comentadores anunciavam no passado recente com entusiasmo. Na prática, e iludidos e estimulados pelas taxas de crescimento que se mantiveram em valores elevados, na Europa, desde o fim da guerra até aos anos 70, o financiamento dos dispositivos das políticas sociais não anunciava dificuldades. Pelo que a ideia de progresso continuado, produzida pela filosofia ocidental da Idade da razão, encontrava um suplemento de alma nas ideias de solidariedade social enquadradas pela doutrina da justiça redistributiva, então em voga por filósofos sociais, de que destaco J. Rawls.
Essas ideias tornavam realista o projecto político europeu assente na redução da conflitualidade política e social com base na mobilização continuada das capacidades produtivas e criativas, o que gerava um nível de crescimento económico assente na redução da incerteza que marcava o ritmo de evolução das sociedades. Contendo também a possibilidade de regular a dinâmica das economias de molde a reduzir a amplitude das flutuações económicas. Ora, esse mundo mais ou menos regulável e previsível acabou. Por isso, defendo ser hoje o tempo dos filósofos por serem eles, de facto, quem melhor enquadram o risco e a incerteza nas suas análises sociais.
A corroborar esta posição está o saber partilhado por Viriato Soromenho Marques, um teórico da política e um filósofo social de 1ª água - que regularmente deixa ideias interessantes que merecem meditação no espaço público. Pois só um filósofo político da sua amplitude e densidade de conhecimentos se lembraria de evocar J. Habermas para lembrar que a Europa é um projecto político solidário e não egoísta, e, ao mesmo tempo, recuperar a opinião do ex-MNE alemão, J. Fischer para denunciar a visão de poder germânica imediatista de Merkel - que também fica muito a dever a homens de Estado da envergadura de W. Brandt, H. Schmidt, Kohl - sem esquecer Bismarck.
Esta ideia hobesiana de que a política internacional assenta no medo, na insegurança internacional é um regresso à realpolitik da linha neomaquiavélica da razão de Estado que, não só consolidou os dispositivos de poder do Estado nacional (weberiano) como introduziu uma competitividade adicional no sistema internacional que modelou o sistema até hoje.
Presentemente, a Europa está num carrefour delicado, entre a viabilidade minimalista dum projecto europeu - económica e socialmente - aceitável; e a implosão da arquitectura desenhada das instituições europeias do pós IIGM.
Em suma: esta reflexão do filósofo Soromenho Marques devia ser lida e meditada, especialmente pela srª Merkel e em nome dos superiores ideais, valores e interesses do velho continente.
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