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O próximo pesadelo da Europa - por Dani Rodrik

Próximo pesadelo da Europa 10.11.2011 - Por Dani Rodrik (via Público)
O cenário de pesadelo seria também uma vitória para o extremismo político ao estilo dos anos 1930. O fascismo, o nazismo e o comunismo eram filhos de uma chicotada contra a globalização, que vinha crescendo desde o final do século XIX, alimentando-se das ansiedades de grupos que se sentiam marginalizados e ameaçados pelas forças de mercado em expansão e pelas elites cosmopolitas.
O comércio livre e o padrão-ouro tinham exigido relegar para segundo plano prioridades internas tais como a reforma social, construção da nação e a reafirmação cultural. A crise económica e o fracasso da cooperação internacional comprometeram não só a globalização, mas também as elites que apoiavam a ordem existente.
Como escreveu o meu colega de Harvard, Jeff Frieden, foi assim que se abriu caminho para duas formas distintas de extremismo. Confrontados com a escolha entre equidade e integração económica, os comunistas escolheram a reforma social radical e a auto-suficiência económica. Confrontados com a escolha entre afirmação nacional e globalismo, os fascistas, os nazistas e os nacionalistas e escolheram a construção da nação.
Felizmente, o fascismo, o comunismo e outras formas de ditaduras encontram-se hoje ultrapassadas. Mas, existem tensões semelhantes entre integração económica e política local que estão, há muito tempo, latentes. O mercado único europeu tomou forma de uma maneira muito mais rápida do que o fez a comunidade política Europeia; a integração económica sobrepôs-se à integração política.
Daqui resulta que as preocupações crescentes sobre a erosão da segurança económica, estabilidade social e identidade cultural não podiam ser tratadas através dos canais políticos tradicionais. As estruturas políticas nacionais tornaram-se demasiado limitadas para oferecer soluções eficazes, enquanto as instituições europeias continuam demasiado fracas para exigir lealdade.
A extrema-direita é quem mais tem beneficiado com o fracasso dos centristas. Na Finlândia, o até então desconhecido partido Verdadeiros Finlandeses (True Finns) aproveitou o ressentimento em torno do resgate da zona euro para ser o terceiro mais votado nas eleições gerais de Abril. Na Holanda, o Partido para a Liberdade, de Geert Wilders, exerce poder suficiente para ser um elemento decisivo, sem o seu apoio, o governo de minoria liberal fracassaria. Em França, a Frente Nacional, que ficou em segundo lugar nas eleições presidenciais de 2002, foi revitalizada com Marine Le Pen.
A repercussão disto não está confinada aos membros da zona euro. Na Escandinávia, os Democratas da Suécia, um partido com raízes neonazis, entrou para o Parlamento no ano passado com cerca de 6% dos votos populares. Na Grã-Bretanha, uma sondagem recente indicou que mais de dois terços dos conservadores querem que a Grã-Bretanha saia da União Europeia.
Os movimentos políticos de extrema-direita são tradicionalmente alimentados pelo sentimento de anti-imigração. Mas os resgates da Grécia, Irlanda, Portugal, e outros, em conjunto com os problemas do euro, deram-lhes novo alento. O seu eurocepticismo parece, decerto, justificado pelos acontecimentos. Quando, recentemente, perguntaram a Marine Le Pen se iria retirar-se unilateralmente do euro, ela respondeu com confiança: "Quando eu for presidente, dentro de alguns meses, a zona euro provavelmente não existirá."
Tal como nos anos 30, o fracasso da cooperação internacional agravou a incapacidade dos políticos centristas de dar uma resposta adequada às exigências económicas, sociais e culturais dos seus constituintes internos. O projecto europeu e a zona euro definiram os termos do debate, de tal forma que, com a zona euro em farrapos, a legitimidade dessas elites irá receber um golpe ainda mais grave.
Os políticos centristas da Europa empenharam-se numa estratégia de "mais Europa" demasiado rápida para aliviar as ansiedades locais, embora não suficientemente rápida para criar uma comunidade política real em toda a Europa. Mantiveram-se durante demasiado tempo num caminho intermediário que é instável e afectado por tensões. Apegando-se a uma visão da Europa que se mostrou inviável, as elites centristas da Europa estão a pôr em risco a própria ideia de uma Europa unificada.
Do ponto de vista económico, a opção menos negativa passa por garantir que os inevitáveis incumprimentos e saídas da zona euro decorram da forma mais ordeira e coordenada possível. Também ao nível político é necessária uma verificação semelhante da realidade. O que a actual crise exige é uma reorientação explícita, longe de obrigações financeiras externas e austeridade relativamente às preocupações e aspirações nacionais. Tal como as economias nacionais saudáveis são o melhor garante de uma economia mundial aberta, as políticas nacionais saudáveis são o melhor garante de uma ordem internacional estável.
O desafio consiste em desenvolver uma nova narrativa política, com ênfase nos interesses e valores nacionais, sem conotações de nativismo nem de xenofobia. Se as elites centristas não estiverem à altura da tarefa, os representantes da extrema-direita preencherão, de boa vontade, o vazio, sem a moderação.
É por isso que o primeiro-ministro demissionário da Grécia, George Papandreou, teve a ideia certa com a sua proposta fracassada de convocar um referendo. Esta medida foi uma tentativa tardia de reconhecer a primazia da política interna, mesmo que os investidores a considerassem que isso, nas palavras de um editor do Financial Times editor, era "brincar com o fogo." Descartar o referendo significa, simplesmente, adiar o "dia do julgamento" e aumentar o derradeiro preço a pagar pela nova liderança da Grécia.
Hoje, já não se trata de saber se a política se vai tornar mais populista e menos internacionalista, mas sim de perceber se as consequências dessa mudança podem ser geridas sem a situação ficar feia. Na política da Europa, tal como na sua economia, parece que não há boas opções – apenas soluções menos más.
Obs: Dani revela aqui, em breves parágrafos, o dramas da Europa decadente que poderá culminar numa imensa tragédia, quiça com uma Europa a várias velocidades, como parece decorrer duma vontade oculta do eixo- franco-alemão em plena crise grega e italiana.
Mas o que releva nesta perspectiva do prof. de economia internacional foi reconhecer nele o valor da história económica e social do pós-IGM - em que o revanchismo irredento da Alemanha germinou até culminar na IIGM.
Parece que, com adaptações típicas da conjuntura, a história se vai repetindo, de drama em drama até à tragédia final. A Dani Rodrik só faltou citar talvez a obra de referência daquela conjuntura da autoria do historiador económico, Karl Polanyi, mas deveia citá-lo, até porque o fez de forma oculta, mas a fonte estava lá.

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