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A próxima batalha interna do PSD

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O pior que podia acontecer ao PSD neste momento era mais uma luta fratricida pela sua liderança. Pior ainda é que esse risco existe. Depois de Manuela Ferreira Leite ter aceitado sacrificar-se e carregar sobre os ombros a responsabilidade política e os custos eleitorais de ajudar a viabilizar o Orçamento do Governo, deixando o terreno limpo para quem a suceder (conseguindo terminar assim o mandato com dignidade), eis que é "compensada" com um possível duelo entre os seus dois delfins, Aguiar-Branco e Paulo Rangel. Ambos, apesar de o deputado europeu não o confirmar, parecem claramente interessados no lugar, tendo passado os últimos tempos a vigiar-se mutuamente e a travar entre si todas as manobras no terreno que lhes permitam avançar com uma candidatura sólida. Um condicionamento mútuo cujos resultados são mais que previsíveis.

Além de uma divisão ainda maior dentro da manta de retalhos em que o PSD se transformou, este duelo iminente tem a agravante de poder vir a colocar frente a frente dois protagonistas da mesma ala dos sociais-democratas, que era suposto unir-se e não defrontar-se no objectivo de encontrar uma alternativa a Passos Coelho.

Esta feira de vaidades - razão pela qual Marcelo se negou a voltar à terra - só descredibiliza o maior partido da oposição e mantém-no secundarizado nas lutas do poder, dando aliás margem de crescimento ao partido à sua direita, o CDS-PP. Portanto, se a opção for a falada "terceira via", e em vez de chegarem a acordo Rangel e Aguiar-Branco decidirem defrontar-se, o PSD continuará a ser um partido adiado, que deverá passar os próximos tempos a contestar o seu próprio líder, seja ele qual for, em vez de fazer oposição a sério e solidificar-se como alternativa de governação.

A agenda do Conselho de Estado

Se dúvidas ainda existissem, os factos tornam tudo bem claro: estamos já em pré-campanha eleitoral para as presidenciais, muito embora elas só se realizem daqui a um ano. Enquanto Manuel Alegre, o candidato "disponível", continua em rodagem pelo País à espera do apoio oficial e fundamental do PS, Cavaco, no papel de grande estadista, parece ir já no terceiro grande episódio da sua recandidatura por anunciar.

A convocação do Conselho de Estado - que se reúne pela quinta vez em quatro anos - para esta semana, para discutir, segundo a agenda de trabalhos, "os desafios do futuro e o novo quadro parlamentar", mostra Cavaco a colocar-se no seu papel de presidente suprapartidário, preocupado apenas com os graves problemas económicos e sociais do País, fiel da balança para os acordos políticos que mantenham a boa governabilidade em minoria. O mesmo Cavaco, afinal, do discurso de Ano Novo - o ponto de partida para a negociação e viabilização do Orçamento - e dos recentes avisos críticos deixados no arranque do ano judicial.

O Conselho de Estado em que, entre outros, se sentarão à mesma mesa Cavaco e Sócrates, Jardim e César, e Alegre e Soares parece mais uma conferência nacional para acordos gerais de bom senso. Se tiver bons resultados, sairá vencedor quem a preside.

Obs: O PSD nasceu duma conflitualidade entre potenciais líderes a desejar ocupar a liderança do partido. Tem sido assim ao longo da história, e se exceptuarmos o marco da sua fundação (com Sá Carneiro) - as escolhas pelo líder foram sempre aguerridas e polémicos, e nem sempre com proveito para a nação. Assim como pouco proveitoso para a nação é o putativo candidato do PS, perdão do BE, a Belém, na figura do poeta-Alegre, ser lançada de forma extemporânea e a um ano das eleições. Isto nunca se viu na democracia portuguesa, pelo que Alegre apenas oferece ao país um mau precedente para a nossa democracia formal, que tem procedimentos, prazos e regras. Tudo coisas que o poeta, não sei se por ser poeta, ou desconhece ou subverte, o que é lamentável para Portugal. Mas são aquelas características que também fazem a democracia - que o poeta desfaz no impulso descontrolado de vaidade pessoal que nenhuma relação tem com a democracia nem com a modernização nem com o desenvolvimento da sociedade e da economia do país.