sábado

Esboço duma nova ordem social em Portugal

Do que se sabe sobre o pão & circo do tempo que passa no affair freeport, esta será uma oportunidade para se provar várias coisas: se os mails que referem o nome do PM não resultaram de abuso de confiança; se o património do PM engrandeceu exponencialmente, o que será fácil de verificar compulsando o património que tinha antes com o que tem hoje; se o rasto do dinheiro ligam às suas contas - ou tiveram outro(s) destinatários.

As dúvidas existem, se é que não foram forjadas, as autoridades judiciais têm a obrigação e o dever de as esclarecer com urgência e de forma cabal. Mas o modus operandi da SFO britânica parece querer vingar-se de algo, talvez de algum procedimento da PJ no caso Maddie. Tudo será possível neste admirável mundo novo.

Entretanto, o PM tem também aqui uma excelente oportunidade para peneirar aqueles que acreditam nele, na sua honra e bom nome, daqueles que andam caladinhos que nem ratos a imitar a Ferreira leite no tempo do hibernanço: não falam, não escrevem, não declaram, não omitem, alguns até deixaram de existir, não vá o diabo tecê-las - e a corja (que existe em todos os partidos, em particular numa certa qualidade de pessoal político caciqueiro e assessorial sem qualidade para ultrapassar a sala do economato) - já deve estar a fazer os seus cálculos, para o caso da pior hiopótese prevalecer, e o PM tiver que resignar. Tese em que não acredito.

Nesta conformidade, apraz-me registar que dado por adquirido que a questão da legalidade do projecto freeport foi cumprida, a questão inscreve-se agora mais na esfera na legitimidade - na medida em que neste contexto de ping-pong entre Portugal e Reino Unido (com as respectivas autoridades judiciais a cooperarem apenas nos dias ímpares) torna-se particularmente evidente a embricação das legitimações sociológica e ética.

Ou seja, se o Príncipe não tiver razão, o povo não o deverá seguir. Pois ninguém deve agir contra o direito, que aqui ainda não se provou. Se, como se pensa, o Príncipe tiver razão, o seu poder e a sua legitimidade ainda sairão mais reforçadas, na sequência da pressão sofrida e da compaixão que o povo naturalmente lhe dedica, reforçando a sua confiança.

Se os jornalistas e os jornais têm o direito de investigar, apurar os seus factos - já não têm o direito de publicar tudo aquilo que querem, porque ao poderem ser imprecisos ou involuntáriamente incriminatórios estão, antecipadamente, a incriminar e a julgar na praça pública os suspeitos que nunca foram (sequer) constituídos arguídos.

Veja-se o que os media fizeram a Ferro Rodrigues...

Estes julgamentos na praça pública dão sempre mau resultado, lembram-se aquelas práticas abusivas, intrusivas e incriminatórias ao estilo do semanário Independente então dirigido por Paulo portas, quando este acusou João de Deus Pinheiro de ter roubado a célebre manta do avião, depois, ao provar-se ter mentido, foi obrigado a pagar uma boa indemnização ao visado. Os casos repetiram-se, e o então director desse pasquim passava mais tempo nos tribunais do que nas redacções do jornal, e isto não deve ser agora descurado.

Julgar, como faz o semanário sol e outros meios, com base em mails que têm quase uma década, não deixa de ser um meio de prova interessante, pronunciado jornalísticamente de forma retroactiva, tendo pelo caminho a campanha freeport de 2005, e agora a sua reedição de 2009. Estranho e incompatível com um estado de direito.

Creio que este caso será paradigmático, dado os paralelos com as próprias revoluções, ou seja, quando os revoltosos tentam depôr o poder estabelecido porque o acham injusto ou cruel - podem conseguir ou não:

  • Se não conseguirem fazer vingar a revolução, os revoltosos são depostos pelo poder estabelecido, alguns são mortos e outros despachados para a prisão;
  • Se, ao invés, conseguirem fazer vingar a revolução, quem está no poder sai pela porta do cavalo aos pontapés e encontra um destino miserável.
A limitação a esta forma de actuar reside na limitação pelo Direito e pela aplicação da Justiça que, em Portugal, e à luz do que se conhece (veja-se a vergonha do caso Casa Pia), é que deveriam estar hoje no banco dos réus, com os juízes sentados na linha da frente tentando explicar aos 10 milhões de portugueses - porque razão se deixou apodrecer casos e processos que nunca chegaram a ver a luz do dia, quanto mais a conhecer a justiça.
Em rigor, a justiça portuguesa é já um caso de arquivamento - antes mesmo de alguém competente a declarar arquivada.