terça-feira

A decepção de Ferreira Leite - por João Miguel Tavares -

A DECEPÇÃO FERREIRA LEITE, dn João Miguel Tavares Jornalista
Eu não tenho nada contra o silêncio de Manuela Ferreira Leite. O meu problema é mesmo quando ela fala. Ao fim de três meses à frente do PSD, não me lembro de uma única ocasião - uma só, solitária e viuvinha - em que depois de a escutar, a ela ou à sua comissão política, eu tenha pensado para mim mesmo "ena, está bem visto, tem toda a razão". Jesus Cristo passou 40 dias no deserto antes de iniciar a sua vida pública, mas pelo menos quando regressou tinha alguma coisa de relevante para dizer. Será que Manuela tem? Veja-se o caso do recente e muito badalado pedido de demissão do ministro da Administração Interna, na sequência da onda de crimes violentos. Depois de um longo retiro espiritual, embrenhado em profundíssimas reflexões sobre a Universidade de Verão, o PSD lança um comunicado onde defende, com inigualável originalidade o afastamento de Rui Pereira do Governo. Uau. Isto é o mesmo que passar cinco anos a estudar engenharia hidráulica só para aprender a regar batatas.
Estão a brincar connosco, certo? Um partido de oposição, sobretudo numa altura em que alegadamente aposta na "seriedade" e na recusa a todo o custo da "demagogia", não pode vir a público exigir a demissão de um ministro porque uma carrinha da Prosegur foi assaltada à bomba e um dono de uma joalharia morto a tiro. Se criticar políticas é o mesmo que pedir a cabeça de ministros, então deixem estar que eu também sei liderar a oposição. Que o Bloco de Esquerda o faça, tudo bem. Que o CDS o faça, percebe-se. Que o Partido Comunista o faça, ainda se aceita. Mas o PSD? Faria algum sentido que o responsável máximo das polícias em Portugal tivesse o seu lugar dependente do nível de actividade de ladrões e pistoleiros? Isso não é uma atitude séria. E, sobretudo, é uma atitude profundamente populista - como populista tem sido o discurso sobre o papão das obras públicas.
É por isso que já começa a fazer sentido falar de uma "decepção Ferreira Leite". Não - repito - por até agora ela ter falado pouco. Um líder do PSD não está obrigado a um picar de ponto verbal ou a preencher uma quota mínima de banalidades para debitar semanalmente. O problema - o grande problema - é que as intervenções de Manuela Ferreira Leite e da sua comissão política têm sido de uma enorme mediania. Tanto mais que, aí sim, o silêncio faz aumentar as expectativas. O discurso que a senhora vai proferir a 7 de Setembro, no encerramento da Universidade de Verão, não terá de ser necessariamente um sermão da Montanha, mas será uma desgraça se se limitar a parir um rato. Qualquer pessoa olha para Manuela Ferreira Leite e vê ali empenho e seriedade. Mas isso não chega. O País precisa de ideias novas como de pão para a boca. E até agora, se tivesse ficado à espera do PSD, já tínhamos todos morrido à fome.
Obs: Digamos que o PSD - nesta fase da vida - tem pautado a sua actuação por um grande silêncio. Mas um silêncio ensurdecedor pior do que o congénito barulho populista do BE e demagogia do cds. Pergunto-me por que razão não se fundem os três partido - BE-CDS-PSD e criam aquilo que o douto Marcelo diz resultar da necessidade do Pacto. Seria o pacto da direita com a extrema-esquerda caviar, uma novidade em Portugal. Com isto seguramente até a silenciosa Ferreira Leite se surpreenderia.