terça-feira

A América d' hoje, de sempre. Há coisas que não mudam...

Entre alegados planeamentos de assassínio a Barack Obama, em Denver, no Colorado, onde se fará a unificação suprema do partido Democrata após a refrega eleitoral dentro do partido do burro, a América lá vai marchando com as suas forças e fraquezas. Onde até se vêem as apoiantes de dona Hilário Clinton alinhar com o candidato republicano, o que na América é usual e não se deve estranhar. Por cá, em matéria de eleição do Presidente da República - que não exige disciplina de voto - são muitos os políticos de esquerda que votaram em Cavaco, porventura hoje já desiludidos, mas isso é outra história. E até parece que Meneses, Valentim Loureiro - e outros nados-mortos do PSD - já declararam publicamente apoiar Sócrates nas próximas eleições legislativas em 2009.
Mas a América é um país tão avançado quanto desigual: é o país dos seguros privados, excluindo grande parte da população de um acesso normal e regular ao sistema de saúde; grande debilidade do sector público, o que se comprova com a sujidade, insegurança e ausência de urbanismo das grandes cidades, destruição da natureza, a poluição do ar e das águas. Tudo isso integra o progresso técnico e tecnológico da América, tal qual a conhecemos. Sempre na vanguarda da ciência e da colonização do espaço sideral. Apesar de ter um presidente que nunca teve os pés bem assentes na terra.
Fraca na intervenção dos meios públicos, apesar do grande avanço industrial, científico e tecnológico, além duma tremenda sociedade de consumo. Na frente externa os EUA intervieram por várias vezes, em boa medida por meios militares, ocultos ou ostensivos, mas com a justificação de proteger os seus investimentos no estrangeiro e impedirem a expansão do comunismo. É óbvio que esta foi a justificação dada no decurso de meio século de Guerra Fria, hoje o quadro justificativo é outro, mas menos eficaz, e é ainda o terrorismo global e suicidário, por um lado, os interesses do petróleo e a ameaça russa, chinesa, norte-coreana e iraniana no mundo, por outro, que afiam as facas na República Imperial de Washington DC.
Ela é a leadership mas já ninguém a ouve e respeita. Nem a Europa. A Rússia no outro dia esmagou a Geórgia - por esta ter querido manter nas baias as suas duas províncias, Ossétia do Sul e Abcásia, ambas pró-russas e foi oque se viu: uma flagrante violação do Direito Internacional Público da Rússia sobre a Geórgia (com milhares de mortos e mais de 100 mil refugiados) - mandando às urtigas todas a leis e convenções internacionais sobre reconhecimentos e fronteiras. Aqui a ONU e a UE (com Durão barroso à cabeça) faz sempre o papel daquele expectador passivo que mais parece um idiota. As usual...
Fraco socialismo, pouco sindicalismo e muita, muita concorrência na capital do regime neoliberal - onde tudo, mas tudo é profundamente concorrencial. Até as gorjetas caem nesse registo infernal do poder do dinheiro. Quem não alinha nesse poderoso jogo, é cuspido borda-fora. Utilizam a religião para assegurar a manutenção do liberalismo político, o que leva ao reconhecimento de cada um praticar a religião da sua escolha, que em regra é devolvida com alguma irreligiosidade e intolerância de queima das bruxas, sobretudo em Boston, como ocorreu no séc. XVIII. Enfim, todos nós conhecemos o nosso Marquês de Pombal. Bom numas coisas, execrável noutras.
Depois de tanta energia, vivem para si, isolados, disposição natural que Tocqueville explica pelo êxito das suas instituições, daí a tendência dominante da América para a introversão, e, por isso - a grande maioria da sua população - é naturalmente estúpida e ignorante. Depois, o localismo fervoroso - onde assentam o sistema de cidades. Se aí alguns viam o fundamento da descentralização em que assenta a própria democracia, outros vêem os perigos da compartimentação dos problemas e o egoísmo típico da América e dos americanos que só se preocupam com o seu próprio quintal.
A opinião pública, ao contrário do que se pensa, é localista e provinciana, tudo e todos estão primáriamente centrados no seu umbigo. Ainda que aquele amontoado de Estados resultasse dessa tendência federalista que exigiu maior autoridade da União sobre os Estados-membros/federados.
Até nos partidos políticos a América apresenta diferenças, já que aí o bipartidarismo é muito diferente do bipartidarismo inglês, por exemplo. Na estrutura e no papel social que desempenham. A ausência de ideologia na América - transfere para a própria infra-estrutura social a capacidade de decidir pelo candidato A ou B. Razão por que agora, derrotada Hilary Clinton - muitos dos seus apoiantes - declaram o seu apoio ao candidato republicano - opositor de Obama, do partido Democrata, o mesmo da srª Clinton. E nada disto é de estranhar.
Nem as lutas entre federalistas vs anti-federalistas têm um cunho ideológico e a rivalidade entre democratas e republicanos também já se perdeu há muito. De modo que os republicanos são mais conservadores, como o psd em Portugal (se houvesse psd, claro está!!!) e os Democratas - como o PS cá - mais reformistas e apostados na mudança social.
Mas essas diferenças, curiosamente, são muito mais marcantes dentro de cada partido do que entre os partidos Democrata (burro) e Conservador (elefante) que rivalizam a captura do poder de 4 em 4 anos naquele regime de presidencialismo puro e duro norte-americano.
O que ajuda a explicar que as apoiantes de dona Hilária Clinton queiram ver Obama pelas ruas da amargura, de preferência em terras de África - donde jamais deveria ter saído, segundo alguns.
Contudo, veremos se esta tese do alegado assassínio de Obama não funcionará mais pela sua vitimização - ajudando-o a catalizar a América que falta e ficou presa em Clinton - do que própriamente a enquistá-lo na terra do Tio Sam e, com isso, a abrir caminho para o avózinho republicano que, em rigor, já tem idade para ter juízo e deixar-se de aventuras coladas com a nostálgia da guerra do Vietnam.
Até porque hoje já não há heróis, e os que existem estão fora da história. Porventura dentro de alguma consola de jogos de vídeo de guerra com que os miúdos e os adolescentes norte-americanos socializam e crescem, sendo com base nessa violência virtual subjectivada que depois entram num escola e "despacham" dezenas de colegas e de professores.
Por vezes a coisa ainda é pior do que os acidentes de avião...