sexta-feira

A Olhar o Mundo - por António Vitorino -

OLHAR O MUNDO [link] António Vitorino
jurista
"As questões de segurança têm vindo a ganhar relevância acrescida no quadro europeu. O aspecto mais inovador do Tratado Constitucional, repescado, no essencial, pelo Tratado de Lisboa, diz respeito precisamente à chamada "cooperação estruturada" em matéria de segurança e defesa.
No plano internacional, a grande incógnita é a de saber se esta alteração dos Tratados significa que a União Europeia vai tomar a sério as suas responsabilidades globais, combinando a sua acção de potência civil com o desenvolvimento de uma capacidade militar própria e efectiva.
No plano interno, a incógnita consiste em saber se o grau de confiança mútua entre os Estados da União viabilizará o desenvolvimento desta "cooperação estruturada" e se, em face disso, os cidadãos europeus estão preparados para o que decorre de uma tal opção de fundo.
De qualquer modo, os Estados membros da União não podem deixar de se preparar para esta nova dinâmica introduzida pelo Tratado de Lisboa. E isto a dois níveis.
Desde logo, no plano político, pela decisão de participarem ou não nessa forma especial de cooperação em matéria de segurança e defesa. A decisão de participar é livre, baseia-se na vontade de cada Estado em cooperar e pressupõe o preenchimento de alguns requisitos de capacidades militares e de envolvimento de forças.
No plano militar, trata-se de adaptar o sistema de forças de cada país às exigências deste esforço conjunto, por forma a que a resultante de tal cooperação signifique valor acrescentado quer para a União no seu todo quer para cada um dos países que nela participe.
Em termos políticos, o nosso país sempre tem defendido uma linha de acção de participar nos módulos de aprofundamento da integração europeia, por se entender que tal corresponde aos interesses de um país com a dimensão e as características do nosso. Foi assim com o mercado interno logo em 1986, com o espaço sem fronteiras internas de Schengen e também na adesão ao euro.
Sem prejuízo do debate que haverá que fazer sobre o tema, pode-se presumir à partida que também no que concerne a esta "cooperação estruturada" seguiremos a mesma linha de conduta.
O que implica retirar os corolários necessários no plano da estruturação do aparelho de Defesa nacional e das nossas Forças Armadas.
É, pois, neste contexto que faz sentido debater a reforma que recentemente foi apresentada pelo ministro da Defesa. Ela pretende responder não apenas às nossas necessidades de segurança e de defesa enquanto país, mas também fazer face às nossas obrigações internacionais, na NATO e na União Europeia.
Nesse quadro, é particularmente relevante o projecto de criação faseada de um Estado-Maior Conjunto, assente na clarificação das responsabilidades recíprocas do Ministério da Defesa e das estruturas das Forças Armadas, especialmente mediante a valorização do papel do chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas.
A relação entre o poder político democrático e a instituição militar encontra-se entre nós suficientemente estabilizada para poder permitir alcançar soluções que partam de um pressuposto de confiança mútua, eliminando alguns escolhos de um passado por vezes conturbado ou feito de reservas e de reticências recíprocas.
A reforma das Forças Armadas, nela se incluindo a componente do ensino militar e a definição das prioridades em equipamentos e infra-estruturas, deverá permitir-nos assumir responsabilidades acrescidas em termos de intervenções conjuntas e combinadas, desse modo potenciando a presença de Portugal nas alianças de que faz parte e nas zonas do globo onde a história e a geopolítica lhe impõem responsabilidades.
Por isso, mais do que olhar para o umbigo ou para os horizontes estreitos de cada capelinha, a reforma tem de se nortear essencialmente pelas soluções que melhor sirvam o interesse nacional.
E esse interesse passa pela valorização do contributo que as nossas Forças Armadas dão, no seu conjunto, para a afirmação e consolidação da presença portuguesa no mundo conturbado em que vivemos".
Obs: Publique-se pelo manifesto interesse para a segurança e paz internacionais em que as forças portuguesas estão integradas, para a reforma das FAs e a criação do Estado-Maior Conjunto e o papel acrescido que nele terá o PR.