quarta-feira

A estória do Movimento que queria ser Partido. Um falhanço à vista...

O anúncio de que a apresentação do Movimento Esperança Portugal (MEP) divide politólogos quanto há existência de um espaço partidário a ocupar ao centro, mas une-os quanto às dificuldades na formação como partido, tem razão de ser..

A 1ª coisa que me ocorreu foi estabelecer o paralelo entre esta situação e o blog de Pacheco Pereira, vq sabemos que o seu autor vale mais do que o blog de que é autor. Nessa medida, será legítimo defendermos que estamos perante um blog-cerebridade, ou que parasita a notoriedade do seu autor pela projecção que este tem na sociedade, mormente pelo fácil acesso aos media e pela regular exposição com que aparece para fazer opinião, como quem faz salsichas.

No caso vertente de Rui Marques, ex-alto comissário para a Imigração e Diálogo Intercultural esta equação pode, legitimamente, equacionar-se. Na prática, Rui Marques entende que as funções políticas que desenvolveu em prol da Imigração lhe deram um capital simbólico e político que ele, à semelhança do poeta Alegre, quererá capitalizar. Em democracia é legítimo, embora não deixe de ser algo oportunista na medida em que se aproveitou a titularidade de determinadas funções públicas para agora serem canalisadas (ideológicamente) para a esfera política. Programa não existe, projecto também não. São apenas um movimento humanista que se quer colocar entre o PS e PSD, numa versão imigrante daquilo que Freitas do Amaral tentou fazer durante anos com aquela bolinha ao Centro - equidistante da direita e da esquerda do espectro político.
De certo modo Diogo estava certo, o problema foi paulo Portas, que estragou o partido, fazendo-o descer para níveis de impopularidade ainda mais baixos do que o actual líder que anda por aí a por processos judiciais às pessoas porque não se aguenta a discutir política com elas. Que vá para casa e calce as pantufas...

Contudo, não creio que Rui Marques tenha sucesso nessa deriva, ainda que legítima. Beneficiará, certamente, de algum tempo de antena, aparecerá mais vezes na TV, na rádio, escreverá uns artiguitos no Público do sô Zé Manoel Fernandez, de quando em vez a tsf lembrar-se-á dele, será mais vezes convidado pela Rádio Renascença e mais uns etc de comunicação.

Em rigor, tratar-se-á mais de uma afirmação grupal, de um movimento que aproveitará uma onda de valores (ligados à Imigração), ao multiculturalismo, aos direitos humanos, com sorte também aos direitos dos animais (como hoje se via frente à CML - para promover o canil de Lisboa que nem uma das promotoras do evento que distribuía panfletos sabia onde ficava), mas não passará de um conjunto de atitudes políticas mais ou menos dispersas e, a prazo, sossobrará.

Rui Marques lembrou-se desta iniciativa como amanhã o Pre. Vitor Melícias ou Feitor Pinto poderão aderir a ele, num gesto de boa vontade, e, portanto, com uma predisposição ou uma propensão para orientar um conjunto de valores da sociedade para o combate ao racismo, não à violência na sociedade e no desporto, por exemplo, e dum conjunto de valores conexos a certos comportamentos sociais.

No fundo, este Movimento com aspiração a Partido político durável, visa dar a conhecer as suas atitudes políticas: valorizando a sua perspectiva cognitiva e experiência de vida, promover os seus afectos e propôr os seus valores - de certo modo já dispersos e integrados no ideário dos demais partidos políticos com representação parlamentar.

Depois sobrevem uma questão de extrema importância: a qualidade da liderança. E aqui, à luz do que se conhece, também não há nada de novo, que prometa novidade, que empolgue, que mostre ou revele que se trata dum Movimento/Partido que amanhã possa dizer, como Barack Obama: We can change...

Não havendo, à partida, uma liderança promissora, forte, hirta e firme, o que resta desta pequena aventura do ex-comissário para a Imigração!? Creio que muito pouco, além dum registo de intenções cognitivas, afectivas, simbólicas e valorativas. Todas, em boa parte, colhidas da experiência e notoriedade que granjeou enquanto comissário para a Imigração.
De certo modo, isto faz-me lembrar aquilo que, a dado passo, Manuel Alegre pensou fazer com o seu milhão de eleitores das últimas presidenciais que humilharam Mário Soares e depois, naturalmente, se eclipsaram. Mas na cabeça do poeta Alegre estariam alí numa gaveta do seu cérebro - ao dispôr - para formar um partidinho alegre. E a prova provada de que assim é decorre dos ameaços que faz de quando em vez faz para o interior do próprio PS.

Em função destas opiniões posso estar rotundamente enganado, mas esta iniciativa não deixa de ser um reflexo da contestação global, que é mais de tipo cultural do que política, não visando apenas uma equipa ou um regime político, mas a cultura inteira, enquanto civilização e, nessa medida, é um Movimento Social animado por um pendor metapolítico.

De resto, sinalizado pelo perfil socioprofissional de algumas das pessoas inteligentes que o integram, algumas delas com experiência social e profissional relevante, que tentam fazer algo de novo pelo sistema político, ainda que se saiba antecipadamente ser um fiasco. Mas enquanto se trava essa luta por esse ideal, esse conjunto de pessoas tende a crer naquilo que diz.
E como hoje há uma grande falta de confiança nas pessoas e na sociedade, este tipo de exercícios não deixa de representar um laboratório interessante para perceber como é que em política "as coisas" morrem mesmo antes de ter nascido.

É triste dizer isto, mas é assim...
PS: Confesso que esta reflexão teve para se designar: Um nado-morto da política à portuguesa. Não o fiz para não se confundir nem com a performance de Santana Lopes nem com a de Meneses que, creio, não integram o dito Movimento que agora trabalhará para se deixar "entalar" entre o PS e o PSD, só não dizendo com quem primeiro pretendem aliar-se, e de que forma e em que termos. Enfim, tudo condições a precisar neste mar de incerteza e de mundos e sub-mundos tão possíveis quanto inalcançáveis.