Relojoaria política: uma troika de paradoxos na política à portuguesa
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1. O paradoxo democrático - revela que o mecanismo da selecção do escol dirigente através dos velhos procedimentos democráticos, que alinham com os grandes números que comportam a multidão de eleitores que decidem quem é o poder num dado momento, constroem uma base de legitimidade necessária para o exercício duma vontade e de uma autoridade políticas que prossigam uma estratégica de modernização. A qual, para ser eficaz, teria de contrariar a maioria dos interesses actualmente estabelecidos, e que foram fixados num contexto histórico diferente do actual. E isto é tanto válido para os empresários e patronato como para os sindicalistas da CGTP (e doutros grupúsculos afectos ao pcp) que têm multiplicado arruaças contra o PM com o fito de o atacar pessoalmente pensando que assim travam algumas reformas em curso e mantém privilégios adquiridos. Tamanho erro... . E aqui até dá vontade de citar um "amigo" que diz que estes nossos sindicalistas lusos não podem andar a bater com a cabeça na parede. Neste contexto, talvez não fosse má ideia reler um interessante artigo-ensaio de António Vitorino publicado há dias no DN sob o título - As memórias do sr. Scargill. 2. O paradoxo tecnológico - diz-nos que quanto mais intenso for o desenvolvimento das chamadas tecnologias da mobilidade mais difícil se torna para os dispositivos de regulação existentes - que foram concebidos na base do controlo de dinâmicas que deixaram de ser territoriais e passaram a ser "atmosféricas" - que hoje já não se encontram referenciadas a fronteiras ou a países, para passarem a obedecer a múltiplas tonalidades de cores na paleta da competitividade e das capacidades de atracção de capitais e de de know-how. 3. O paradoxo da modernização - mostra-nos como a promessa de preservar os equilíbrios sociais do passado conduz a uma utilização defensiva e corporativa (daí a importância do sr. A. Scargill, sindicalista mineiro ao tempo de Margaret Tactcher) das profissões, dos estatutos e privilégios adquiridos, dos mercados de bens e daqueles que estão mais ou menos imunes aos efeitos da competição em contextos de mobilidade, i.é, de globalização competitiva. Mas (há sempre um "but") com a consequência de se provocar uma descontinuidade ou ruptura nas trajectórias de modernização das sociedades que as empreenderam ou que de algum modo as puseram em marcha. Ora, é desta constatação que decorre a perda de posições na hierarquia dos poderes no sistema de relações internas e internacionais - que hoje se projectam na esfera da globalidade e, por extensão, determina que condições e normas "fabricam" condições de atractividade de que dependem o sucesso das regiões, dos países e dos blocos regionais e dos grande espaços.
Por outro lado, cada um destes três paradoxos gera suficientes factores de instabilidade para questionar a garantia dos agentes políticos que prometem uma resolução simples para os problemas hoje colocados à governação. Daí a crise ser múltipla porque composta por múltiplos componentes, não é como uma fonte única que pudesse ser controlada ou manipulada por diques que encaminhariam assim o curso das águas, em função das necessidades e dos interesses. E é esta necessidade que tem levado a muitos enxertos e transplantações na política à portuguesa. Mas esta articulação na troika de paradoxos, ainda assim, não explica a nossa formulação inicial: a de que muitos de nós depois de ouvirmos alguns dos "artistas" que debitam sound bytes no Parlamento faríamos, seguramente, muito melhor. E é aqui que a malha analítica se estreita e o nível de explicação se sofistica. Vejamos: é sabido que o político não pode deixar enfraquecer a sua imagem, apagar-se ou até degradar-se - seja pelo que diz, seja pela forma como diz e gesticula, enfim, pelo modo como comunica. Ante isto, as pessoas, o povo português, têm reacções diferentes, contraditórias relativamente aos políticos que têm: gostam, mas ao mesmo tempo, criticam a ambição daqueles que os dirigem. Ou seja, o povo gosta de se rever nos políticos - porque são feitos à sua imagem e semelhança, mas apreciam também que eles - os políticos - sejam diferentes do povo. Por isso os tratam com deferência e alguns como se de divindidades se tratassem. Mas não deixam de ter inveja da sua influência, poder e autoridade. De modo que há aqui uma nítida relação esquizofrénica de amor/ódio entre povo vs políticos (governados e governantes) - porque aquele gosta daqueles que inveja e às vezes odeia, e não é só em pesadelos. É aqui que nasce uma questão relevante para a filosofia política: porquê, então, confiar o seu voto no destino daqueles em quem somos em tudo idênticos? "Mal por mal, estamos cá nós", dirá o Zé povinho de Bordalo Pinheiro... A escapatória para isto não é fácil, ou seja, a conquista do poder só é legítima se for portadora de um projecto de futuro, que seja novo, vigoroso e transmita esperança às populações. É isto que não se vê na Europa actual - por uma gritante falta de liderança de barroso e da generalidade dos actores politicos europeus. Nada alí é inesperado, tudo é previsível, velho, gasto. Parece até que todos se formaram na escola do maoismo.. Dentro de portas reconhecemos o impulso reformador do governo socialista mas há aí uma questão de "quadratura do círculo" que deveria ser melhor ponderada por forma a que não fosse a classe média a suportar aquilo que bem poderia ser suportado pelas chama classe A (++). Ante isto, que fazer - como diria Lenine? Perante as hesitações, e desconhecendo que caminho trilhar, recomenda-se sempre que se seja natural...
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