Considerações sobre sindicalismo nas sociedades contemporâneas
Por refª ao artigo de António Vitorino de ontem no DN e à importância do papel de Arthur Scargill no Sindicalismo britânico que desconhecíamos. Ver mais aqui.
Mas o risco de o mero confronto sindical em torno de reformas em concreto passar para um plano essencialmente de combate político, de que poderia resultar, como alguns receiam, o desmantelamento do movimento sindical, só se poderia produzir se os sindicatos consentissem na sua instrumentalização partidária, e assim cometessem o erro de optar pela via da radicalização inconsequente.
Por radicalização inconsequente refiro-me à assunção, como postura política, de uma posição intransigente de imobilismo, de rejeição pura e simples da necessidade de reformar o nosso Estado social e de defesa do status quo porque... sim! Um pouco ao estilo "há reforma?... sou contra!". Assim se coloca o dilema sindical hoje: negar a necessidade de reformas para defender situações adquiridas, ou pretender fazer valer os seus argumentos sobre o conteúdo das reformas, embora aceitando o princípio da sua necessidade [...].
Notas Macroscópicas
Adormecer a pensar em coisas que se desconhecia leva a que no day-after sintamos mais curiosidade por as aprofundar. E o nome Scargill é fascinante, interpela-nos, parece até um conceito exótico sem explicação à vista... Aparte a importância do nome - em quase todos os países ocidentais o Sindicalismo assume uma dupla origem: de solidariedade e de defesa dos insteresses dos trabalhadores, e de revolta contra o modo de produção capitalista e a sociedade burguesa de outro lado (para retomar a velhinha terminologia marxista, que hoje já fará pouco sentido). Naquele caso a função do sindicalismo deve ser compatível com a funcionalidade do sistema, i.é, com os objectivos de produtividade empresarial e de desenvolvimento económico contribuindo, por extensão, para uma sociedade (também) mais democrática. Na acepção mais radical o sindicalismo faz outra leitura do seu papel, que se julga mais autónomo e combativo e é aqui que começa a política e o combate pelo poder.
Ou seja, nuns casos o sindicalismo luta dentro das regras do jogo normativo estabelecido, noutros casos procura fabricar ele próprio as novas regras e ditar algumas condições à margem do que está estabelecido. Quer-nos parecer que é isso que últimamente Carvalho da Silva - que é (já) uma peça Luís XV do sindicalismo nacional - e os seus compagnons de route têm tentado levar a cabo nas narrativas do "museu" sindical nacional.
Creio que são este dois tipos de análise (a formal e a transgressora) - e que nos foi suscitada pelo artigo-ensaio (mais um) de António Vitorino - que aqui está em equação quando se procura racionalizar a natureza do relacionamento político entre governo e sindicatos. Mas temos de convir que tudo isto decorre de forma preexistente à formação e lógica dos sindicatos, visto que já existiam sociedades de ajuda mútua e de ligas de resistência em prol dos interesses dos trabalhadores; e também sempre existiram formas de sabotagem da acção dos governos (e da empresa) na sociedade. Embora ambas estas tendências nasçam da exclusão de uma classe (a classe média) - hoje, paradoxalmente, cada vez mais jovem e qualificada da sociedade portuguesa, e é isto que é preocupante e singular no quadro das trajectórias de evolução das sociedades europeias.
Ante isto pergunto-me se as opções são sempre as mesmas por parte do governo (qualquer que ele seja) face ao comportamento dos sindicatos:
1. Eliminá-los, ou seja, "partir-lhes a espinha";2. Dividi-los;3. Adoçá-los dando-lhes algumas cenouras para os calar;4. Comprá-los completamente.
E uma vez vencidos, o poder político em funções tudo fará para os desarticular completamente (aos vencidos) e não os deixar em paz porque sempre se poderão reorganizar para conseguir uma futura desforra, logo que as circunstâncias o permitam.
Cremos que aqui depende muito das circunstâncias e, óbviamente, da natureza das pessoas envolvidas nessas negociações, posto que por trás das instituições estão sempre pessoas de carne e osso que também têm sentimentos, emoções e formas de comportamento.
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