Escolhas [in
DN]
António Vitorino
Jurista
"Desde há cerca de ano e meio que se tem vindo a dizer que a superação do impasse em que se encontra o Tratado Constitucional da União Europeia depende, em larga medida, das eleições francesas e holandesas.
Ontem mesmo, nas eleições parlamentares holandesas, os resultados deram a vitória aos cristãos-democratas do primeiro-ministro Balkenende, bem como um reforço da posição dos partidos que, à esquerda ou à direita, se situam em posições mais eurocépticas.
Os resultados destas eleições não são uma surpresa, na medida em que quer o próprio partido do primeiro-ministro cessante quer o conjunto da sociedade holandesa têm registado um movimento de afastamento das suas posições tradicionais em matéria europeia.
A surpresa destas eleições terá sido, sobretudo, a queda do principal partido da oposição - os Trabalhistas -, bem como de um dos partidos da coligação - os Liberais -, que fez da sua visão restritiva das políticas de imigração e asilo um ponto central da sua plataforma eleitoral.
No rescaldo destas eleições, torna-se claro que não só o Tratado Constitucional mas, de uma maneira mais geral, as probabilidades de uma reforma dos Tratados actuais, a partir de uma nova base, saíram mais comprometidos do voto dos holandeses nesta quinta-feira.
Agora as atenções voltam-se para a eleição presidencial francesa, em Maio do ano que vem.
Nestas, avulta a decisão do Partido Socialista francês de escolher, pela expressiva maioria de 60% dos votantes, a candidatura de Ségolène Royal.
Do muito que se tem escrito sobre a agora candidata socialista ressaltam dois traços fortes: por um lado, sobre questões centrais da vida política, incluindo os temas europeus, o pensamento de Ségolène Royal permanece um mistério ou, no mínimo, uma nebulosa; mas, por outro lado, não se pode deixar de lhe reconhecer uma grande habilidade e um instinto profundo de bom senso, ao conduzir uma campanha vitoriosa contra a experimentada nomenclatura do Partido Socialista Francês.
A escolha de Ségolène tem um significado simbólico: pela primeira vez em França, uma mulher tem fortes probabilidades de assumir a Chefia do Estado.
Num país como a França, esta não é uma questão em si mesmo menor!
Mas, simultaneamente, o apoio dos socialistas a uma candidata que aparece como outsider em relação à nomenclatura do seu próprio partido corresponde a um fortíssimo sinal de renovação da classe política, que as sondagens identificam como sendo uma preocupação central do eleitorado francês nas próximas escolhas eleitorais.
O mais que provável adversário de Ségolène, o actual ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, compreendeu igualmente esta onda de fundo do eleitorado e, também ele, pretende definir-se e apresentar-se como factor de renovação do pessoal político da direita.
Neste intento, quer um quer outro dos candidatos beneficia da hostilidade manifestada pelos dois líderes históricos das respectivas áreas políticas, o ex-primeiro-ministro Leonel Jospin, à esquerda, e o actual Presidente da República, Jacques Chirac, à direita.
Mas a tarefa de Sarkozy parece mais difícil, na medida em que não só exerce funções no actual Governo como lidera o partido que apoia o Presidente Chirac, malgrado as conhecidas dissensões pessoais entre os dois homens políticos.
Os próximos meses serão muito interessantes para serem seguidos com atenção.
O actual ministro do Interior radicalizou o seu discurso, na sequência dos acontecimentos que ocorreram nos arredores das grandes cidades francesas no ano passado, assumindo uma agenda que reforçou a sua popularidade junto dos sectores mais à direita, mas agora terá de se dedicar sobretudo a seduzir o centro político.
E é aí que terá de se defrontar com uma candidata socialista caracterizada pelo realismo, por um discurso menos centrado na "grande política" e mais virado para a gestão das expectativas e dos sentimentos do quotidiano dos cidadãos franceses. Quem ganhar o centro político com uma mensagem, um perfil e um programa de renovação da classe política e de modernização moderada da França será o próximo ocupante do Palácio do Eliseu!
Esta escolha será decisiva, não apenas para a França mas também para a Europa no seu conjunto. Mas tal escolha também terá distintas implicações para Portugal. Tema a que voltaremos mais adiante."
Notas Macroscópicas
Publique-se e envie-se uns milhares de xerox para Bruxelas. Pois mesmo que Segoléne não ganhe o Eliseu sempre pode conquistar amanhã a Europa, tão desfasada que está; e o mesmo se diga do musculado e vigoroso Sarkozy... Quem sabe assim a Europa não dá a imagem que tem dado nestes últimos dois anos: de secundarização do seu tradicional estatuto geoestratégico perante o mundo. Para Valery, a Europa, como pequena península da Ásia, precisava de ser unida para conseguir gerar poder. Para Monnet, em acerto com outros norte-americanos durante a II Guerra Mundial, o futuro da Europa dependia da capacidade para neutralizar a sua conflitualidade interna, geradora de confrontos militares e políticos entre Estados europeus. Para Miterrand e Helmut Kohl, a possibilidade em estabilizar o eixo Paris-Bonn era uma condição essencial para que a Europa conseguisse resolver a questão colocada pelos britânicos, sempre na posição de intermediários entre os EUA e os europeus continentais, papel esse que fora assumido por barroso na Cimeira dos Azores (para ajudar G.W.Bush a legitimar a guerra ao Iraque cujos resultados hoje se conhecem...) - e que o catapultou para Bruxelas. Tudo isto eram respostas possíveis a essas circunstâncias, que mudam com o tempo, como as pessoas, e para cada uma delas havia um programa específico para combater esses problemas decorrentes do projecto europeu. Ora, e agora sobrevém a evidência do malogro, quem tivesse visto a entrevista que barroso deu à tv de Balsemão terá ficado pasmado, posto que barroso elencou os problemas da Europa como sendo as golden shares e a necessidade de estudar a eventual regulamentação do futebol, quiça uma sugestão dada por Mourinho nos balneários num daqueles convites feitos a durão para ver a bola. Hoje, mais do que nunca, parece que o inimigo da Europa está no seio seio, e é de lá que ilude os quase 500 milhões de almas que procuram identificar uma liderança, um projecto, uma visão para o futuro - mas a única que coisa que vêm é a grande ambição de Barroso - como se ela fosse uma ruga enquistada no mapa europeu. E como já sabemos, pela pena de Chateubriand - a ambição sem capacidade é crime...
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