quinta-feira

O efeito Beaubourg e a efeméride do caso Ingrid Betencourt

Confesso que ontem fiquei tão agradado quanto pensativo acerca da publicidade surpreendente dada à necessidade urgente da libertação de Ingrid Betencourt, sequestrada há anos pelas Farc na Colômbia. Com a Liberdade não se brinca, ela é um valor absoluto, inegociável. Tanto mais que alguns desses energúmenos estariam, alegadamente, presentes na tal Festa onde o marcelo também foi, quem sabe para demarcar algum terreno sociológico pensando já, à distância, nas futuras presidenciais. Até lá vai dançando a valsa da esquerda e da direita. Ele é assim, está-lhe nos genes e agora também já não muda. Se ele precisar de dizer que é esquerdalhudo e barbudo para garantir uma eleição - di-lo sem peias; e o mesmo vociferará à direita desde que a promessa salvaguarde o mesmo objectivo. Aqui tem é que usar patilhas, à P. Portas... e frequentar o solário. Marcelo já não surpreende, a sua coerência e ética política também não. Mas o efeito Beaubourg, essa máquina ou simplesmente esse complexo traduz uma carcaça de fluxos e signos, como nos diz o genial Jean Baudillard - mais vezes copiado do que citado, uma estrutura de relações sociais entregues a uma certa ventilação superficial que depois não tem nem consistência nem continuidade. Vem isto a propósito, como referimos, do caso Betencourt... Para que serviu, afinal, alguns blogs - já com considerável peso no ciber-espaço, terem agendado essa questão, importante, seguramente!! E hoje, que fizeram os mesmos bloggers pela causa? Julgo que esses trabalhos de denúncia são importantes, mas só se tornam determinantes se forem persistentes no tempo, doutro modo não passam de fugachos para encher o olho, granjear alguns links e ficar com a imagem de altruista da blogosfera. Eu próprio resisti a esse efeito panfletário duma certa direita bem-pensante, civilizada e hiper-linkista, aliás, endogâmicamente linkista, mormente por causa da Atalaia, e hoje abordei o tema embora integrado numa questão maior da Liberdade. Em todo o caso, não quero ser injusto para o conjunto de blogs e bloggers de qualidade que ao assunto se referiu. Tê-lo feito até foi mais eficaz do que ter passado ao lado. E agora? E amanhã? Que fazer? - é a velha questão de Lenine. Que fzer? E se alguma comunidade ciber-virtual colombiana - cá ou no exterior - ganhou expectativa sobre a blogosfera lusa e descobre depois que ela não valorizou mais o assunto, que pensar? Ora, é este efeito de implosão, de auto-desaparecimento, de beaubourg que me pareceu ontem ter produzido mais o vazio do que um sentido consequente para esse dramático caso. Assim como se deu visibilidade a um caso logo sobreveio uma ideologia do obscurecimento que o apagou e o fez esquecer na espuma dos dias, ante as velhas rotinas. A sensação com que fiquei depois de ter visto os ciber-espasmos sobre o caso Ingrid - só porque alguns blogs de referência abraçaram o caso, e aqui coloco naturalmente o Jumento - que para nós é uma fonte importante, é que hoje, volvido o efeito publicitário das 24h, a blogosfera se tornou anacrónica com a realidade, deixa de ser consequente, desacompanha o caso como se ele jamais tivesse existido, parecendo-me até - e as vedetas ditas de referência que me perdoem - (mas para mim as "vedetas" são os clássicos como Aristóteles, Platão, Maquiavel e outros de equivalente dimensão) - que o caso Ingrid só existiu para servir meia dúzia de blogs e não porque existe um drama existencial específico por detrás dele e que dura há anos. Em suma: a impressão geral com que se fica, justamente, é que o edifício teórico e o capital de preocupação que ontem se gerou na blogosfera lusa não passou de uma espécie de carta vazia, de um invólucro arquitectónico que no seu interior só tem ar - já saturado, logo irrespirável. E isto não é nenhuma indirecta para blogs grandes como o Jumento e outros, é mesmo uma directa, porque a partir do momento em que fizeram o que fizeram - hoje, amanhã e depois será legítimo ser-lhes cobrado igual capital de atenção no acompanhamento da questão pela comunidade que sobre o tema alimentou expectativas. Lembrem-se do caso Trent Lott aqui descrito... Creio, em rigor, que a blogosfera pode fazer mais e melhor do que apenas mandar uns fugachos para o ar e depois, serenamente, como um velho bêbado, ir apanhar as canas sob o feito da ressaca. Creio que a senhora (ainda) continua presa...
  • Post: dedicamos este post naturalmente a Jean Baudrillard - com quem aprendemos que nem sempre a simulação (fingindo-se ter o que na realidade não se tem) e a dissimulação (fazendo-se passar por pobre quando efectivamente se é rico) traduzem peças analíticas que funcionalizam o puzzle. Mas para que ele faça sentido convinha, doravante, que a blogosfera não regresse ao tema só no Natal de 2009 - revelando afinal, que o caso da Srª Ingrid Betencourt não foi senão um efeito dessa hiper-realidade que, na prática conduziu a tal blogosfera à implosão e à efeméride do quotidiano na espuma dos dias. Estaremos atentos aqui ao que se vai escrevendo no Jumento, que é o espaço que conhecemos melhor, para ver se amanhã não teremos de acentuar esta crítica que me parece justa e acenta num certo efeito de lusco-fusco com que certos factos aparecem e desaparecem do agenda-setting da blogosfera. Afinal, andamos todos para aqui a criticar as tv, rádios e jornais - enfim a mediasfera quando esta define uma dada agenda que não reflecte a realidade da maioria, e depois "a melhor" blogosfera comporta-se exactamente da mesma maneira atávica e rotineira - cheia de vícios, manhas e outras "maquiavelisses", elegendo nuns dias aquilo de que já nem se lembra no outro. Será que, só por isso, seremos esmagados pelo nosso próprio peso?!! Certa blogosfera, e falo daquela que tem 800, 1000 visitas/dia ainda tem muito que patinar e aprender até estabilizar um corpo de ideias, teorias e pensamento sobre o que quer seja. Quer se dedique a pensar a direita de M. Monteiro, ajudando-o na federação de um corpo de ideias sobre o tema, seja a equacionar os grandes problemas das relações internacionais na contemporaneidade. Quando olho para o horizonte e busco o zénith confesso que vejo muitas vedetas e poucas estrelas. E dentro destas só, de facto, algumas brilham.