Doutrina liberal e a memória do Prof. Pedro Arroja: Voltaire e Rousseau
Hoje verifico que o blog Blasfémias consultou o Macroscópio e picou uma expressão isolada do contexto - um "ET" - por relação a Pedro Arroja - para extrair uma asserção um pouco dúbia que até que me faz lembrar algumas passagens que só se corrigem mediante leitura do Eclesiastes. Em todo o caso agradecemos aqui a atenção dedicada ao nosso espaço, que fizeram pela 1ª vez - creio - mas por aqui tanto conferimos dignidade a um blog em emergência como a um blog com muitos links. E confesso que cada vez mais a qualidade de análise e reflexividade dos materiais sociais não integra nem uma nem outra carecterística. O importante é o common sense e o respeito mútuo, valores que nos permitem reforçar o conhecimento sem que as pessoas se traíam mesmo antes de se conhecerem, coisa mui típica em Portugal. Temos de corrigir este costume que em lugar de lançar pontes entre os homens apenas fragmenta as que ainda existem. Fica a sugestão ao referido blog para que aprenda a citar devidamente.
- Dito isto, terei opotunidade de me juntar aqueles que já teceram comentários e evocaram factos, ideias e opiniões daquele ilustrado pensador e economista do Norte. Confesso aqui que o estilo de Pedro Arroja me seduziu ab initio: o tom, é fluente, argumenta de modo racional, é culto e é educado. Razões q.b., para ouvirmos quem quer que seja. Mas mais, lembro-me que quando Pedro Arroja irrompeu (e depois desapareceu, daí a minha expressão "ET".. que aquele blog não percebera) ou, porventura, não soubera interpretar devidademente (no contexto donde picou a expressão) - o debate de ideias estava estagnado em Portugal. Aliás, vivíamos ainda num país meio rural em vias de se europeizar e modernizar. Hoje parece que ainda andamos à procura dessa modernização...
- Quando nesse contexto de atavismo intelectual e cultural irrompe Pedro Arroja foi uma golfada de ar que oxigenou o debate social, económico e filosófico em Portugal. O que foi tão positivo quanto raro. Nesse sentido, Pedro Arroja foi também uma promessa, uma esperança, um cristal do pensamento que pululava onde todos os outros estavam paralisados. Ele fazia (e fez) a diferença. Não há que ser sectário nesse reconhecimento, e aqui publicamente o faço - em sua homenagem. Porque é em vida que se deve homenagear as pessoas, e só quando morrem lhes devemos erguer estátuas para mostrar aos vindouros quem foram.
- Mas o que talvez sobreleva da sua matriz de pensamento foi (ou é) a sua necessidade de pensar sistémico, holístico, logo Arroja precocupa-se com os aspectos micro e macro da economia integrando, nesse cross-fertilization os desafios individuais com os chamados problemas colectivos que então se colocavam à estruturação dos agentes económicos e à própria economia que, na década de 80 ainda tinha cerca de 35% da sua força produtiva centrada na agricultura. O resto era sol e praia, serviços e funcionalismo público. O empresariado ainda era uma realidade fechada, com escassa expressão competitiva, inovadora e exportadora.
- Depois, a ideia que guardo dele é a das suas intervenções televisivas, sempre muito expressivas, pois trata-se dum homem intelectualmente vigoroso, de um homem extremamente educado, e isso ajuda e aproximar as pessoas, as sociedades, as economias e até, quiça a blogosfera, não obstante verificarmos a forma sui generis de certas citações.
- O Macroscópio sente-se completamente à vontade para falar com o mais microscópico dos blogs até aos maiores. Com boa fé aprende-se com todos, mas para isso é necessário deixar a soberba, a vaidade, a gula (e os outros pecados capitais) à porta da razão e do bom senso. Também isto é pensar liberal.
- Mas temos de ser concretos: este homem mexe em dinheiro, potencia fortunas, agiganta patrimónios alheios que vai gerindo conforme sabe e pode. Tem, portanto, de se tornar confiável à luz dos outros, por isso esperemos que ele não cite de forma canhestra - do aqui, aqui, aqui - espelhando até um modus operandi algo campónio e amnésico, o que contrasta com os princípios e com a filosofia da educação liberal de nunca omitir (ainda que cirúrgicamente a identidade de quem quer que seja em citações-macacas, também ao gosto desse fúnebre blog que é o Abrupto). Pedro Arroja jamais citaria o Macroscópio, o Blafémias, o Websemantic, o Jumento ou qualquer blog por: aqui, aqui, aqui... Isso é uma má prática, até porque no plano imagético esse "aqui" aponta sempre para o meio das pernas... Fica mal, até na blogosfera.
- Seria uma terraplanagem dos mais elementares valores liberais que reduzem a identidade a um mero "aqui". Isto contrasta com a diplomacia de PA - que me habituei a ver e a escutar com atenção.
- É essa a memória que guardo de Pedro Arroja: culto, educado, preparado, afável hiper-comunicador e com obra escrita. Um liberal dos 4 costados. Não me lembro se chegou alguma vez a propôr a privatização do O2... Sempre me admirei como ainda não trabalha com Belmiro de Azevedo...
- Mas o que acho curioso nestas pequenas discussões, que incham em função dos promotores, das agendas, das vaidades, enfim, da própria condição humana (que é fraca), que toca todos nós se não tivermos os devidos cuidados (lá está, devemos reler o Eclesiastes...) é a forma - igualmente "ET" - com que se introduzem e subtraem temas, debates, problemáticas e até pessoas na esfera pública e, agora, na blogosfera - que é a ágora pública dos novos tempos. Também aqui há uma irracionaliade intelectual em tudo semelhante à irracionalidade dos mercados, que falava Alan Greesnpan - o chairman da Reserva Federal dos EUA. Neste plano, faz inteiro sentido falar num efeito "ET" que assalta os espíritos lusitanos que só se pode justificar pela necessidade de certas pessoas/grupos de marcarem uma determinada agenda-setting na esfera pública. Então, não teria sido mais natural que já se tivesse falado de Pedro Arroja há anos!? Creio que sim. Aqui lavramos também o nosso mea culpa.
- Mas porque razão é que eu embarquei nisto? Muito curiosamente já andava a cogitar um fragmento sobre Pedro Arroja há algum tempo, até porque seria interessante pô-lo a pensar acerca do modelo de segurança social a seguir em Portugal, acerca da melhor forma de captar investimento externo, acerca da melhor forma de tornar Portugal atractivo e competitivo. Seria uma forma de actualizar o seu pensamento (liberal) sobre todas e cada uma desta matérias estruturantes para Portugal. Além da ajuda ultra-qualificada que teria podido dar a Miguel Cadilhe e, hoje, a Basílio Horta - antigo e actual responsável pela Agência Portuguesa de Investimento - que tem precisamente essa finalidade orgânica e funcional junto dos operadores e dos mercados internacionais. E como sabemos não tem sido fácil capturar novos investidores para fazer investimento sustentável em Portugal.
- Aliás, quando Patrick Monteiro de Barros viu chumbado (ou denunciado) o acordo de cavalheiros (e até preliminar) que tinha com o ministro da Economia (M. Pinho) no quadro do projecto de refinaria Vasco da Gama em Sines, teve até a amabilidade de enviar para o Macroscópio a formalização desse rompimento - ao mesmo tempo que o enviava para a imprensa. Desde aí que fiquei com a "pulga atrás da orelha" em revisitar a história e recuperar o legado teórico de Pedro Arroja.
- Portanto, as minhas motivações acerca da revisitação intelectual a Pedro Arroja não partiram dos caprichos para a teoria do pensamento social e económico, antes partiram da realidade sociopolítica e económica do meu país para o quadro teórico daquele liberal.
- Daí o nosso primordial interesse por este seminal autor que revolucionou o way of thinking português. E seria até muito curioso perceber até que ponto ele influenciou uma geração de jornalistas económicos (e políticos, como PPortas n ' O Independente) que acabaram depois por agitar todo aquele período que fez a transição da década de 80 para a década seguinte - que depois assistiu à revolução informática que redefiniu os métodos de trabalho na empresa e de produção e acumulação de conhecimento que precipitou a produção, o consumo e, sobretudo, a forma de estar e de ser na nossa relação com o "outro".
- Hoje não sei se valerá a pena aprofundar a questão do liberalismo... Saber se ele é democrático ou elitista... Já sabemos que que há uma vertente do liberalismo que embora sendo partidário dos direitos do homem, que este recebeu da natureza, era porém contrário a toda a democracia. Ou seja, era pela igualdade de direitos, mas não pela igualdade na participação na própria sede do poder. Essa função e estatuto estaria reservada para uma elite que na província tinha comportamentos mui sui generis e até caricatos que um dia aqui recordarei.
- Hoje creio que não há nenhuma utilidade levar a discussão para esse lado, i.é, para o lado que sustenta que quando a população se mete a raciocinar tudo está perdido, que nós somos todos igualmente homens, mas não membros iguais da sociedade. Hoje os desafios são bem outros, radicam na compatibilização das questões da Liberdade com as questões do acesso às chamadas liberdades parciais (social, económica, cultural) e também à Segurança - dadas as fortes limitações que hoje existem nesse domínio na sequência da emergência do terrorismo desterritorializado que se generalizou à polis global e fez do sistema da morte o principal método político para pensar e agir. Como consolidar o quadro de Liberdade e de Segurança com uma matriz de desenvolvimento sustentável e com coesão social no seio do projecto europeu? Eis o desafio que hoje se coloca às correntes de pensamento. O resto é paisagem e alguma vaidade.
Recuando um pouco na história da Liberdade, e lembrando algumas ideias de Voltaire - que acompanhou de perto a experiência inglesa (séc. XVIII) e num trabalho intitulado Cartas Inglesas, de 1734, fala na liberdade e no comércio que enriquecem o país. Mas quando tomou conhecimento do Discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens, de Jean Jacques Rosseau, escreveu-lhe o seguinte:
- Nunca se gastou tanto espírito para nos tornar estúpidos. Dá vontade de andar a quatro patas, quando se lê o vosso trabalho.
- Dedicamos este post às intervenções vigorosas e à obra de Pedro Arroja que na década passada fez a diferença e tirou este país de alcova da mesquinhez intelectual e do atavismo cultural em que vegetava. Hoje teria pago para o ver falar nesse tal Compromisso Portugal. O que diria ele hoje a esse deserto de "pensamento liberalóide" que se passeou pelo Convento do Beato... E como já temos saudades de o "ouver" ele que deixe de ser - "ET" psicadélico - e aparece por aí, de forma menos intermitente. E, já agora, e por extensão, também agradecemos aos espaços da blogosfera que citaram inovadoramente o Macroscópio, pois já sabia que "aqui" tínhamos alguma imaginação e originalidade, mas nunca supunhamos que ela fosse tanta.
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