Crónica dos Bons Malandros - de Mário Zambujal (remake)
- - É óbvio que o homem não é o Tarantino, nem sequer um grande escritor, mas tudo isto é discutível, especialmente após Zaramago se ter nobilizado ante um júri completamenmte embriagado depois de ter sido dopado. Mas adiante, porque esta Crónica é uma crónica séria, e não uma nota de roda-pé de teor necrológico.
- - Mas se a Crónica... não é uma obra-prima por que razão me lembrei dela e a confundo aqui com o BIll Gates. Porquê? Será por me terem encomendado uma crónica sem ter, ao menos, referenciado um tema ou título, assim, sem mais nem menos - às cegas!!? Será por um flash-back nostálgico? Não!!! Lembrei-me da Crónica dos Bons Malandros por causa do Mário Zambujal com quem cresci radiológicamente (é claro): um tipo calmo, sereno, com uma piada escondida nem sempre conseguida ou entendida, uma vez que as pessoas gostam de pensar pouco e achar muita graça às coisas rápidamente. É a lei do menor esforço mental. Hoje a acoisa agravou-se. Todos prefererem uma consola a um capítulo de Eça ou digerir lentamente poesia heteronímica de F. Pessoa - que foi chumbado quando concorreu para um arquivo bibliot. em Cascais - sob pretexto de que dominava mal o português. Pois, pois and "ai-em"-Bill-Gates!! Mas o filme do M. Zambujal é até algo desequilibrado, apesar da crítica se estender também ao seu autor. Não sei..
- - O que sei é que a Crónica... retrata um grupo de assaltantes que vive em Lisboa e que se prepara para dar um golpe alí na Av. de Berna - no Museu Gulbenkian. A marosca é organizada no Bairro Alto (BA). O filme tem umas cenas hilariantes, como não podia deixar de ser, com um dos "malandros" a fugir à polícia através duma boleia que apanhou no Elevador da Glória, dissolvendo-se depois pelas ruas do BA até se reagrupar com os restantes assaltantes, ou seja, os outros malandros que foriginaram a Crónica do MZ.
- - Se falo no filme naõ é tanto para regressar ao MZ, mas sobretudo para recuperar parte dessa Lisboa dos anos 80 - que conheci em puto, logo com uma percepção muito superficial. Embora o suficiente para perceber que as pessoas eram, afinal, todas umas lisboetas gingonas, malandrecas, predispostas a arriscar o suficiente para pisar o risco e terminar a noite nos calabouços da PJ por semanas, meses e até anos. Muitos, fora da tela, tiveram mesmo essa experiência.
- - Eram tempos em que alguns assaltantes desmontavam motores de carros em plena via pública. Um desses exemplos, à margem da Crónica, narra a história de um dos ladrões que em pleno "gamanço", e perante a aproximação de um polícia - lhe pede para segurar no fox de forma a puder desligar os apoios do motor e guardá-lo em segurança. Foram faits-divers destes que fizeram muitas das histórias que ouvi em puto e que, hoje, volvidas duas décadas, compreendo serem verdadeiras.
- - É essa Lisboa dos anos 80 - representada por Nicolau Breyner, J. Perry, Paulo de Carvalho e outros maduros desse tempo - que hoje já são avós - que me apraz registar nesta Crónica.... até por evocação ao seu autor, o MZ. Foi preciso ter coragem fazer, ao tempo, um filme português diferente do ussual. Uma comédia com uns diálogos inteiramente burlescos, que umas vezes nos fazem rir, outras nem tanto, mas interpelam-nos sempre.
- - E depois aquela tão maravilhosa quanto estranha cena pós-moderna de Mário Zambujal aparecer a meio do filme para fazer o ponto da situação!!! Ora isto, ao tempo, era surrealista em Portugal, uma maquinação do tempo altamente percursora do que veio depois e povoou toda a indústria cinematográfica europeia, norte-americana e mundial. O autor do argumento que originou a película a fazer o ponto de situação a meio do filme.... A-m-a-z-i-n-g!!! Era como se o Raul Durão - naqueles seus "Apontamentos de Reportagem" - fosse a cada um dos lares nacionais e pedisse às pessoas para emitit o programa a partir de cada um desse domicílios... Isso foi uma revolução de mentalidades para a época. Estávamos na década de 80 e hoje já passou 1/4 (e uma sala) de século.
- - Mas toda aquela narrativa ficcional que pôr a rolar o filme era fraca, desequilibrada, quase experimentalista, e as personagens femininas também não ajudavam ao sucesso desejado. O assalto à Gulbenkian demorou uma eternidade para um tempo ficcional de cinema. Os aspectos mais cómicos também resvalaram e de tudo resultou um filme mediano que, contudo, vale a pena rever. Mais do que não seja para estabelecer um paralelo no tempo e medir com a putativa qualidade do cinema que hoje se produz no burgo.
- - Mas este exemplo do Mário Zambujal poderia servir-nos de inspiração para um guião de um outro filme a que poderíamos dar o nome de "Crónica dos malandros da Microsoft à portuguesa". E aproveitar a vinda de Bill Gates a Portugal para o sequestrar e depois pedir um resgate 5 vezes superior ao montante do déficite das nossas contas públicas e, deese modo, destributar a grosseira fiscalidade que impende sobre os tugas que vivem com uma espada de damôcles sobre as suas cabeças.
- - Julgo que seria uma forma rápida de Sócrates resolver alguns problemas orçamentais e de finanças púbicas do País sem, contudo, perder o rumo das reformas anunciadas. Fica a ideia para o guião. Aguarda-se que apareça um realizador à altura. Mas desde já advertimos que o Manoel de Oliveira está dispensado da prova, porque a narrativa aqui não poderá durar meses, nem as pessoas aguentariam estar tanto tempo sentadas... frente à tela.
- - Mas Sócrates poderia ser o protagonista dessa película; Cavaco o homem que iria pedir o resgate à CNN depois de ter ventilado a notícia em 1ª mão à TVI e à radio Paris-Lisboa-Califórnia; Marques Mendes poderia ser o actor que representaria o chefe de seguranças privado que tinha por missão manter Bill Gates incomunicável com o exterior e impossível de ser resgatado sem 1º pagar o resgate pedido por Cavaco tão necessário a Portugal nesta fase, diria, de Vale-do-Ave em que nos encontramos. .
- - Gostaria muito que o MZ pensasse nesta possibilidade de molde a refazer uma Crónica dos malandros da Microsoft à portuguesa, porque se ela se concretiza Portugal sairia mesmo da crise à velocidade de um click dado pelo rato da Microsoft... Por ironia do sequestro - seria um resgate abençoado.
Máscara opera de Verdi...
PS: Julgo que isto é mais uma reflexão sobre o tempo que passa do que uma crónica, que está sempre muito agarrada ao acontecimento que narra, prisioneira do tempo fixo. Logo, tem menos profundidade narrativa, menos horizonte e, por consequência, também menos potencial explicativo e de interrelacionação com os factos que queremos situar no espaço e no tempo a fim de os compreendermos melhor. A crónica é um pedaço datado de realidade, é uma foto que carece de leitura, mas só a análise e a reflexão nos dão o filme dos acontecimentos que procuramos identificar ou reclassificar no espelho retrovisor da história. O qual está sempre a ser (re)escrita.. A literatura é isso mesmo: capacidade de reinvenção tendo por base uma realidade, que pode ser ficcionada. O filme é dinâmico; a crónica é um pouco como a lógica do tempo no Alentejo e em certas partes do Nordeste brasileiro: é parado, paradinho, quieto. Razões e motivos bastantes para preferirmos a análise e a reflexão à croniqueta - que julgo sempre fizémos. A crónica, por isso, é um género menor, e reporta-nos para o quotidiano sem olhar o horizonte nem o zénite. A crónica só tem no seu cadastro o presente e passado (que já não se podem alterar), não tem futuro. A crónica é, em suma, o instrumento dos manetas. I.é, daqueles que ainda escrevem à mão e usam canetas..
Aparentemente temos aqui um simples problema estético-geracional. Mas creio que na foto da esquerda poderíamos colher mais análise, reflexão de vida, saber e sabedoria no que na croniqueta do lado direito, pontilhado pela beleza ruiva da Julliane Moore. Imagine-se que é homem e está numa esplanada num dia de verão a beber um Martini dry e lhe aparecem estas duas criaturas de Deus, com qual gostaria de falar primeiro?! Preferia a reflexão de vida ou a crónica do dia.. Regra geral, a beleza não anda de par com o conhecimento e a sabedoria. Raramente se encontra uma mulher bela e simultaneamente talentosa que pense bem e fale ainda melhor; o mesmo se poderá dizer dos homens, é certo. É aí que caímos num impasse, o impasse gerado pela alienação da imagem de que se fica prisioneiro: uma não tem beleza mas tem experiência de vida e pode ensinar algo; a outra tem beleza mas quando abre a boca estraga o resto. Isto é, faz uma crónica. Por isso, sempre preferi a análise e a reflexão - que são alimento para a mente e vitaminas para o raciocínio. Será que o Mário Zambujal alguma vez pensou nisto quando escolheu aquelas actrizes para o elenco da Crónica dos Bons Malandros!!?
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