A "ditadura" de Jesus Cristo..
Ruisinho:
Meu Bom Tio Quim,
- Acabei agora de ler o teu blog e ocorreu-me que te podias apresentar, não só como doutor em ciência política mas também, de uma maneira mais simples e acessível, como mecânico, não daqueles que desmontam automóveis mas de relevantes personalidades do nosso panorama político - o que é, sem dúvida, um exercício que exige, para além da indispensável coragem, o conhecimento de códigos que não são acessíveis a qualquer um. Desmontar e descodificar uma personalidade política que se insinuou junto da opinião pública através de improvisos sedutores, (cujo campeão é o Santana Lopes) ou da leitura de textos cientificamente preparados e ditos da forma mais convincente (ver exemplo do George Bush) e sem que tal pareça um mero exercício de inveja e má língua, é um trabalho tão difícil quanto importante, porque esses homens decidem sobre os nossos futuros e a nós fica-nos reservado o direito de lhes dar ou não o nosso voto. Infelizmente, a maioria irá sempre por critérios de simpatia ou de antipatia já para não falar no critério dos interesses (recordo os votos conseguidos pelo P. Portas a pretexto das pensões para os ex-combatentes do ultramar).
- Alguém viu o mecânico?! Estava por aqui há momentos..
- Eu sei que há a outra tese que diz: as pessoas não interessam o que interessam são as ideias, os programas. Mas essa é a conversa - ou mais um chavão dos políticos porque tendo ela a força da lógica esconde uma outra verdade que reside no facto das ideias terem origem nas pessoas, são a emanação delas. As minhas ideias são aquilo que eu sou, mas eu posso não me querer dar a conhecer, perceber que isso não me interessa e então “sirvo” aos outros ideias que não são as minhas… Como se o fossem e está montada a "estrangeirinha". Deste ponto de vista seria bem mais importante conhecer a pessoa do que as ideias que só lá estão para atrapalhar (como diria Agostinho da Silva). Por isso é que o ideal em política seria uma "ditadura" de Jesus Cristo, o infinitamente bom, competente, íntegro e mais todos os outros adjectivos que queiramos acrescentar.. Tu achas que se ele se candidatasse eu estaria preocupado com as suas ideias ou o seu programa político? Por isso, é que ainda mais útil do que desmontá-los ou descodificá-los, que é sempre um trabalho à posteriori (vale mais tarde que nunca), melhor seria que nos fosse dado conhecê-los previamente: missão impossível nestas sociedades de milhões de pessoas, e eles sabem disso. Somos muitos é o que é, provavelmente demasiados. Não quero negar o direito à vida a quem esteja para nascer porque a mim também me foi dado esse privilégio, mas quem sabe se as pressões colocadas por esta humanidade, que não pára de se mutiplicar, não estará a determinar o nosso futuro colectivo..
- Aguardo para ver as medidas que na 4ª feira nos vão ser "servidas", mas de uma coisa podemos ter a certeza: todos vamos passar a viver pior. Naturalmente, vivemos demasiado bem para as nossas posses colectivas, a tal situação de mentira de que muitos entendidos falam, e, agora, vamos ter que empobrecer à força. Claro que esta situação tem responsáveis que, como sempre, vão passar por esta crise na maior.. Nestas situações lembro-me sempre dos queixumes do nosso grande António Sérgio - quando afirmava que este país nunca teve a oportunidade de ser governado pelos seus melhores filhos, com a agravante de que hoje, com tantos boys a comer à mesa do orçamento, e a fazerem figura de ricos com o dinheiro que não é deles, o resultado é o que está à vista. E não me falem em incompetência, mas sim em ausência de escrúpulos, em desonestidade e neste aspecto eles até têm competência de mais.
- Como sempre haveremos de sobreviver, cada vez mais próximos dos países pobrezinhos e com maiores desigualdades sociais mas não somos nós governados por portugueses aos quais damos os nossos votos? Então de quem nos queixamos afinal?.
- António Sérgio
- Fiquei com duas ou três certezas após a leitura desta tua reflexão: deixarei de ler o Público e o Expresso, pois já me começo a habituar a essa tua maneira de situar os problemas com a devida implicação sistémica. É um bom viveiro que germina depois aqui na minha cabeça. É um pouco como o grelo da batata - que antes de o ser é grelo.. Sabes que sempre fui barra a grelos e a agricultura... Enfim, bem sabes o "nabo" - para retomar o registo agrícola, que sempre fui na matéria. Mas o importante que retive na tua reflexão é algo que está latente em 3 sistemas - que, combinadamente, e a diferentes velocidades, estão a corroer o nosso sistema político representativo. A isso, depois mais desenvolvidamente, darei o nome dos Três D's: Democracia Representativa, Democracia Participativa e Democracia de Opinião (ou mediacracia). Calculo que já estavas a pensar nos 3D ´s de Abril: Democracia, Descolonização e Desenvolvimento.. Acho que é aqui que está o nó górdio do problema, o estrangulamento e as condições de degração de funcionamento dos dispositivos do sistema democrático português. Que hoje, tal qual o conhecemos, são perversos na avaliação dos problemas e das trajectórias de desenvolvimento, e distorcem a realidade com mais ilusão, ficção que faz da política não uma crise qualquer, mas uma CRISE DA POLÍTICA. E quando isto sucede, já não se repara com uma simples mudança de óleo do BMW série 7 (de quase 100 mil euros) do Constâncio (que depois nos pede para apertarmos cinto ..., ele até nos pede para nos molestarmos com a fivela do mesmo. Enfim, eles pede-nos que nos fivelemos à bruta para ele andar de BMW série 7. Não é justo!). Quando isto sucede, a sociedade, o País no seu tecido conjuntivo, perdem a visão de futuro, perdem a sua capacidade de alimentação. É como se a sociedade lusa ficasse congelada numa "esquina" da memória, numa qualquer dobra do tempo, como uma imagem cristalizada do passado a impedir, senão mesmo a bloquear, a formação de condições de que depende a tal desejada imagem de futuro que não (mais) seja uma cópia pretérita.
- Pois essa, como é consabido, deu no que deu, tem nome e nós, por certo, já não a queremos repetir. Refiro-me ao desatino governativo que foram estes três últimos PM: Gueterres, Durão e Santana. Bom, em rigor, foram só dois, pois teremos de ser justos com este último - que foi apenas um estagiário. Uma espécie de estagiário na Casa Branca - cujo impacto para a economia portuguesa (e para a imagem e credibilidade externa do país) talvez ainda tenha sido pior do que o problema de saias que Clinton teve (também) com uma estagiária.. Bom, mas isso não interessa. O que importa é que a chave para os problemas que lanças (que tolhem profundamente a economia e a sociedade nacionais) - estão mais na crise da Política no que própriamente numa crise política. Daquela falar-te-ei com detalhe em breve. Talvez ainda antes do debate mensal em que o teatro político do país se transfere para a casa da democracia - que é a Assembleia da República. E por falar em teatro, já viste a peça de teatro - Mandrágora , que é uma coisa de Nicolau Maquiavel, muita boa por sinal... Mas cuidado, porque a coisa é afrodisíaca... E como diria o Henry Kissinger, o poder é um dos maiores afrodisíacos..
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