Cartas a Sandra" em palco no centenário de Vergílio Ferreira
Nota prévia: É sabido que essa dezena de cartas de amor serviram de entrada ao romance maior, Para Sempre. Nele se sublimam dois valores permanentes (e contraditórios) na condição humana: a descrição sofrida dum amor inesgotável e a pulsão da morte, espécie de Eros e Thanatos, lembrado por Freud - revelando o impulso da vida e a fatalidade da morte.
Tratou-se dum amor tão intenso que, segundo o autor, nem a diversidade das palavras consegue emprestar uma dimensão psico-afectiva ou metafísica. Ou seja, as palavras deixam de ter potencial explicativo para enquadrar, descrever ou fixar o campo emocional que pautam as relações humanas, ou algumas delas. E foi essa capacidade de amar o outro, sem limites, que Vergílio Ferreira nos revelou, talvez com o medo da morte e,ao mesmo tempo, a tentativa de encontrar o trilho para a eternidade.
Para aqueles que apreciam a forma como o amor, qualquer que seja a sua dimensão, é descrito, VF acaba por nele mitigar alguma reflexão e pensamento crítico, já que cada relação de amor está sempre enquadrada a um tempo histórico, social e político que convém não omitir na narrativa de qualquer grande romance ou pré-romance.
Curioso é que toda esta metafísica do amor e do desamor suba agora ao teatro Gil Vicente, em Barcelos.
(...) O incrível miraculoso de eu dizer o teu rosto. O ardor de um meu dedo na tua pele. Na tua boca. O terrível dos meus dedos nos teus cabelos. O prazer horrível até à morte da minha entrada no teu corpo.
O espetáculo tem estreia esta sexta-feira, às 21h30, e atravessa a poesia, a música e o canto.
"Este livro é uma belíssima obra literária que foge ao lugar comum das cartas de amor. Há ali um trabalho literário muito profundo ainda que cheio de sentimentos, às vezes até extremos", diz Alberto Serra sobre "Cartas a Sandra", a derradeira obra do escritor e professor, nascido em Gouveia.
As cartas, que servem de base condutora a todo o espetáculo, foram publicadas pela primeira vez em 1982 e são dedicadas à mulher de Vergílio Ferreira, à época já falecida. Uma obra que, através de Paulo (alter-ego do autor) cruza os espaços íntimos, existenciais e fantasmagóricos, numa pulsão de morte permanente.
Além desta publicação, serão também evocados outros textos do autor, nomeadamente acerca do país, da literatura e das artes. Propositadamente para este espetáculo de homenagem a Vergílio Ferreira, ao coletivo Haja Ânimo juntam-se um pianista, um guitarrista e duas cantoras.
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