Regresso a Vergílio Ferreira: A hora da morte é um tempo de verdade.
Regresso ao maior escritor-pensador português da 2ª metade do séc. XX.
Diz-se que a hora da morte deve ser um tempo de verdade. Revê-se a vida toda num instante. É o instante do infinito com a eternidade no centro, Nítido Nulo (p.64); diz-se que à hora do fim, pensá-la [a vida]. Não bem pensá-la - fogachos, trapos da memória. Às vezes um demora-se.Ou brilha tanto que é como se se demorasse. Ou demora-se mesmo, porque a vida é bem difícil e tem de haver uma compensação. Ainda agora, olhando as ondas.., balanço da vida à morte, vou à aldeia (Rápida, a Sombra: 79).
- É impressionante como Vergílio Ferreira faz com que o tempo da narração acompanhe o percurso do sol, do apogeu ao poente, metaforizando a existência: o entardecer equivale ao envelhecimento do narrador. A aventura rememorativa associa-se assim a um itinerário mítico, é um entardecer angustiante entre a maturidade solar e a fulguração do poente, que coincide com o final da narração. O final de Para Sempre coincide assim com o poente, índice premonitório da morte que se avizinha, no fundo a verdade crespuscular de Paulo:
- Desço de novo à sala, olho ainda a tarde que se apaga. E é como se eu próprio me evolasse com essa tarde e de mim ficasse o que útil necessário me sustentasse o viver (Para Sempre: 305).
Conotada com o entardecer da velhice, a narração extingue-se com a noite, imagem de inúmeros fins.
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Etiquetas: morte, Tempo e verdade., Vergílio Ferreira
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