quarta-feira

Os submarinos de Paulo portas

No final dos anos 90 do século passado a Marinha garantia à tutela que os seus submarinos apenas poderiam operar até 2001, mas só foram substituídos em 2010, constaram os deputas esta manhã no Parlamento
No final dos anos 90 do século passado a Marinha garantia à tutela que os seus submarinos apenas poderiam operar até 2001, mas só foram substituídos em 2010, constaram os deputas esta manhã no Parlamento / Nuno Fox
"A responsabilidade de execução do despacho de setembro de 1995 [que lança o programa de substituição, assinado pelo seu antecessor, Figueiredo Lopes e pelo à época ministro da Indústria, Mira Amaral] foi do Estado-Maior da Armada", afirmou António Vitorino enquanto respondia ao deputado comunista, João Ramos.
Segundo o antigo governante socialista, a coordenação a nível do ministério estava a cargo da Direção-Geral de Armamento que contava com o apoio da Secretaria-Geral. Nos dois anos em que liderou a pasta da Defesa, Vitorino garantiu que "nunca contratou nem consultores jurídicos, nem financeiros". "O ministro da Defesa Nacional tratou da questão sempre dentro de casa", disse.
Como? Mantendo em cima da mesa duas hipóteses: comprar novos ou usados. Lembrou o antigo ministro que, à época, o Reino Unido pretendia "renovar a capacidade submarina", tal como Portugal, e tinha à venda parte da frota. "O Chefe de Estado-Maior pediu-me autorização para aprofundar a relação com as autoridades britânicas e eu autorizei " no sentido de verificar se as características dos equipamentos que o Reino Unido pretendia alienar [da classe upholder] cumpriam os requisitos da Marinha portuguesa, disse Vitorino aos deputados.
"Entendi que devia manter em paralelo a possibilidade de comprar submarinos novos ou usados para alavancar a margem negocial do Governo português. Não há muitos fabricantes deste tipo de equipamentos. Acho que decidi bem", referiu, apesar de ter reconhecido, minutos depois, que, "ao manter em paralelo novos e usados isso trazia uma complexidade acrescida".
O antigo ministro lembrou ainda que, à época, a Marinha tinha três submarinos, mas apenas dois estavam operacionais. "O terceiro era fonte de peças para os outros", disse, lembrando ainda que, segundo a Armada, esses equipamentos atingiriam a sua vida útil em 2001. Foi por isso que, tal como disse esta manhã aos deputados, António Vitorino decidiu manter as prioridades definidas na Lei de Programação Militar de 1993 na qual foi pela primeira vez inscrita "a substituição da capacidade submarina". Até aí falava-se em "modernização".
Vitorino acabaria por deixar o Governo sem lançar o respetivo concurso internacional, o que só viria a ser feito pelo seu sucessor, José Veiga Simão, falecido a 3 de maio deste ano, ainda na vigência do XIII Governo Constitucional liderado por António Guterres.
"Em 1998, o Governo de que eu já não fazia parte abriu um concurso atípico para submarinos novos ou usados, portanto as duas hipóteses mantiveram-se sempre em aberto. Não optei por uma ou por outra", reforçou. "O Reino Unido acabou por vender esses submarinos ao Canadá", disse ainda revelando uma memória prodigiosa, passados quase 20 anos.
O ex-ministro garantiu ainda aos deputados que não teve contacto com algum dos consórcios que vieram a concorrer e que nunca falou com nenhum fornecedor de submarinos. Assegurou ainda que todos os estudos feitos durante a sua permanência no Ministério da Defesa (759 dias) foram "usados como base do concurso lançado em 1998".
Esta tarde, a comissão parlamentar que investiga a compra dos helicópteros EH-101, dos aviões P-3 ORION, C-295 e F-16, de torpedos e submarinos, bem como das viaturas Pandur II, prossegue a audição aos antigos ministro da Defesa, ouvindo Júlio Castro Caldas. Amanhã é a vez de Rui Pena e Jaime Gama. A semana fecha com a audição a Paulo Portas.
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Obs: De facto, é sempre útil ouvir António Vitorino dissertar sobre questões de política geral e, em particular, sobre matérias em relações às quais teve tutela enquanto MDN. Há, pois, aqui um duplo interesse: a) um interesse histórico, que se prende com a ligação aos factos passados há 20 anos e que demonstram, à época, a necessidade de equipar a Marinha portuguesa; b) e também um interesse acerca do método [competitivo] de negociação, deixando em aberto as duas possibilidades: aquisição de submarinos novos ou comprá-los em 2ª mão. Método que servia para colocar pressão junto dos interlocutores de negociação e, ao mesmo tempo, racionalizar o processo de tomada de negociação - cuja evolução se prolongou por vários governos que se lhe seguiram.
Todavia, sempre que começa um período pré-eleitoral, como é o tempo que estamos vivendo (leia-se, campanha para as legislativas de 2015), o centro-direita ultra-liberal (do Estado-mínimo e máximo, depende dos dias da semana e do que houver para privatizar e/ou intervencionar/nacionalizar), porventura entalado na bossa-do-camelo dos seus deficientes resultados sociais e económicos, num Portugal a empobrecer e desertificado, faz ressurgir a questão da aquisição dos submarinos e tende, artificiosamente, a empurrar a decisão dos mesmos para um tempo longínquo em que os titulares d´então - embora tutelando o início desse processo de consultas - nenhuma responsabilidade tiveram na sua aquisição, a qual só veio a ocorrer muito posteriormente. 
Assim, e por razões de economia de tempo e de recursos da República, pergunto-me por que razão não se começou esta audição pelo fim, ou seja, pelos responsáveis directos na aquisição dos referidos submarinos, e nem sequer aqui nos pretendemos reportar aos milhares de fotocopias destruídas à pressa antes de o dr. Paulo Portas cessar funções como MDF, apenas nos reportamos à questão de saber por que razão Portas pagou mais 30 M€ pelos ditos submarinos, com a agravante de a qualidade dos equipamentos ter diminuído (??!).
Importa talvez recordar que Paulo portas, entre 2002 e 2005, foi co-responsável pela coligação governativa entre o PSD e o CDS-PP, vindo a exercer funções como Ministro de Estado e da Defesa Nacional (2002-2004) e Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar (2004-2005), nos respectivos XV e XVI Governos Constitucionais. 
A originalidade dos períodos pré-eleitorais é que hoje já não gozam de nenhuma originalidade, como ocorria no passado recente. Embora a notícia sirva o propósito para demonstrar que, apesar de tudo, há sempre alguém que se esquece de fechar a escotilla do submarino que hoje deixa entrever uma ligação tão óbvia quanto opaca entre o Largo do Caldas e a zona do Restelo onde, à época, o negócio de Estado se início e fechou. 
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