quinta-feira

"Salvem os Ricos". A responsabilidade política

Contemporâneos - Videoclip: "Salvem os Ricos"

Salvem os Ricos, por Manuela Ferreira Leite

Com tantos meios, burocracia, impostos, máquina legislativa - pergunta-se como falham os políticos em governar uma sociedade?!

A questão é legítima e decorre do reconhecimento da dificuldade hoje existente em articular publicamente a responsabilidade à dificuldade política de governar uma sociedade complexa, como a nossa. Ou seja, falham hoje os meios tradicionais de intervenção e os incentivos morais são manifestamente marginalizados. Ninguém hoje é capaz de controlar os problemas de regulação que se colocam à economia e à finança, à falta de transparência dos mercados e dos processos, daí as tensões sociais crescentes que vemos amíude pela Europa.

A velha responsabilidade política do Estado já não unifica as diferenças nem dissolve as tensões no corpo social, razão por que haverá que estabelecer imputações que responsabilizem os casos mais indeterminados. Precisamos hoje de algo que suceda à velha mão invisível de Adam Smith e que há muito está disfuncionada, mas também precisamos de algo que previna a astúcia da razão hegeliana da história - que também deixou de ser um indicador credível pela falta de sentido estratégico da (própria) história.

Hoje já não há exemplos ou referências de futuro. É tudo tão novo que o corpo político, com os mecanismos de que dispõe, se vê completamente surpreendido com a evolução da actual civilização que vamos criando, de tal modo que os efeitos não desejados por ela se nos apresentam como mais conflituosos do que vantajosos, com reflexos económicos e sociais gravíssimos.

Neste aspecto, creio que nem Teixeira dos Santos sabia em Maio aquilo que em Outubro as estatísticas vieram desocultar, e por maioria de razão as oposições - pela falta funcional de informação técnica e especializada - ainda vegetam numa maior incerteza e ignorância macroeconómica. A ser assim, não há culpados, não há responsáveis, são todos inimputáveis, são todos loucos, porque ninguém, em rigor, sabe o que anda a fazer.

Hoje, em Portugal, governo e oposição parecem estar quase ao mesmo nível de responsabilidade pelo desastre económico, financeiro e social a que chegámos, ou seja, só um terramoto parece poder ultrapassar e desculpar a responsabilidade diluída entre governo e oposições, mas o terramoto também não iria ajudar à questão do défice nem dos problemas a montante e a jusante que a grave crise do país coloca a todos, decisores e zé povinho.

Numa palavra, esta nossa complexidade civilizatória já não consente um governo centralizado, pelo que desta crise que afecta Portugal se deverá meditar em esquemas de auto-governo - com o nome de regionalização ou outra forma de reforma administrativa do país - capaz de aplacar esta ingovernabilidade do sistema político reinante entre nós.

Já vimos até à exaustão que têm falhado as velhas formas de intervenção centralizada de responsabilidade política do velho Leviatão. E se assim é, terá que se pensar em novas formas políticas para gerir a complexidade crescente trazida com os processos civilizatórios que, por vezes, de "civilização" nada têm!!!

Talvez a mensagem - "salvem os ricos" - seja, na actual conjuntura, a mais adequada, ao menos salva-se alguém, e assim talvez esse "alguém" queira ir para o poder a fim de dar o seu contributo ao restabelecimento da confiança nos mercados, atraindo investimento directo estrangeiro, potenciando o emprego e o bem-estar e aumentando a procura interna e potenciando o tecido produtivo e intensificando as exportações.

Com sorte, ainda serão os ricos, após a debacle, que irão salvar este Portugalório da recessão que temos pela frente.

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