terça-feira

Prós e contras das mudanças que Lisboa vai trazer à governação da União Europeia

Presidente fixo, Eva Gaspar, JN
Conselho Europeu (órgão máximo da UE que reúne os líderes dos 27) passa a ter um presidente a tempo inteiro (mandato de dois anos e meio, renovável uma vez), em vez das presidências semestrais rotativas. O belga Herman Van Rompuy foi o escolhido para estrear o cargo.
A FAVOR: Maior continuidade na representação externa da UE. Menos despesas e trabalho para os Governos.
CONTRA: Encaixar esta nova figura sem correr o risco de sobreposição (e logo de contradição), com as funções do presidente da Comissão, do “MNE” europeu e do primeiro-ministro do país que semestralmente estará à frente da condução da agenda da UE não será fácil. Continua a ser pouco claro quem e como representará a UE, por exemplo, no G20.
Comissão Europeia
Ao contrário do que estava previsto na primeira versão do Tratado de Lisboa, que estabelecia um número de comissários inferior ao de Estados-membros, o texto revisto para tentar agradar aos irlandeses – e que agradou à generalidade dos pequenos e médios Estados – mantém o princípio de um comissário por país. A instituição, presidida por Durão Barroso, mantém a competência exclusiva de propor legislação comunitária. O seu presidente passa a ser eleito pelo Parlamento Europeu.
A FAVOR: A CE preserva a legitimidade que seria comprometida a partir do momento em que o número de comissários fosse igual a dois terços dos países membros, como estava previsto.
CONTRA: Menor eficácia. Pelouros “artificiais” para repartir por um número crescente de comissários.
“MNE” Europeu
Passa a existir uma espécie de “ministro” dos Negócios Estrangeiros, que concentra as funções do actual Alto Representante para a Política Externa e de Segurança (até ontem, Javier Solana) e do comissário europeu das Relações Externas (ainda Benita Ferrero-Waldner). A britânica Catherine Ashton foi a escolhida: será a representante directa dos Governos na frente externa, mas também vice-presidente da Comissão Europeia.
A FAVOR: Maior coerência e ganho de “escala” na acção externa da UE, que será secundada por uma rede diplomática europeia.
CONTRA: Dificuldade de articulação e eventual sobreposição de funções com o Presidente europeu, Van Rompuy, e com o próprio presidente da Comissão, Durão Barroso.
Dupla Maioria
A partir de 2014, as decisões passam a ser tomadas por dupla maioria: pelo menos 55% dos Estados que representem pelo menos 65% da população da UE. Em caso de interesse vital, um país pode usar o veto (“Compromisso do Luxemburgo”), para travar uma decisão. Se um grupo de países incapazes de formar uma minoria de bloqueio tiver dificuldades, pode também suspender a decisão (“Compromisso de Ioannina”).
A FAVOR: Sistema mais transparente e simples que o do Tratado de Nice, seu antecessor.
CONTRA: Reforça a capacidade de bloqueio da Alemanha, maior país da UE. Os “quase grandes”, caso da Polónia, mas também os médios, como Portugal, são os que mais perdem. No novo método, o voto português passa a “pesar” 2,14%, em vez dos anteriores 3,48%.
Menos Veto
Em cerca de 40 matérias, os Estados deixam de poder exercer o veto, boa parte das quais relacionadas com justiça e assuntos internos, que estão agora inseridas no pilar governamental. A regra da votação por maioria passa também a vigorar na coordenação económica e na constatação de défices excessivos, por exemplo, que até agora exigiam uma maioria reforçada de dois terços.
A FAVOR: Processo de tomada de decisões mais ágil e democrático, na medida em que o Parlamento Europeu passa a ter uma palavra a dizer, a par dos Governos, num maior número de assuntos.
CONTRA: Passagem para a maioria traduz transferência de soberania. Há ainda diversas excepções para acomodar as exigências britânicas que levantam diversas incertezas jurídicas.
Parlamentos
O novo Tratado permite aos parlamentos nacionais um maior envolvimento na elaboração de leis comunitárias. E, simultaneamente, reforça os dispositivos de controlo dos parlamentos para impedir que Bruxelas legisle nos seus domínios de competência, introduzindo ainda uma cláusula que permite a “devolução” para a soberania nacional de áreas de competência partilhada onde a UE, por omissão ou decisão, não tenha legislado.
A FAVOR: Reforça-se o princípio da subsidariedade, segundo o qual as decisões devem ser tomadas ao nível mais próximo possível dos cidadãos.
CONTRA: A capacidade de influência dos Estados-membros passa a estar mais dependente da composição (conjuntural) política e do grau mobilização dos respectivos parlamentos.
Carta Europeia
Inspirada na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, a Carta não integra o novo Tratado, mas é juridicamente vinculativa. Ao longo de seis capítulos (dignidade, liberdades, igualdade, solidariedade, cidadania e justiça) enumera os direitos que as instituições da UE têm de respeitar, estando os países sujeitos à mesma obrigação quando aplicam o direito comunitário.
A FAVOR: A UE passa a dispor de um texto consolidado para orientar a sua acção.
CONTRA: Os “direitos europeus” não são aplicáveis directamente aos Estados-membros. Ainda assim o Reino Unido não aderiu (e muitos outros garantiram salvaguardas) para evitar que os britânicos possam, por exemplo, reclamar através da Carta direitos que não são reconhecidos pela legislação britânica, como o da greve.