segunda-feira

Um modelo de justiça nas Relações Internacionais

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Um modelo de justiça nas Relações Internacionais. O mundo globalizado gera duas tendências contraditórias: o mercado global abre perspectivas de uma riqueza sem precedentes; mas também gera vulnerabilidades patentes no gap entre ricos e pobres dentro de cada sociedade. A poderosa vitrine que é a Net amplifica tudo isso à velocidade da luz. Nesta bifurcação, os Estados e as empresas mais desenvolvidos integram-se na economia global; os restantes são excluídos, apanhando os salários e os padrões de vida mais baixos. Temos, pois, um mundo dual: elites cosmopolitas a acumular vantagens; e “multidões” de pobres dobrando esquinas nas periferias das urbes europeias.
Por isso, o ataque à globalização sofre dum crescente radicalismo económico, maxime em países onde a elite governante é pequena e as desigualdades aumentam. O perigo reside na formação duma classe média-baixa permanente em todo o mundo, tornando difícil o consenso político para as reformas necessárias ao desenvolvimento. O desafio está em mitigar crescimento económico com visão política para encontrar alternativas à lógica do “colete negro” neoliberal. Prevenindo a paralisia dos 3 motores da economia mundial (EUA/Europa/Ásia) que hoje ameaça destruir as instituições democráticas mercê de pressões políticas globais.
A finalidade é induzir justiça no sistema de relações internacionais/SRI. Mas isso não se consegue só com o Estado, para muitos a fonte do mal. Se o Estado substituísse a política, a paz e a justiça - tudo seria mais fácil na dinâmica dos povos. Porventura, o mais difícil é reformar os Estados que vivem só dos seus recursos naturais, desamarrá-los desse dinheiro fácil que faz, por exe., dos petro-Estados autocracias.
Em 1944 Polanyi (que Soros copia sem citar) previu a queda das 4 instituições do Ocidente: 1) o balance of power; 2) o padrão-ouro; 3) a auto-regulação do mercado; 4) e o Estado liberal. Duas instituições são económicas, a outras duas são políticas.
Eis a utopia que ruiu no séc. XX. Será que hoje o Estado liberal pode regular os mercados? Neutralizar o terrorismo por recurso ao balance of power? Não. O mundo mudou. Hoje os mercados (desregulados) agridem as sociedades, telecomandam os Estados. Daí a dialéctica do duplo movimento de Polanyi: 1) libertação das forças de mercado do controlo estatal; 2) e o refluxo a esse controlo pelo Estado, para aliviar os efeitos corrosivos do mercado nas sociedades.
Se aplicarmos a lição de Polanyi ao mundo actual, constatamos que as forças (anónimas) do mercado alimentam actividades especulativas e ilícitas associadas ao crime organizado, financiamento do terrorismo, branqueamento de capitais bloqueando as reformas no sistema e inibindo a justiça nas RI.
E se repetirmos o exercício com o modelo do Banco Mundial/BM aplicado ao Chade (rico em petróleo), na África Central? Só que aí as multinacionais condicionaram o seu investimento local à erradicação da (crónica) instabilidade política. O BM aceitou “abençoar” um projecto, emprestando dinheiro ao governo para se associar ao consórcio internacional (Exxon-Mobil) para extrair petróleo. Mas colocou a seguinte condição: o Parlamento chadiano teria de aprovar uma lei garantindo que 80% das receitas do ouro negro seriam investidas em saúde, educação e infra-estruturas rurais; 5% para beneficiar populações vizinhas; 10% ficariam cativos num fundo para prover às futuras gerações; e os 5% remanescentes seriam gastos como o governo aprouvesse.
Para que o modelo funcionasse o BM exigiu que todas as receitas fossem depositadas numa conta off shore gerida por uma comissão independente de chadianos ilustres. A simbiose da economia com a política pode rentabilizar o modelo, que poderá ser reproduzido em qualquer ponto do mundo e servir de alternativa à aprovação dos (orçamentos) europeus que desrespeitam o PEC. Poderá a “má” Europa aprender com a “boa” África?