Comissão de Liberdade Religiosa - por Joquim Paula de Matos, in Memórias Futuras
COMISSÃO DE LIBERDADE RELIGIOSA, in Memórias Futuras
Mário Soares é um republicano, laico e não crente e na qualidade de Presidente da CLR (Comissão de Liberdade Religiosa), afirmou, durante um colóquio sobre as Religiões que ontem teve lugar em Lisboa, que vai propor ao governo a criação da disciplina de História Comparada das Religiões.
Mário Soares é um democrata, um lutador pela liberdade dos homens e dos povos e como, para além disso, é um homem inteligente sabe que não é pela força das proibições que se orientam as maneiras de pensar especialmente em matérias tão delicadas como as convicções religiosas.
Mas Mário Soares é também um político e sabe que num período de progressiva perda de fé e de vocações como resultado das transformações ocorridas nas últimas décadas nas tradicionais estruturas familiares, políticas e sociais, se alguma coisa a Igreja gosta de ouvir são propostas que façam recentrar nas religiões a atenção da sociedade e dos jovens.
E daí, Mário Soares, ao fazer tal proposta foi ao encontro, por razões diferentes, da vontade do Sr. Cardeal Patriarca de Lisboa e do seu colega de partido António Reis que para além de historiador e Prof. Universitário, é igualmente, grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, a mais antiga Loja Maçónica portuguesa que esteve ligada à revolução liberal de 1820, à abolição da pena de morte em 1867 e à implantação da República, afirmando-se sempre como uma defensora da liberdade de consciência e do Não ao dogmatismo.
Neste colóquio António Reis continuou a defender que o Estado deve ser laico ou seja, neutro e incompetente em matéria religiosa, não crente nem descrente, acrente.
Se as jovens quiserem usar o véu islâmico nas escolas, diz António Reis, não devem ser proibidas de o fazer no que estamos totalmente de acordo porque as pessoas devem ser livres de usar símbolos religiosos ou não religiosos e proibir é tão condenável como obrigar.
Tenho para mim que uma boa formação académica aliada à ausência de crenças religiosas é libertadora das potencialidades da nossa inteligência mas, como na generalidade dos casos, uns mais que outros, todos nascemos dentro de uma religião, sair dela é um caminho que cada um de nós terá que percorrer com autêntica liberdade de consciência e se quiser empreender esse caminho.
Com toda a sinceridade, eu não sei se em vez de se ensinar a História Comparada das Religiões não seria mais útil uma outra disciplina denominada “Dos Malefícios da Religião” mostrando à evidência, através de um relato histórico rigoroso o que foram e continuam a ser, na história da humanidade, os sofrimentos provocados não só pelas religiões, como por toda a espécie de crenças e embustes que, em geral, lhe estão associadas.
Mas também, com toda a sinceridade reconheço, que tendo o homem nascido para acreditar, como nos foi explicado por Richard Dawkiins, a convivência com as religiões é inevitável e os poderes e interesses instalados à sua volta ao longo de muitas centenas e mesmo milhares de anos, fazem delas parceiros que devem ser respeitados preferencialmente a combatidos o que só contribuiria para exacerbar as crenças.
Há, realmente, na sociedade de hoje, progressos ao nível do respeito pelos direitos e dignidade dos homens que é aquilo que mais interessa para o futuro de todos nós mas não foram as religiões que estiveram nessas conquistas, pelo contrário, travaram os avanços da ciência e dificultaram as conquistas sociais.
A natural curiosidade dos humanos encontra hoje satisfação nos avanços de Ciências como a Biologia, Genética, Antropologia, Física e Astronomia, e explicada que está a evolução da vida e do homem no planeta Terra e começado que foi a desvendarem-se os mistérios do Universo, a religião é remetida para a satisfação da necessidade de acreditar que em tempos remotos foi muito importante para a sobrevivência da nossa espécie.
Por isso, temos que conviver todos pacificamente, religiosos e não religiosos e o melhor que há a fazer nesse sentido é respeitarmo-nos naquilo que é a maneira de sentir de cada um, mesmo que os outros achem que é um pouco estranho que eu não me ajoelhe aos pés de nenhum Deus e eu esteja convencido da completa inutilidade desse gesto.
A nossa sociedade conseguiu inestimáveis avanços, ela própria arrastou para esses avanços a sociedade religiosa que tem hoje pontos de vista que lhe foram impostos do exterior e que ela teve de seguir para não perder o comboio do progresso e a credibilidade junto dos seus próprios seguidores.
Realisticamente, a convivência e o diálogo são o que melhor serve a todos porque os grandes inimigos encontram-se nos radicais e extremistas de qualquer religião que ameaçam tanto os não crentes como os crentes que não lhes obedeçam cegamente.
Esses são a verdadeira ameaça porque põem em causa a paz e a segurança das pessoas em qualquer parte do mundo embora haja muito que possa e deva ser feito no campo do recrutamento dos potenciais candidatos a radicais ou extremistas religiosos.
Quanto ao resto, independentemente das vantagens da existência de uma disciplina da História Comparada das Religiões, há que pugnar por uma formação académica de qualidade científica que ensine os jovens a raciocinar e a desenvolver as suas capacidades críticas.
Em consciência e em liberdade cada um seguirá depois o seu caminho e decidirá se pretende continuar crente ou se aposta em exclusivo numa vida livre de preconceitos e condicionantes religiosos dedicada apenas à comunidade dos humanos da qual faz parte e para a qual nasceu.
posted by Joaquim Paula de Matos at 3:02 PM links
Obs: Um artigo interessante de Joaquim Paula de Matos, laica e agnosticamente interessante. Envie-se uma xerox a Deus e outra ao seu filho Jesus Cristo, embora nesta coisas os correios sejam sempre confrontados com o velho problema da identificação da morada. Por isso, o mais certo é a correspondência extraviar-se...
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