segunda-feira

Um nó górdio chamado Lisboa: e agora António Costa?! Um milagre chamado Carmona

Isto é arte, mas juro que não foi um quadro importado do museu do Joe Berardo no CCB. Encerra outra realidade: um nó górdio chamado Lisboa.
E agora António Costa?!

António Costa é o novo presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), eleito com 29,54 por cento dos votos sufragados no passado domingo, 15 de Julho. Numa eleição histórica, o PS ganhou em todas as freguesias e conquistou, sem coligações, a maior autarquia do país. Os lisboetas deram uma maioria clara aos socialistas e mostraram o cartão vermelho à direita
Quando se olha para uma árvore com as lentes de um sábio este vê algo diverso do que o tolo vê. Diante da mesma árvore alguns captam o sagrado que nela existe, outros apenas conseguem ver troncos, ramos e folhas. Com a poesia passa-se experiência semelhante: onde por vezes o poeta Manuel Alegre vê poesia em Helena Roseta, outros mais sagazes vêem pequenos obstáculos resultantes de ressentimentos e vaidade política. Certos poetas quando olham para uma pedra nada mais vêm senão a pedra, outros conseguem transformar a pedra num poema. Carlos Drummond faz isto na perfeição, porque é um poeta genial.
Vem isto à colação pelo seguinte: Lisboa, com a actual composição de poder - altamente fragmentada pode levar a erratismos tão perniciosos quanto perigosos e paralisantes para a vida da cidade, converteu-se num nó-górdio, e será António Costa que irá despender uns bons 30% da sua energia e talento políticos a pensar em medidas, esquemas e estratégias para negociar com A, B, C, D and so on - a fim de fazer aprovar as suas medidas políticas constantes do seu programa eleitoral.
Tanto mais que a Assembleia Municipal - goza duma maioria que, curiosamente, ficou hoje em 3º lugar no score eleitoral em Lisboa mas, na prática, tem um desproporcional poder de veto prefigurando-se, assim, como uma espécie de desmancha-prazeres da Lapa com delegação aberta nos Paços do Concelhos, alí bem nas barbas de António Costa. Isto agrada a MMendes, naturalmente, que não sabe fazer política doutra maneira, mas a coisa decorre dum anacronismo da lei eleitoral que deve imediatamente ser revista a fim de impedir que, de futuro, nós górdios desta natureza se multipliquem no teatro democrático em Portugal. Só atrasa do tempo das decisões e adia o futuro das pessoas e das cidades, logo é sinónimo de subdesenvolvimento político, e Portugal não é (ainda) África.
Aliás, se analisarmos bem da legitimidade de tão contraditória composição da AM fácilmente constataremos que ela não representa ninguém, ou melhor, representa os interesses políticos de MMendes e de Paula teixeira da Cunha e os cálculos de alguma Distrital do PsD (deste e do antigo, do Antonho Preto) - responsável pelo ambiente de cunhismo político e de virulência manietadora que serviu para emparedar Carmona e levá-lo à demissão (primeiro técnica, depois política). Os seus vereadores encarregaram-se disso mesmo - teleguiados pela S. Caetano.
Por isso, Mendes e Paula Teixeira da Cunha se bateram pela sua manutenção, não obstante o "aborto" político que esse quisto hoje reflecte na actual correlação de forças do Executivo liderado por António Costa. Desta feita, criou-se uma situação delicada, um equilíbrio instável, já que o PS sózinho nada consegue, Roseta conseguiu partir o eleitorado e subtrair essa base de apoio hoje necessária à maioria absoluta de A.Costa; negociar com Carmona parece ser a menos má das ideias, mas há um óbice chamado aeroporto, pois sabe-se que Costa defende a Ota (ou outra localização) e Carmona reclama a sua manutenção na Portela, em cujos terrenos, segundo a mente "brilhante" e criativa de Mendes o arq. M.Salgado queria construir um triplex com vista para Tróia, e nas noites de melhor luar avistar a Marina de Vilamoura e o mastro do Yate de Patrick Monteiro de Barros.
Negociar com o PCP de Jerónimo/Ruben será o prato de cada dia, uma espécie de sopa política dos pobres aos Anjos, em que A.Costa dialogará com Ruben, este recolhe à Soeiro Pereira Gomes e pede o avale do Jerónimo que lho dá ou não. Tudo isto poderá ser uma fantochada pegada, e ou A.Costa terá mão naquela gente - errática - ou o Executivo virará uma anarquia, um caos empurrado por nortadas diárias - com o Zé Sá a aparecer nas reuniões de Câmara disfarçado de James Bond e a inventar papéis e guiões para patos-bravos que ainda não chegaram a tentar seduzir ou corromper alguém.
Ou ainda negociar com a Helena à porta fechada - com esta esvaida em lágrimas pedindo desculpa ao António por ter traído o PS e agora reconhecer que o seu projecto é, no essencial, melhor representado pelo PS de A. Costa. Tudo isto se pode colocar, com mais ou menos dramatismos, com mais ou menos virulência e resistência, mas uma coisa é certa: governar nestas circunstâncias é duplamente desgastante, porque se tem de ter um olho no burro e outro no cigano, passe a expressão.
Governar com Negrão também pode ser possível, aliás, tudo é possível naquela CML, mas menos provável, dada a natureza da AM, e A.Costa não permitirá que o seu Executivo governe em regime de parceria PS/PSD, até porque depois Negrão tenderia a aparecer nos media dizendo que foi autor da medida A, B, C e D. Enfim, uma salganhada como no tempo do PREC em que uns se apresentavam de gravata, outros de peito aberto.
Entretanto, os tempos mudaram, e hoje já ninguém liga à gravata, mas A.Costa terá de acompanhar de perto Carmona, até para o ajudar a não cometer erros, almoçar com Ruben, de preferência em restaurantes proletários (pode pedir conselho a Louçã para a ementa..) para o ambiente negocial entrar no registo político adequado, e supervisonar Roseta de molde a que ela não faça aos espaços verdes, ambiente e urbanismo o mesmo que faz às bicicleteas e às malas, trocando-as esquecendo-se - no próprio dia das eleições - do cartão de eleitor!!! Só ela para fazer este número, Marcelo dava mergulhos no Tejo - foi a escola de Cascais, certamente e as influências do mar do Guincho.
Ou seja, António Costa terá de governar a CML ao estilo Panopticon - deverá estar na Torre de Controle e ver sem ser visto e, ao mesmo tempo, compreender a dinâmica dos contrários que entre aquelas forças políticas se desenvolverá: Roseta procurará anular as medidas do PS; Carmona - procurará "matar" o "pai político" (MMendes) que o humilhou e cilindrar as medidas de Negrão; este, por seu turno, procurar resistir e, ao mesmo tempo, atacar A.Costa e ganhar protagonismo para em 2009 se relançar e conquistar Lisboa. Ruben dá-se com com todos, todos criticando, mas sendo o primeiro a entrar no gabinenete para negociar com o PS.
Ora, sempre aqui dissémos que a ironia do destino é o que por vezes comanda a história, e aqui seria muito interessante acompanhar de perto o cenário que parece mais plausível - embora a geometria da negociação seja flexível, aberta e variável - o que pressupõe uma entente cordial PS-Carmona - em que este nas medidas que não apoiasse pelo menos se absteria, o que nos coloca uma outra interrogação, simultaneamente intelectual e política:
Será Carmona um técnico que A. Costa transformará em político (coisa que nem Mendes nem Santana conseguiram)? ou um emissário de Deus na terra, porque com a sorte que ele teve - dizendo sempre que sim a tudo - só um milagre político (porventura, a senhora dona abstenção) podem justificar estes resultados eleitorais que fazem de Carmona uma fénix renascida na política local portuguesa.
Nem quero imaginar Carmona em Fátima a acender velas, ainda diriam que era João Paulo II (que Deus o tenha em descanso..) a construir um mausoléu em homenagem à desgraça de MMendes por o ter tratado tão mal quando o jogou borda fora nesta miserável política à portuguesa.
Carmona é hoje e encarnação desse milagre. Veremos se trás luz à cidade e pôe o cegos a ver e os coxos a andar mais direitos, porque Lisboa bem precisa.
Embora seja sempre António Costa que tem a chave dos milagres. Por Lisboa...