sexta-feira

O Jumento no Parlamento: a criatogénese desse espaço de reflexão. Razões do sucesso

...Os textos e as imagens do Jumento andam por todo o lado, até na dispensa do BES de Ricardo Salgado Espírito Santo ou na casa forte do Millenium. Ou na praia da Nazaré, wherever.. Há cerca de dois anos fui talvez o primeiro a perceber a importância crescente do Jumento em matéria de serviço público em Portugal, e aqui o escrevi. Isso aconteceu quando percebi que ele fazia num dia aquilo que o Vasco Pulido Valente, o Pacheco Pereira e o Miguel Sousa Tavares - e mais uma direcção de jornal inteira - faziam os três juntos em 15 dias.

Depois, comecei a levar mais a sério o seu trabalho e a acompanhá-lo diáriamente, até para me informar, e tentei perceber a razão de tanto sucesso. E o sucesso não decorre das cerca de 1700 visitas diárias que aquele espaço tem, cerca de 120/150 à hora, o que já é "muita fruta", mas não é isso que importa. As suas imagens, certamente, também contribuiram para esse processo criativo e efeito multiplicador que é já marca d´ouro do Jumento, hoje, sem qualquer sombra de dúvida o melhor e "mais bem" informado espaço de análise e reflexão social e política nacional.

Mas isto só não explica a razão deste caso de sucesso verdadeiramente à parte na blogosfera, o que exige uma explicação mais densa - que já aflorámos noutra passagem. Vejamos então algumas dessas razões. Na minha opinião a razão daquela excepcionalidade prende-se com o processo especial e o exercício criativo a que recorre com frequência para explicar a realidade, estimulando os nossos sentidos - que assim ficam mais dispertos para compreender a realidade a várias dimensões. Ou seja, a realidade por alí filtrada passa a ter uma altura, um comprimento, uma expessura e uma certa densidade.

Ainda hoje vi e ouvi isso pelo que foi dito no debate da Nação na Assembleia da República. Seja quando o governo apresenta dados sobre a sociedade da informação, ou quando a oposição se atira à Ota, à DREN, ao camelo do deserto, ao ambiente, à saúde, à educação, à agricultura ou a qualquer outra questão-problema de política sectorial.

O que se diz no Parlamento pelos senhores deputados já eu o li no Jumento dias, senão semanas antes. E hoje percebi que o PSD lê mais atenta e primorosamente o Jumento do que o Povo Livre, e se os blogues dessem dinheiro ou fosse possível cobrar taxa de utilização, muito provavelmente MMendes e muita outra oposição teriam de pagar caro as imensas incursões aquele jornal diário que alimenta a República e dá cartas a qualquer jornal diário ou semanário da República, apesar de aqui os meios serem mais complementares do que excludentes entre si.

Mas não é isto que explica o sucesso daquele espaço de análise. Mas sim a técnica e o método particular de escalar e de surpreender a realidade no quadro do seu processo criativo, o qual acaba por influenciar o quadro mental do leitor sem, contudo, falsear a realidade.

E o que é que eu vejo alí diáriamente?! Vejo uma elevada concentração, uma hiper-actividade informativa e analítica, uma grande incisão no tratamento das questões, solução para os problemas através dos despachos do Director-Geral (figura interessante), por regra de grande bom senso e realismo, além duma enorme e complexa abrangência - deixando pouca coisa de fora do espaço de análise. Ora, não é qualquer doutor ou catedrático que consegue fazer isto, especialmente diáriamente e com método e crescente qualidade. É isto que surpreende e admira e às vezes até irrita...

Por outro lado, não raras vezes o Jumento dispõe bem - graças ao seu refinado sentido de humor e ironia - qual sorriso da razão, como diria Eça de Queiroz, e é precisamente essa predisposição mental que acaba por gerar um efeito de elevada receptividade junto dos leitores, embora só possa aqui falar por mim, naturalmente.

Em suma: ao pensar nas razões de sucesso do melhor blog português não posso deixar de me sentir grato por alí ter aprendido muita coisa, ainda que nem sempre concorde, apesar dos argumentos serem sempre estruturados e claramente expostos. Mas para além disso, é o próprio processo criatogénico desenvolvido pelo Jumento que o transforma num espaço verdadeiramente autónomo e não comparável a nenhum outro.

Essa criatogénese é a sua matéria-prima, é dela que faz as omeletes tendo por referência três dimensões que se notam à légua em todas as suas narrativas:

1. Hiper-concentração;

2. Grande orientação estratégica ou hiper-razão;

3. E elevada sociabilidade - temática e argumentativa.

Creio que é essa troika de razões que faz do Jumento aquilo que ele é hoje: um motor de busca de si próprio, uma rferência lapidar da informação e análise em Portugal, uma "fábrica" de ideias, sendo certo que os leitores que o procuram não demandam o "burro" por erro do google ou por semelhança de palavras a que os links e o próprio google dá uma ajudinha, como sucede a muitos blogues - que têm centenas de visitas apenas por causa dos nomes que escolhem a fim de atrair (como as aranhas), por efeito de erro do ciber-espaço, leitores furtivos e erráticos.

O Jumento, por todas estas razões, já se converteu num "vício" diário (saudável)para a pequena, média e alta administração publica, para o empresariado, para a classe política (que é objectiva e subjectivamente influenciada, senão mesmo formatada), para as classes liberais, para a imprensa escrita que ali bebe, pasta e repasta e para todos aqueles que se querem manter actualizados e assumem um perfil mais exigente no plano analítico.

Pela minha parte, confesso, qualquer dia chateio-me a sério... Pela simples razão de que quando penso dar livre curso ao meu próprio processo de produção de informação já o "burro", ocasionalmente, se antecipara e me "comeu a bolota" do dia, deixando escasso espaço de manobra intelectual - o que deixa, convenhamos, qualquer mamífero verdadeiramente irritado...

Em todo o caso, a sã concorrência é sempre saudável - e ela é tanto mais criativa quanto nela encontrarmos alguma dose de meditação nos problemas do nosso querido Portugal, visualização e pensamento interactivo. Afinal, quando olhamos para o Socas - alí plantado na praia da Nazaré tão bem acompanhado - o que cada um de nós pode pensar remete para um infinito de derivas.

São esses filetes de raciocínio e do pensamento que nos recriam novos contextos, galáxias dentro de galáxias, como as matrioscas/bonecas russas.. Sendo que o mais curioso em tudo isto é que muitas pessoas tornam-se mais criativas à medida em que a noite avança e são encaminhadas para o sono do que logo pela manhã...

Aliás, tenho um amigo que me diz que quando for rico jamais dirá bom-dia a alguém, porque então passará a levantar-se sempre após o meio-dia...