O 25 de Abril: 33 anos depois
A melhor saída é sempre passar por entre, como diria o poeta Robert Frost. Eis uma das chamadas às armas, pelo que as pessoas, as empresas, as instituições, o Estado para terem êxito têm de ousar e ser diferentes. A competência e o dinheiro abrem-nos essas portas do club, volvidos 33 anos da revolução dos cravos de 25 de Abril de 1974.
Mas se virmos bem, então éramos um país rural e agrícola práticamente analfabeto, hoje, apesar de todos os progressos sociais e económicos, ainda estamos na cauda da Europa em termos comparativos. Em vez de convergirmos com a melhor Europa, dela divergimos. Ainda que o profeta MMendes diga que com ele sentado na cadeira de S. Bento os tugas irão crescer 80% no seu crescimento global em termos de PIB. Que bela ficção... Proponha-se o nome de Mendes para a 7ª Arte no próximo Concurso de Cannes..
Na altura como hoje, constata-se que a sociedade portuguesa ainda está muito dependente do Estado-patrão para resolver os seus problemas. Isto apesar da liberalização da economia e da sociedade. Mas à medida que os templos se vão esvaziando - notamos que continuamos a precisar daquele forte abraço armilar do Estado para nos desenrrascarmos. É isto que é dramático: estamos na Europa, liberalizámos muitos dos sectores da economia nacional, somos europeístas, adoptámos o euro logo no pelotão da frente mas, ao mesmo tempo, ainda temos uma desgraçada iliteracia, produzimos pouco e mal, somos absentistas, só 15 ou 20% da população domina as TIC e todos, lá no nosso íntimo, continuamos a pugnar pela figura do Estado ama-seca para que ele nos resolva os problemas.
Até parece que à medida que os anos passam e vamos ritualizando esta cerimónia do feriado do 25 de Abril - repetindo discursos muito bem feitos e melhor lidos - o Estado vai batendo em retirada, é desmantelado matando-se o clássico Estado-providência (uma das conquistas de Abril) à medida que as pessoas fazem também as suas escolhas pessoais para as suas vidas, e algumas, infelizmente, não encontram outra opção senão emigrar.
Hoje há mais dinheiro, mais tecnologia, mais estradas e melhores redes viárias, entrámos na Europa, há mais mudança social e económica, esgotámos já muitos fundos comunitários, os actores políticos são também mais civilizados - o PM já não manda à merda nenhum membro da oposição; nenhum membro da oposição chama de filho da p*** ao PM nem lhe promete um par de estalos no hemiciclo, há empresáros de sucesso que falham Opas e ficam deprimidos e mudam a sua ideia do PM, temos as grandes superfícies e muitos centros comerciais que são as novas catedrais do consumo e do endividamento... Tudo para nossa alienação colectiva.
Mas será que lá bem no nosso âmago do inconsciente colectivo somos diferentes? Será que mudámos a nossa postura perante os comportamentos sociais e o risco, a orientação estratégica e a competição, o modo de exercício do poder e a dominação, a afectação de recursos e a forma como capitalizamos os nossos activos sociais e económicos?
Creio que nas questões de fundo continuamos a ser aquilo que sempre fomos, salvo na época da gesta dos Descobrimentos em que fomos excepcionalmente ousados. Aparte essa fase de grande expansão continuamos todos a gerir as contas do velho merceeiro da Rua Morais a caminho do Alto de S. João em que o Estado-pai se tansformou (para agora ser desmantelado a fim de reduzir a sua dimensão e despesa na equação das finanças públicas) e pugnamos todos, ainda que baixinho, por mais segurança, mais protecção, mais equilíbrios sociais e melhor distribuição. É a quadratura do círculo... Queremos aquilo que não podemos ter, ou o Estado já não pode dar.
Ou seja, fizemos o 25 de Abril para por a Liberdade à solta juntamente com a sociedade e a economia. Aí desenhamos um mapa cor-de-rosa em que as pessoas, as empresas e o Estado assumiriam mais risco, seriam mais competitivas e assumiriam mais eficientemente as suas posições de dominação e de capitalização na economia. Seríamos também mais felizes e teríamos todos mais filhos. Mas ao fim destas três décadas, apesar dos inegáveis progressos, constatamos que pedimos aquilo que o Estado hoje já não pode dar: protecção, segurança,equilíbrios e distribuição.
Isto faz-me lembrar aqueles povos africanos (ex-colónias) que entretanto ascenderam à independência. Na altura eram colónias, não tinham a Liberdade desejada mas, bem ao mal, não passavam fome; hoje, milhares de portugueses, muitos deles qualificados, têm essa tal LIBERDADE mas não sabem o que hão-de fazer com ela ou destino lhe dar... É isto que é dramático ao cabo de 33 anos de Abril.
O que me faz supôr que por vezes Portugal se converteu numa espécie de colónia africana, e a nova Europa tem hoje nome diferente: a China, a Índia e as economias emergentes nascidas à sombra da globalização predatória que defenestra a Liberdade (como fizeram ao Miguel de Vasconcelos e o articulista João Miguel Tavares quer fazer ao Pina Moura) e o sentido que queremos para ela.
Malgré tout, é melhor termos Liberdade do que não ter nada. Mas quando nos perguntam donde somos, até dá vontade de responder que somos uma pretuberância do Corno d´África...
Adenda: Vale a pena ler essa pentarquia de factores que moldam (ainda) a nossa personalidade colectiva. A tal do "respeitinho que é muito bonito" genialmente retratada pelo Alexandre O'Neill: 1) uma direita que ainda não fez a ruptura com o passadao; 2) o autoritarismo; 3) o Estado-paternalista; 4) as boas maneiras (que designaria por costumes); 5) e a sociedade não competitiva. É uma análise tão potente quanto oportuna e interessante, e até estimulante, pois basta que um investigador com dois dedos de testa faça a colecção das bocas que quer o PGR, o Sr. Pinto Monteiro, quer o PM, Sócrates dizem dos blogs como o Jumento refere, e bem - (e aqui há que distrinçá-los, porque há imensa porcaria e tarados obsecados em perseguir o PM e noutras questões que envolvem "sangue" e possam render fama e visitas) para se arranjar objecto para um projecto de investigação na área das humanidades.. Os interessados que pensem nisso, fica aqui a ideia e o desafio. Podem começar pelo Youtube - sob a epígrafe - "Uma Vergonha" - e fazer o search - para se aferir a qualidade mental e a destreza tecnológica de alguns dos nossos responsáveis políticos, mormente em sociedade do conhecimento. Uma autêntica vergonha..."Uma Vergonha" - da autoria do sr. PGR, Pinto Monteiro.
O Memórias Futuras (link) também dá um interessante contributo para recuperar a História e o sentido que ela pode vir a assumir no futuro. (...)
Nesse dia, os portugueses transformaram em sorrisos o que poderiam ter sido lágrimas e em vez de barricadas o que se viu foi a confraternização de um povo feliz. Inverteu-se um destino, mudou-se um rumo, caiu um regime e não rolaram cabeças que, em vez disso, foram amavelmente convidadas a seguir para destinos turísticos. Revolução como esta não consta dos manuais de história e se antes dela alguém tivesse falado em “Revolução dos Cravos” no mínimo teria sido entendida como uma piada de mau gosto. Mas também é verdade que Carros de Combate que descem à capital para tomar o poder e param aos sinais vermelhos do trânsito aguardando disciplinadamente que surja o verde para seguirem a sua marcha, só é entendível numa “Revolução de Cravos”. (...)
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