quinta-feira

O papel da Filosofia e o "efeito foca da Edp"

Hoje o governo levou o assunto da Reforma do Ensino Superior ao Parlamento para aí a discutir. António Vitorino tinha já o assunto no seu agenda-setting, e logo pela manhã ajudou a tsf a credebilizar-se - depois daquele recrutamento abstruso e históricamente ruinoso da "foca da Edp" que anda por aí que "ajudou" a estação a perder ouvintes - e alinhou o tema numa troika de desejos, em jeito de balanço de ano - que poderão ser lidos no post imediatamente infra.
Este enquadramento permite-nos falar não da Reforma do Ensino Superior - que será bem vinda, dado o imobilismo, a incompetência, o amiguismo, o compadrio e a corrupção d' almas que graça mais numas do que noutras universidades naturalmente, mas d'algo que afecta, sobremaneira, o Ensino Secundário: o "assassinato" da Filosofia - que deixou agora, creio, de ser uma disciplina obrigatória no acesso ao ensino superior, como o era até hoje.
Além do desprestígio intelectual, científico, cultural e civilizacional duma decisão desse "quilate" (até parece que estamos na Albânia ou nas repúblicas confinantes do camarada Jerónimo), creio que se tratou de alguma aposta entre a ministra da Educação - que é da área da Sociologia - creio, e zaramago, o tal que dizia - quando solicitado a ajudar no plano de fomento à leitura - que "a leitura entre os portugueses é como as bexigas, uma fatalidade". Pensei logo nas "bexigas" que lêem as porcaria que escreve... Pelo que o próprio só participa nas acções de lançamento dos seus próprios livros, ou naqueles escritores que ele resolve apadrinhar - porque o citam muito ou nele vêem uma luz ao fundo do túnel. Mas não valerá a pena perder tempo com meias doses de pseudo-literatura de cordel e de linhas de argumentação e de narrativas-macacas que a sociologia da literatura já esgotou na Europa nos anos 70. São estes, portanto, os anos de atraso daquele ex-comunista, amigo de Fidel, ex-censor da imprensa em Portugal, saneador de colegas jornalistas no Verão quente e o mais. Um tipo para esquecer. Eis a ficha de que zaramago é portador. Uma nulidade a que se soma um erro genético. Teve sorte quando em 98 apanhou o júri do prémio nobel completamente embriagado.. O resto é sabido: arrogância e soberba, depois alterna...
Mas a ideia aqui é evocar a força da Filosofia e não a mediocridade de um escritor. E é por entre estas derivas que chegamos à Filosofia, i.é, à necessidade existencial de identificarmos as causas primeiras de tudo, encontrar quadros de compreensão mais abrangentes que nos permitam chegar às essências e não ficarmos apenas nas aparências. Qual diferença entre um domingo (dia de aparências) e uma 2ªfeira (dia de essências). E é aqui que esbarramos com um tremendo muro negro: Quem me criou? é só uma meia questão - ao pé da outra questão maior: Quem criou Deus?
Esta formulação tão simples revela, revelou também a Russel, provavelmente o maior filósofo do séc. XX, a falácia do argumento da Causa Primeira de todas as coisas. Pois se tudo deve ter uma causa, até identificar uma música ou comer um gelado-quente, também Deus a deve possuir. E se algo existe sem causa tanto pode ser o mundo como o próprio Deus, razão da inutilidade deste argumento. Contudo, o filósofo evoca uma história do indiano que afirmava estar o mundo assente num elefante e este sobre uma tartaruga; e quando se pergunta: E a tartaruga? - o indiano responde: "E se mudássemos de assunto?"..
Não havendo razão para que o mundo não tenha nascido sem causa, também não haverá razão para que não tenha existido sempre. No fundo, a ideia de que as coisas devem ter um começo é uma resultante da pobreza da nossa imaginação.
Todavia, a importância da Filosofia reside nestas demonstrações, nestes exercícios de alma e de esprit que jamais ocorreriam se não utilizássemos esta poderosa ferramente de perguntar-e-de-responder. De gerar o espanto e a admiração no homem, e nas coisas do mundo que o rodeiam e condicionam. Respondendo aos velhos desafios e criando outros novos. Na essência, a filosofia ensina-nos a pensar bem, a formular as questões-chave em cada momento, permite-nos comparar e integrar saberes díspares, foi isso que fez o mestre e amigo Agostinho da Silva, conciliando o inconciliável, da economia à sociedade passando pela cultura e a política.

Sabendo toda esta importância espistemológica na estruturação do conhecimento e na geração de massa crítica, a srª drª Mª João Rodrigues, ministra da Educação - a ser verdade o que se diz, jamais deveria dar um passo que fosse para ser cúmplice nesse "assassinato cultural" e reflexivo que é aniquilar a filosofia dispensando-a do seu concurso ao acesso ao ensino superior. Se hoje o chamado pensamento criativo já é débil, futuramente ainda será pior. Esta disciplina, de par com a matemática e o português são verdadeiramente essenciais ao Homem, para a sua formação humana e social.

Ora, um mundo privado de filosofia é como uma omelete sem ovos, um carro sem motor, uma bicicleta sem rodas, um corpo sem alma - ele até pode andar, mas sem saber que direcção ou destino tomar.. E sem estas coisas todas caímos naquilo que poderei chamar o efeito foca da Edp - além da incompetência, de danificar a credibilidade interna e estratégica do País, ainda aceita ser promovido para uma função que não faz a mínima ideia do que será.

É aqui que a filosofia fala mais alto, v. q., nos ajuda a detectar rapidamente esse quantum de pensamento criativo e livre, que nos leva até a defender ter "direito à filosofia", por razões de higiéne mental. A filosofia forma, como nenhuma outra disciplina, as pessosas para uma cultural geral mais exigente e dá-lhes adaptabilidade para um determinado sector de actividade.

Portanto, além do desprestígio mortal dessa alegada decisão - que tende até a apagar a nossa memória, a filosofia coloca o homem, na linha de Albert Camus, perante um drama - quando nos diz que só há um problema filosófico verdadeiramente sério: o suicídio.

Por último: já alguém viu um jogo de futebol filosofante...
Monty Python - International Philosophy