A teia (d' aranha)
Porque o ministro da Justiça arranjou sarilhos com a Judite fala-se hoje em corrupção em Portugal. Zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades... Não mudámos uma vírgula, Portugal é the same old sheet... Os maus exemplos vêm sempre de cima e de dentro do convento. Ministros que arranjam cunhas para familiares, amigos, próximos, enteados... Tudo se vê naquele que dantes dizia das polícias - "este não é o meu ministério". Não, não me refiro aquele que no tempo de Cavaco telefonou ao pai a dizer que já era ministro, reportamo-nos ao sr. Costa, o elemento político mais ambiguo, hesitante, coxo, indeciso e incompetente que há notícia naquela pasta desde o 25 de Abril. A incompetência política, porque permite muita coisa indevida, também é uma modalidade de corrupção. Mas nao é disso que irei falar aqui. Nem da corrupção das autarquias, da futebolítica, do pato bravismo encostado às empreitadas e adjudicações de estradas, pontes e outras marmeladas. Isso não existe em Portugal. "Aqui não há corrupção", só existem pequenos problemas na interpretação da lei. E quando alguém é apanhado, quando alguém chefe da pequena máfia é referenciado pelas autoridades, quando algum valentim é agarrado - é porque se trata de um Robin dos Bosques à portuguesa, que foi interceptado a praticar o bem à margem dos serviços sociais do Estado que, por o welfarestate se encontrar em crise, chega onde mais ninguém chega; aos lares dos portugueses, os protegidos, leais e submissos. São estes os promovidos... Yes man.. Daí que em Portugal não existam corruptos, o que existe são homens de honra. Podem ser medíocres advogados, poetas frustrados, que telefonam ao papá a contar a boa nova da promoção ao cadeirão ministerial, mas não são corruptos. Em Portugal os políticos entram como saem: nunca vimos um simples ministro entrar para o governo enquanto tal e sair banqueiro, ou vimos???Entre os nossos ladrões o código de honra é respeitado, ninguém bufa. Omertam todos, todos de bico calado. Um pouco como na maçonaria, a cuja agremiação as pessoas hoje aderem para arranjar empregos, posição, influência, status e exercer vendettas e acertar contas com pessoas e tribos desavindas. Os que se dão ao luxo de praticar o misticismo são os que já têm isso tudo, por isso podem pensar, reflectir, meditar. São estes que vão para a Quinta da Regaleira à procura de marsápios às 3 da madrugada. Eu dantes fazia isso, só que era mais a apanhar pardalada, com um fox e uma flober. Era cá um petisco... Sempre gostei de passarinhos... Mas hoje os eco-foda-mentalistas estragaram tudo.. Mas em Portugal estas práticas são pouco expressivas: há pouca extorsão, pouca manipulação, há poucos sindicatos do suborno, a corrupção das polícias também não é das piores da Europa - em Itália é bem pior... Sem falar já dos assassinos, pois em Portugal não há notícia dessas práticas. Em Portugal, como verificamos no caso casa Pia - que envolve uma rede de pedofilia - o único culpado é o Bi-bi, os outros - diplomatas, homens da comunicação e conexos - são apenas mandaretas nas mãos da justiça, peças soltas apanhadas no turbilhão à hora errada. Muitos deviam estar a fazer um programa de tv para crianças e foram apanhados pela PJ por mero engano. Portugal pode ter umas miniaturas - a-dias, a-loureiros, a- costas, - mas nenhum tem a expressão dum Al Capone, dum Sammy Gravano, dum Sam Giancana, dum Frank Costello, dum Vito Genovese, dum Carlo Gambino e outros que vimos nos filmes e fazem injeva aos advogados de Coimbra e arredores. Confesso que gostaria de ver estes homens que fizeram o séc. XX discutindo hoje os problemas da bola, das autarquias, do financiamento partidário, da construção civil - nesses programas organizados pela RTp - ao lado de convidados ilustres dos partidos do poder em Portugal. Ainda assim, creio que Portugal é um país de brandos costumes, isto apesar do Padrinho - magnificamente interpretado por Marlo Brando - já integrar a cultura popular do Ocidente e se ter enraizado na nossa psique colectiva. Hoje, por exemplo, quando recordamos ex-ministros do cavaquismo ou do guterrismo, não se associam a essas pessoas práticas menos correctas no exercício do poder, nem se pode catalogar essa gente como gangsters. Por um lado, não estamos na América, por outro Portugal resolve os seus problemas nos gabinetes, nos restaurantes, nos corredores do poder (formal e informal), nunca anda aos tiros, nem mata pessoas ao estilo calabrÊs ou seguindo o padrão etarra, apesar daqui o objectivo não ser a extorsão mas a independência relativamente ao centralismo de Madrid. Num primeiro relance aos esquemas nacionais que hoje ensombram a opinião pública e de que amanhã já ninguém se lembra, como nos funerais, diria que a corrupção em Portugal ainda está bastante recalcada, ainda predomina uma subcultura oculta do respeitinho que é muito bonito, ao lema do Alexandre O'Neil, mas que também é praticado por políticias, políticos e empresários. Temo bem que quem se debruçar sobre este assunto, na Visão, no 24H ou num blog mais ou menos especializado, não encontrará algo mais do que um padrão de corrupção tolerável, um conceito de família útil para as negociatas que o Estado faz entre os amigos e os empreiteiros, os amigos aliados (eleitorais), os parentes de sangue e tutti quanti que pedem ou fornecem favores vários ao poder. Em Portugal, o empreiteiro que se prese dá dinheiro aos dois partidos do poder. Mas fá-lo com critério como há anos me dizia um filho de um desses empreiteiros. O artista dizia o seguinte: "o meu papá, à boca das eleições consulta meia dúzia de sondagens, e em função de quem estiver melhor posicionado para ganhar as eleições assim ele contribui para a causa. Por hipótese - num bolo disponível de 80 mil cts - ele daria 65% desse montante ao cavalo mais próximo da meta; e o restante ao joker imediatamente anterior no ranking das sondagens à boca das urnas". Hoje a marosca é a mesma. Mas, como digo, Portugal é um país de brandos costumes: nos métodos, nos meios de acção, na cultura de violência subjacente a todo este mundo e submundo do crime mais ou menos organizado. Cá ninguém mata ninguém à paulada; ninguém mata ou manda matar ninguém na bagajeira de um carro, ninguém enterra vivo ninguém; porque o "outro" simplesmente se recusou a financiar um investimento para uma ponte ou para um estádio de futebol, ou até porque porque simplesmente se recursou a ir ao beija mão, a mostrar obediência, fidelidade e servilismo - que é coisas que os nossos catedráticos fazem nas universidades. Embora se saiba que quando se entra nos negócios ilícitos é para sempre, nós por cá, ainda não sabemos se foi o ministro da Justiça que demitiu o director da PJ ou se foi este que se demitiu a si próprio num exercício de Lucky Lucky - onde a sombra por vezes é mais rápida do que.... Isto traduz bem o estádio e o nível de sofisticação primitivo que atingimos no plano da criminalidade organizada. Em Portugal, as autoridades procuram corruptos, bandidos e outros out-of-law e os jornais só se lembram de ex-políticos - actuais banqueiros, de autarcas, dos donos da bola, de comentadores desportivos, de alguns empresários e de muita perseguição sem fim à vista. Não será tudo isto uma ilusão? Não estaremos no intervalo do Godfather?
Querem uma prova que corrobore tudo isto? Eu digo: exclua-se do mercado da opinião o casal mais justiceiro e especializado que fala disto com propiredade no burgo - leia-se MiZé Morgado e o grande fiscalista S. Sanches... E mais ninguém, salvo o sampaio - naqueles discursos obscuros de chorar a rir que nunca ninguém ligou, liga ao assunto. Veja-se o caso casa Pia... Imagine-se que a Felícia Cabrita trabalhava nos Ctt ou era adjunta de Dias, ou de Valentino... ou doutro qualquer. Teria a PJ, o MP descoberto ou desencadeado algo? Temo bem que não. Portanto, quem sabe disto são os jornalistas, e estes valem o que valem.
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