O Admirável Mundo Novo dos tugas...
- No dia 25 de Abril findo a RTP resolve prendar os portugueses com uma suposta inovadora discussão sobre a sociedade do futuro, as Tecnologias da Informação e da Comunicação - e alguém se esqueceu - da Decisão Estratégica (TIC-DE) - , o homem do futuro e da felicidade eterna. I.é, de como gerar uma sociedade perfeita, com pleno emprego e com ananases na Terra e tomates na lua. Sendo certo que cada português teria, não um Larborguini Miura na garagem, mas um PC ligado à net 24 h. por dia, como as bombas de gasolina.
- A coisa teve lugar no famoso Prós & Contras protagonizado - com movimentos de ballet contemporâneo e por ondulações cósmicas que só a Fátima Campos Ferreira sabe interpretar. A ideia de partida era o choque tecnológico, roubando o substracto ao PM - José Sócrates. Na sala das máquinas, a comandar o navio, estavam quatro pilotos: dois do mundo empresarial, e dois do universo académico. Foi assim que os representantes da PT (Z. Bava) e da Siemens (J. Picoilho) enfrentaram os terríveis produtores de ciência, nas pessoas de Maria João Rodrigues - amiga pessoal de Manel Castells - e Reginal Rodrigues de Almeida, autor da obra - Sociedade Bit, que está a fazer furor e parece querer rivalizar com o dito Castells, discípulo de A. Touraine e desactualizar as projecções e futurismos sistematizados por Alvin e Heidi Toffler (não confundir com a Heidi dos desenhos animados de fins da década de 70 do séc. XX) desde há 30 anos a esta parte. Incluindo os já clássicos das prateleiras dos lares domésticas (e industriais) - O Choque do Futuro, continuado com A Terceira Vaga e, mais recentemente, Powershift, trad. para português como O s Novos Poderes.
- Confesso, especialmente, do lado empresarial, que tinha alguma expectativa na sua audição. Quer na experiência que cada um dos representantes da PT e da Siemens podia transportar para o programa e daí canalizar para para a sociedade, quer através de novos conceitos, ideias, ligações, propostas, projectos e o mais. Ora daqui veio uma mão cheia de nada, com o supra-referio Bava, todo embevecido, a soletrar o óbvio. Talvez o excesso de formalismo lhe dificultasse a fala. Há tempos, um amigo, por sinal também ligado à PT e com elevada responsabilidade na fidelização dos clientes, tinha-me dito que aquele senhor era uma rara sumidade, pois tão novo e já administrador da PT. Ora, nesse dia, concluímos que o Sr. Bava, engenheiro de formação (presumo), disse aos portugueses o que eles, verdadeiramente, teriam de aprender. Assim, e após "comprar um razoável PC por 450 euros" - os portugas teriam de "aprender a pesquisar na Net". E quanto mais rápido melhor, como provou aquela menina que ganhou um concurso a localizar sites oficiais. Mas quando lhe perguntaram o que era a UNESCO ela patinou..., um pouco como o sr. Bava - na apresentação de ideias novas que sejam aplicados com proveito para os protugueses. E de preferência que possam ir além da tal pesquisa para cegos que aquela ilustre sumidade defendeu perante uns milhões de portugueses que o viam ou ouviam (estarrecidos), ou nem uma coisa nem outra.
- Quanto ao sr. da Siemens, que é outra sumidade, mas da boca dele os portugueses ouviram apenas dizer uma nota musical, depois repetida ad nauseaum... Inovação, inovação, inovaçãao... Pensei, com tanta inovação, que ia até levantar vôo em pleno estúdio, saír pelo tecto e transformar Portugal num electrodoméstico voador de marca registada ... adivinhem lá: marca Siem.... Pronto, ganhou uma viagem de ida à Baviera.
- Depois, veio o momento menos depressivo do programa, com Maria João Rodrigues, a repetir a lenga-lenga da Cimeira de Lisboa e da paixão de António Gueterres, que era a Educação, lembram-se!? Podíamos ter crescido, em tamanho e largura, mas não, a crise das autárquicas interrompeu o movimento intelectual dinamizado por Maria João - que teve depois de presidir ao conselho das Ciências Sociais e Humanas de Bruxelas para aferir o que, de facto, correu mal nesse movimento intelectual ascendente da economia portuguesa - interrompido pelo pântano de Tony Gutierres. Em todo o caso, a intervenção de Maria João foi menos depressiva do que as dos dois precedentes, na medida em que avivou a memória dos portugueses sobre a importância do Turismo, do Sol e etc e tal. Educação, inovação, flexibilidade e muito turismo - que faz bem aos ossos (e à entrada de divisas que também dá saúde à economia) entre outros conceitos que ficam bem soletrar em TV. Quanto a ideias novas: zero. Com tanto apego ao turismo pensei até que dissesse aos portugueses que Tróia e o Portinho da Arábida se transformassem no principal Centro de Formação Profissional da Europa, com cursos de Filosofia Política e de Políticas Públicas ministrados pelo chato e cansativo Carlos Espada, que repete há 20 anos aqueles velhos manuais que falam de Liberdade, Liberdade, Liberdade, Justiça, Justiça, Justiça, e depois - na década seguinte - para infelicidade dos alunos que pagam propinas elevadíssimas (excepto os bons alunos que têm o apoio da Stª Sé) - inverte a ordem e começa pela Justiça, Justiça, Jus... Ainda coadjuvado por Torres Couto, que teve uma tremenda e valiosa experiência na aplicação de Fundos Comunitários à dita formação profissional. Valiosa para ele, é claro, pois é sabido que a coisa terminou no Tribunal e nunca se soube - até hoje - para onde foram os tais milhões... Pelo menos, com tanta inovação é caso para dizer que nem as tecnologias nos valem, pois ao menos ainda poderiam vigiar, fiscalizar e ajudar a identificar comportamentos à margem da lei que esta, a lex (que dura pouco e já não é de lex) - de vez em quando faz cumprir o normativo quando os Tribunais colaboram. Mas também aqui o exemplo foi o da impunidade lamentável que nos envergonha a todos, portugueses que ainda não sabemos bem desenhar a tal arroba à volta do "a" nem, como avança o especialista Bava, da PT, pesquisar uma palavra-chave na Net. Que ele, confessadamente, também reconheceu ter dificuldade, uma vez que "aprendia os tais procedimentos com os seus filhos" - que tinham mais apetecência para a coisa, segundo adiantou. Foi aqui que percebi que Portugal está perdido, definitivamente perdido...E não é na Net..
- I. Queiroz do Vale.. (coifeur, ao Saldanha))
- Depois, e em quarto lugar no ranking do argumentário, sobre a sociedade do futuro e a construção do Homem Novo, veio Reginaldo de Almeida, o homem que faz furor com a sua obra, Sociedade Bit, que ainda não tive oportunidade de ler. Mas do que me foi dado ver e ouvir, como noutras intervenções anteriores, é que estamos perante um filósofo que cruza bem o conhecimento, ié, mescla de forma eficiente o saber das ciências duras com os conhecimentos das ciências humanas. E desse melting pot nasce um tertium genius que não é carne nem é peixe, mas que deixa - para quem é completamente nabo em filosofia e história das ideias - como eram os casos manifestos dos srs. PT e Siemens (agora fiquei baralhado se Siemens é com "Z")... , quando ouviram aquele a debitar sobre o Tratado de Paz Perpétua de I. Kant. Nesse momento, a câmara fez um flash a Bava e a Picolho - e ambos estavam estarrecidos ouvindo aqueles estranhos conceitos que emergiam debaixo das pedras. Como se diz na gíria: eram "dois burros a olhar para um Palácio". Pode ser aquele ali da lapa de Champaulimaud, pois o de Queluz já é muito batido - e também - por causa da realeza em gestação - não dispõe de boas instalações para a prática da formação profissional - do tipo "toca e foge", tal como era praticada pelas empresas da UGT geridas por T. Couto & Comp.ª
- Seja como for, é sempre útil ouvir alguém, neste caso uma estrela em ascensão, teorizar articuladamente sobre a evolução da sociedade da informação (que é um meio) a evoluir para a sociedade do conhecimento (que é um fim em si mesmo, como diria Kant). Pensei que o autor levasse o seu argumento um pouquinho mais longe e afirmasse que, na verdade, o esforço deveria ser atingir a sociedade da sabedoria, que suplanta a do conhecimento. Mas ficámos por aqui, pois como diz o sr. Bava, da PT, que apoia muitas escolas do Norte e no interior do país (Lisboa já é muito rica, por isso vem depois), nós, os portugas, ainda nem sequer sabemos fazer a tal busca das palavras-chave na Internet, e que o próprio - quando precisa - também pede a ajuda dos filhos para o efeito.
- Bom, perante este quadro depressivo, e pedri prozac, não obstante as incursões avulsas a kant (sem, contudo, as concretizar - quer ao nível do sistemas e susbsistemas - educativo e tecnologico), a Toffler, a D. Bell e a mais uns quantos sociólogos (ocultos) que nas últimas três décadas já descobriram tudo sobre estes conceitos - é bom voltarmos a Kant e lembrar, pelas suas palavras: que não há nada mais prático do que uma boa teoria. Foi o que fizeram...
- Mas de tudo resulta uma dúvida. Uma dúvida consternada - porque o dito programa teve zero de audiência. Aposto que foi por causa da tal deficiência dos portugueses, especialmente nos dedos, por ainda não saberem fazer a tal milagrosa pesquisa na net, tão do gosto do sr. Bava..., e cujos efeitos práticos foram ilustrados pela cultura geral da tal jovem, que ganho o tal concurso da pesquisa. Fez a pesquisa, descobriu o site oficial da UNESCO, mas depois não sabia o que era a coisa, ou se sim era algo relacionado com os direitos de autor, ou coisa que o valha..., meu Deus..
- Tirando o método da aprendizagem para a vida inteira, muito badalado nas teses de mestrado do ISCTE, não sobraram ideias que ficassem na memória de qualquer português. Estratégias para o futuro da educação = zero; como adaptar a universidade à empresa dos nossos dias = zero; como ligar as universidades entre si para aumentar a cooperação e potenciar as sinergias = zero; como reformar a universidade dos caciques e da endogamia que bloqueia a academia em Portugal = zero; como reformar o sistema de avaliação do ensino superior = zero; como reformar a gerontocracia estéril que se arrasta com os tubos de hemodiálise pelos corredores das universidades fazendo a vida negra aos jovens investigadores = zero; como interligar as valências das universidades à administração pública = zero; como valorizar os quadros que estão no Estado de forma sub-aproveitada ou sub-valorizada = zero; como refundar a escola aos valores éticos = zero.
- Uma representaação do buraco negro. O sítio que define hoje Portugal. E a coisa é grave, porque os folhos do dito buraco atravessam e afectam simultaneamente as elites e as massas. Quem está no meio, a dita classe média (que Aristóteles estudou bem e disse que fazia sempre o poder ganhar ou perder as eleições, como um pêndulo naqueles relógios de caixa alta, de Luís XV ou XIV, não sei bem - perguntem ao Saraiva), só quer é novelas, futebol e ver a 5ª das Cele..
- Julgo que o que salvou o debate, também com zero % de audiência repito (e isto também é um mau sinal, não apenas por causa da deficiente pesquisa na net tão sábiamente diagnosticada pelo sr. Bava da Pt ou do seu colega da Siemens), mas porque os portugueses não querem verdadeiramente discutir estes temas, e relegam-os para 2º plano na lógica das escolhas racionais - seduzidos pelas novelas e outros programas mais lúdicos, como 5ª das Celebridades e outros que tais deste nosso Portugal post-moderno, modernista - feito pela modista.
- Julgo que o que salvou o programa foi a emergência de uma octogenária que usa o PC para trocar mails com os seus parentes no estrangeiro. A nota criou compaixão, muitos lares devem até ter chorado com tanta tecno-sensibilidade. Julguei até que poderia fazer o mesmo com os meus avós. Mas de repente, e pela luz de tanta irracionalidade e impreparação discursiva, de partilha útil de experiência e o mais que agora não digo - pergunto-me o que terão para dizer de interesante aqueles administradores-executivos aos seus colaboradores e subordinados... E a resposta veio pronta - através de duas rápidas notas aqui do meu modesto Conselho de Gerência:
- 1) mostram o seu estatuto na empresa - com elevadas remunerações, máquinas de alta cilindrada, boas secretárias e bons gabinetes de trabalho;
- 2) e mostram depois - aquilo que, na realidade, ofereceram aos portugueses no programa Prós & Contras: uma mão cheia de nada, um discurso vazio, intitucional, meramente formalóide, oco, cheio de pretensão e de semsaborias que já nenhum estagiário de direito, de filosofia, de gestão ou de sociologia tem o ensejo de cometer para uma multidão de duas pessoas.
- E tudo, dizem, por causa desta nossa grande insuficiência: não sabemos fazer a pesquisa com a palavra-chave. Mas uma coisa sabemos: localizar o site oficial da UNESCO, o resto não interessa para nada... Foi então que me lembrei daquela "estória" do tipo que tinha muitas armas em casa... E um dia um amigo perguntou-lhe para que serviam. Ele respondeu que serviam para brincar, e que um dia iria fazer a guerra, só para saber se as ditas armas funcionavam.
- Valha-nos Deus...
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