terça-feira

A metáfora do bebé: um poder ou uma indigência?

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  • O PM que “governou” Portugal desastradamente durante 4 meses revelou também uma inábil relação com a linguagem, fonte de toda a comunicação. Ao invocar a metáfora do “bebé, da incubadora e das estaladas” e o modo como o mesmo era tratado pelos seus ministros (e pelo País em geral), procurou demonstrar como o País mediático fora severo para com um governo frágil porque amputado na sua legitimidade de origem: o voto popular.
  • O recurso à metaforização, infeliz neste caso, não decorre apenas do ambiente político do Portugal pós-Barroso (que precipitou tudo) mas de um padrão socio-político: a demissão auto-destruidora de H. Chaves, a nítida falta de autoridade e coordenação política, as contradições do Orçamento, a neocensura colada ao “caso Marcelo”, a sesta, enfim, o background fixaram um estilo e uma filosofia de vida do PM. Esta deslocação metafórica, apesar de sermos um país de poetas, reflecte algo de mais profundo, i.é, estrutural. Um pouco como dizer a “A” que espere num quarto mal iluminado, um rival ciumento. É inverosímil. O “bebé” do governo torna ainda mais irreconciliável a metáfora com a realidade.
  • Quem tem algumas bases filosóficas, não muitas, consegue compreender que a linguagem é o centro de gravidade da política. Dela derivam as ideias, as doutrinas, os projectos, os objectivos, os programas, enfim, o sentido estratégico que significa algo: uma direcção, um rumo para uma sociedade. Associar, mesmo que por analogia, um bebé a um Governo é sempre um acto inverosímil, perigoso, implosivo. Porque é que os assessores de comunicação, que, afinal, revelam uma cultura política de bricolage e falha de senso comum, não fabricaram uma outra metáfora para o PM debitar?! Assim, não há identidade semiológica que resista. Confesso que só encontro uma explicação para essa inaptidão política: indigência cultural. Reflexo, aliás, da genérica impreparação técnica, científica, cultural do escol dirigente do governo pós-Barroso.
  • Interrogo-me por que razão é que nos prolegómenos daqueles improvisos discursivos do PM, ninguém lhe ventilou melhor ideia, melhor metáfora que recortasse o seu pensamento e deixasse uma imagem aceitável no País? Por ex: referir que a oposição, é como os grãos de um mesmo punhado de areia que formam desenhos diferentes, ou ainda como a nuvem no céu, que muda de forma e de posição de minuto a minuto. Agora, - o “bebé”!? Ora é precisamente esse bebé que nos permite ir mais longe e perscrutar a estratégia mentalista do seu autor quando procurou criar um elo psico-afectivo com os eleitorados. Como quem diz: ouçam-me p.f.v., apoiem-me, preciso de ajuda.
  • Julgo, assim, que se tratou de um acto de comunicação política desesperado. Alguém que percebeu que está à beira do precipício político, para o qual foi empurrado, paradoxalmente, pelos “amigos” íntimos. O emissor envia uma mensagem ao País, mas ela não é operante e o contexto, porque o PM tem o País contra si, também não é aceite. Chumbado o contexto e a terminologia, esvai-se o referente que aproveita para ridicularizar a escolha da metáfora e, assim, fragilizar ainda mais o PM. Eis a genealogia duma metáfora que era para ser poderosa e eficaz e acabou por ser vulnerável e ridicularizada. Pois o canal físico dessa mensagem impediu que a conexão psicológica se estabelecesse entre emissor e receptor, entre PM e o País. E o efeito não foi de comunicação mas de explosão, ou melhor, de implosão.
  • Em suma: em política a linguagem é tudo. Lembram-se como o eng. Guterres articulava admiravelmente? Parecia que lia sistematicamente. Num minuto, debitava meia dúzia de línguas diferentes, como ocorreu quando presidiu à UE em 2000 - em que se proclamou o guia da sociedade da informação (que hoje mostra o gap a que estamos da Europa). Mas uma coisa é discursar, outra é governar. E são poucos aqueles que conseguem, eficientemente, mitigar as funções emotiva, injuntiva, referencial, fática, metalinguística e poética.
  • Mas muitos são os que procuram ser os shifters da nova galáxia comunicacioonal, só reservada aqueles que têm, de facto, a capacidade de contextualizar e tornar operativo uma imagem que politicamente se demonstra. Ora o PM confundiu esta relação: convencer um País não é incendiar um congresso povoado de emoções. E um bom político tem de ser como um bom filósofo: capaz de enunciar competentemente as questões da polis. E nunca confundir os significados com os conteúdos.
  • Não perceber isto é incorrer numa “estrutura duplex”, já que o significado do bebé reflecte, ao mesmo tempo, o código político do seu autor com a mensagem lamentável do seu criador. E isto só pode dar uma implosão, forma nova de indigência.
  • Votar neste bé-bé - diabólico seria terrível para Portugal...
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