sexta-feira

Recanto de Leitura em Vergílio Ferreira... - prepara Szymborska -

... Em que Vergílio Ferreira nos diz por que razão escreve, e fá-lo para "tornar visível o mistério das coisas. Escreve para ser. Escreve sem razão".

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... Escrevo para criar um espaço habitável da minha necessidade, do que me oprime, do que é difícil e excessivo. Escrevo porque o encantamento e a maravilha são verdade e a sua sedução é mais forte do que eu. Escrevo porque o erro, a degradação e a injustiça não devem ter razão. Escrevo para tornar possível a realidade, os lugares, tempos que esperam que a minha escrita os desperte do seu modo confuso de serem. (...). Escrevo para tornar visível o mistério das coisas. Escrevo para ser. Escrevo sem razão.

Vergílio Ferreira, Pensar. 

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- Por vezes, ou muitas vezes, a palavra irrompe do meio do bosque, ziguezagueia as árvores na mata da nossa existência;
- Vive de "memórias e mais memórias"...;
- Ela serve para bebericar os junhos da existência em sábados que dificilmente regressarão;
- A palavra serve para ser atrevida, fala-nos de casas, de comboios (ou de "casa ou comboio") e doutras viagens à utopia do ser e do desejo e também do Amor;
- Debruça-se sobre quatro paredes e, ao "empurrão", acaba por construir uma narrativa perene, mas que podia durar uma eternidade;
- Depois, a palavra sofreu o impacto das emboscadas, das tensões, dos medos, das angústias, das coisas sem explicação, dos tormentos que nos sucedem e que atribuímos às razões erradas.  
- Por fim, a palavra foi atropelada e destruiu o fígado, os rins, a garganta, o coração...

- Escrevo para provar que, afinal, as palavras têm tanto de certo como de errado, de previsível como de acaso. 
- E de muitos acasos são também feitas muitas vidas...

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Resultado de imagem para WISLAWA SZYMBORSKAPor um acaso

Wislawa Szymborska


Poderia ter acontecido.
Teve que acontecer.
Aconteceu antes. Depois. Mais perto. Mais longe.
Aconteceu, mas não com você.
Você foi salvo pois foi o primeiro.
Você foi salvo pois foi o último.
Porque estava sozinho. Com outros. Na direita. Na esquerda.
Porque chovia. Por causa da sombra.
Por causa do sol.
Você teve sorte, havia uma floresta.
Você teve sorte, não havia árvores.
Você teve sorte, um trilho, um gancho, uma trave, um freio,
um batente, uma curva, um milímetro, um instante.
Você teve sorte, o camelo passou pelo olho da agulha.
Em conseqüência, porque, no entanto, porém.
O que teria acontecido se uma mão, um pé,
a um passo, por um fio
de uma coincidência.
Então você está aí? A salvo, por enquanto, das tormentas em curso?
Um só buraco na rede e você escapou?
Fiquei mudo de surpresa.
Escuta,
como seu coração dispara em mim.
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mAL, Ciga.


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